Uma das estratégias de investimentos em ações mais consagradas pelo tempo é investir em empresas que são boas pagadoras de dividendos. Em geral, são companhias maduras, com fluxos de caixa estáveis e previsíveis e que não precisam fazer grandes investimentos para manter suas atividades funcionando. 

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Por tudo isso, elas podem destinar uma fatia generosa dos seus lucros para os acionistas. Essa estratégia é mais comum nos países desenvolvidos, onde os juros são baixos e os riscos de investimento em ações são relativamente menores que nas economias emergentes. E no Brasil? É possível viver de dividendos por aqui?

 

Sim, é possível. Mas não é fácil, nem é para qualquer um. É preciso escolher bem para garantir a renda mensal. Nem todas as ações são capazes de garantir o mesmo ganho que os investidores rentistas podem obter – correndo menos riscos – nos ativos tradicionais, como os títulos de renda fixa, a caderneta de poupança e os imóveis de aluguel. 

 

Em 2009, um ano ainda marcado pela crise mundial e pela queda nos lucros das empresas, somente dez companhias listadas na BM&FBovespa apresentaram uma rentabilidade em dividendos superior à das aplicações de renda fixa (leia o quadro), segundo estudo da consultoria Economática para a DINHEIRO. 

 

 

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Dentre as melhores pagadoras, há nomes tradicionais, como Souza Cruz e Eternit, e as já consagradas empresas de energia elétrica, como Equatorial Energia, Eletropaulo e AES Tietê. Completam a lista Telemar, Light, Aços Villares, Coelce e Brasmotor. 

 

Além de saber o que comprar, é preciso acumular um patrimônio em torno de R$ 1 milhão, pelo menos, para conseguir um satisfatório quinhão mensal do lucro das empresas.

 

Em 2009, para ter recebido uma renda de R$ 120 mil, o equivalente a R$ 10 mil, um investidor precisaria ter uma carteira equivalente a R$ 821 mil em ações preferenciais da Equatorial Energia, considerando-se as cotações em 31 de dezembro passado. 

 

No caso da Souza Cruz, o acionista precisaria ter R$ 1,4 milhão em ações ordinárias para conseguir o mesmo rendimento. Investindo nas ações mais negociadas, a soma deveria ter sido bem maior para produzir o mesmo resultado. Tome-se, por exemplo, o caso da siderúrgica CSN. 

 

Com menos de R$ 2,4 milhões, o acionista não teria o mesmo rendimento em 2009 que obteria se tivesse deixado R$ 1,4 milhão no CDB, R$ 1,92 milhão na caderneta de poupança e R$ 1,98 milhão em imóveis de aluguel. Correndo mais riscos, o investidor precisaria de uma carteira de R$ 4,98 milhões em Vale e R$ 4,23 milhões em Petrobras. 

 

 

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As contas consideram todos os proventos pagos por essas empresas em 2009, ou seja, os dividendos, isentos de imposto, e os juros sobre capital próprio, que são tributados. Será que vale a pena empatar tanto dinheiro e enfrentar a alta volatilidade da bolsa para ganhar a mesma quantia que quatro ou cinco apartamentos alugados renderiam em São Paulo, por exemplo?

 

A médica paulistana Flaviana Ramos, 33 anos, acha que sim. Ela investe em ações desde 2008, com o objetivo de alcançar a independência financeira. No primeiro semestre deste ano, recebeu o equivalente a R$ 700 em dividendos dos papéis que possui da Eletropaulo. “Eu gosto de ações que rendem dividendos. 

 

Quero pagar o mínimo possível de taxas e impostos”, diz ela. Para a investidora, ainda não importa se o provento recebido é pequeno. Seu objetivo é reinvestir tudo nas próprias ações da empresa e ampliar o patrimônio consideravelmente. 

 

Embora as aplicações de renda fixa ainda sejam muito rentáveis no Brasil e os imóveis se valorizem bastante, ela aposta que ganhará muito mais dinheiro na bolsa ao longo do tempo. “Estou pensando mais em longo prazo”, diz. 

 

Nesse caminho, é preciso cuidado e estômago forte. O critério para escolher empresas pagadoras de bons dividendos é o mesmo para qualquer ação. É necessário avaliar o preço do papel, que pode estar muito caro e sofrer uma realização. 

 

Analisar o histórico de pagamentos de proventos das companhias também é muito importante. “A empresa pode pagar dividendos elevados em determinado ano por ter obtido um lucro não recorrente muito alto”, afirma Bruno Lembi, sócio da M2 Investimentos. 

 

Outros critérios importantes são a governança corporativa e a capacidade de continuar gerando lucro. “O investidor precisa avaliar os planos futuros da companhia, o que ela pagou no passado não interessa mais”, diz Lembi. 

 

Quanto mais cedo o aplicador começar, melhor. O incentivo, com a Selic acima de 10% ao ano, ainda é pequeno para quem quer viver de renda na bolsa. “Enquanto as taxas de juros ainda forem altas no Brasil, os dividendos não vão se popularizar, como nos Estados Unidos”, afirma Rogério Bastos, sócio da consultoria Finplan. 

 

Mas, a julgar pelo desempenho da economia brasileira nos últimos anos e as perspectivas de crescimento no futuro, a queda das taxas é apenas uma questão de tempo.