Secas com duração de cinco anos, 400 milhões de pessoas sem água, extinção das abelhas e proliferação de mosquitos. Pode parecer um futuro distópico, pensado para um filme de ficção ceintífica, mas não é. O uso exagerado de plástico, a dependência dos combustíveis fósseis, a emissão descontrolada de CO² e a falta de cuidados com a fauna e a flora já são uma realidade. E todo o planeta terá de arcar com as consequências. A destruição do meio ambiente é sensível a boa parte da humanidade, mas agora chama atenção de governos que investem na chamada “economia climática”. O termo define políticas públicas que direcionem recursos em inovação para driblar os efeitos negativos de séculos negligenciando o tema.

A decisão de investir em tecnologias que façam chover, por exemplo, é eficiente para o problema da seca. Porém, as medidas só são adotadas por países pequenos e de alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). O que nossa economia tem a ver com isso? Pesquisas da Universidade de Oxford, no Reino Unido, indicam que tecnologias de subversão da ordem climática desequilibram o globo, principalmente as zonas dos trópicos e a região da linha do Equador — o que inclui o Norte e o Nordeste do Brasil.

Enquanto o governo mostra incapacidade de lidar com o derramamento de óleo que polui de forma dramática o litoral nordestino há quase dois meses, o planeta sofre de maneira irreversível com as mudanças climáticas. E o futuro se torna sombrio à medida em que esss mudanças afetam a economia global. A ONU estima que até 2050 mais de 1 bilhão de pessoas precisarão fugir de seus locais de origem por causa do aquecimento global, apenas na África. “Diante dessa evasão, o discurso demográfico esconde uma postura de supremacia”, afirma o professor Antonio Galhardo, da Universidade de Coimbra, em Portugal e PhD em gestão sustentável. Segundo ele, o avanço das empresas que criam tecnologias para combater as mudanças climáticas esconde uma falácia, pois tente a elevar a desigualdade social. “Em um movimento demográfico que vise a soberania, a existência só é palatável aos países ricos e que investem nesse tipo de tecnologia há alguns anos. O Brasil, por exemplo, ficaria muito atrás”.

Para mudar esse cenário, doze especialistas em mudanças climáticas fizeram um apelo na revista científica Nature. Eles pediram que os países em desenvolvimento incentivem cientistas a pesquisar a geoengenharia solar. “Dos emergentes, a China é a única nação dando atenção a isso. Mas Índia e Brasil estão entre os mais afetados”, afirma o pesquisador Reinaldo Leitão, especialista em mudanças climáticas e doutor em energias limpas. Na visão de Leitão, o futuro distópico envolve, ainda, doenças respiratórias, surgimento de novos vírus, cidades abandonadas pelo calor, tsunamis em locais improváveis, geleiras derretendo em cima de áreas urbanas e furações em regiões nunca antes afetadas. “O que vemos é o crescimento do nacionalismo, quando, na verdade, a solução exige ação conjunta entre países desenvolvidos, emergentes e pobres”, destaca Leitão. Segundo dados da ONU, cerca de 80% dos custos das transformações climáticas no planeta serão pagos pelos países em desenvolvimento.

Por parte do Poder Público, iniciativas que tirem o subsídio do combustível fóssil ou que taxem a emissão de CO² teriam péssimo retorno da opinião da sociedade. Isso porque, de maneira imediata, elas acentuariam a desigualdade social e gerariam revoltas — como as de maio de 2018, com a greve dos caminhoneiros, ou as que o Equador sentiu após reduzir tais subsídios para diminuir a dívida pública. Segundo o economista Nicholas Stern, professor da London School of Economics, mesmo com potencial para desagradar a opinião pública, os governos precisam adotar medidas sustentáveis. De acordo com ele, há maneiras de se evitar ou conter os efeitos negativos para o cidadão. No caso do fim do subsídio para combustíveis fósseis, por exemplo, Stern cita a criação de outro subsídio que compense a perda para a população.

EFEITOS IMEDIATOS E se tudo isso parece distante, hoje nossa economia já perde. E muito. Segundo dados do IBGE, em 2018 a safra de soja brasileira perdeu R$ 7 bilhões em consequência das mudanças climáticas. As chuvas fora de hora ou em intensidade muito maior resultaram em perdas de R$ 4 bilhões, só no verão deste ano. De acordo com a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), no relatório Dependência de Commodities, Mudança Climática e o Acordo de Paris, até 2030, a área global para plantio de soja cairá 28%. Diante disso, a orientação é para que o governo brasileiro se prepare para diversificar as bases da sua economia.

Para Emiliano Rego, professor de Estratégia e Agronegócio da Universidade Federal de Goiás (UFG), o tempo urge. “Vinte anos são nada para a ciência. Pesquisas com resultados comprovados levam décadas para entrar nos meios de produção”, diz. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Amazônia e o Nordeste serão as regiões mais afetadas pelas alterações climáticas. Além disso, culturas como soja, cana-de-açúcar, feijão e milho não prosperam sob altas temperaturas. “É possível que, em 2070, só a mandioca ainda resista ao clima”, diz Rego.