De olho no avanço dos mercados de geração distribuída no Brasil, a Siemens anunciou a compra de 20% da empresa de serviços de armazenamento de energia Micropower-Comerc, fundada por ex-executivos da Tesla. O valor da operação não foi divulgado, mas se trata de um aporte de capital que será feito por meio do braço de investimentos do grupo alemão, a Siemens Financial Services (SFS), no primeiro investimento global da companhia em uma atividade de armazenamento de energia em baterias sem a necessidade de investimento pelo cliente, conhecido pelo termo em inglês battery-Storage-as-a-Service (bSaaS).

“Esse é nosso primeiro investimento em um tipo de empresa que está colocando em prática os novos modelos de negócio que estão impulsionando a transição energética, afirmou o gerente senior de investimento da SFS no Brasil, David Taff.

Ele destacou que, tendo em vista o uso intensivo de uso de software no negócio de baterias, seja na gestão, seja na fase de desenho dos projetos, a Micropower está alinhada com a visão estratégica do grupo.

O vice-presidente sênior de Infrastrutura Inteligente da Siemens Brasil, Sergio Jacobsen, acrescentou que a companhia já possui tecnologia de armazenamento de energia, mas sempre ofereceu seu portfólio como produto, não como serviço. “Quem busca essa solução no mercado é quem busca redução de custos com energia, basicamente, mas neste momento não necessariamente todas as empresas têm disponibilidade de capital para fazer o investimento e essa solução as a service cai como uma luva”, acrescentou.

Ele indicou que o investimento segue o movimento da Siemens de reforçar seu portfólio de serviços, o que já foi feito em diversas unidades de negócios do grupo.

Já é a segunda vez que a Micropower anuncia uma parceria com um player no Brasil. No ano passado, a gestora de energia Comerc também realizou um investimento na empresa. “Nós rapidamente percebemos que a demanda por soluções excedia o capital que tínhamos disponível para fazer o negócio crescer, então buscamos um parceiro para poder expandir”, explicou o diretor-presidente e fundador da Micropower, Marco Krapels.

Ele salientou que, além de capital, a Siemens contribuirá no desenvolvimento da operação com sua expertise e pela força da marca no País.

A Siemens acordou que contribuirá com a Micropower também por meio de engenharia, software customizado, uma plataforma digital de operações e outras ferramentas e serviços digitais. A companhia poderá monitorar remotamente o serviço instalado por meio de seu centro em Jundiaí voltado para as ferramentas e serviços digitais baseadas na plataforma de Internet das coisas (IoT, na sigla em Inglês).

Suas ferramentas serão aplicadas para otimizar as operações e gerenciamento do sistema, assim como antecipar as necessidades de manutenção ou melhorar o cronograma para maximizar a economia. Além disso, os parceiros estudam aprimorar os softwares atualmente utilizados para permitir o desenvolvimento de novas possibilidades de uso da solução no sistema elétrico, por exemplo pelas distribuidoras. Já as baterias seguem fornecidas por diferentes fabricantes.

O modelo de negócios atual da Micropower é voltado para o consumidor final e o serviço é custeado pela economia gerada pelo armazenamento de energia. Com a solução, indústrias e unidades comerciais diminuem os gastos com eletricidade nas horas de pico, quando a tarifa de energia é maior, usando energia armazenada nas baterias nos momento em que o preço é menor. Atualmente, muitos desses potenciais clientes utilizam nos horários de pico geradores a diesel, mais caros e poluentes. A Micropower também busca vender o serviço por suas características de melhora da eficiência energética ao reduzir oscilações e backup.

Krapels lembra que o preço das baterias caiu 85% nos últimos 10 anos e projeções apontam para uma queda adicional de mais 50% nos próximos 10 anos, o que deve permitir um rápido avanço da solução, em substituição dos geradores a diesel muito comuns hoje em edifícios comerciais. Segundo Taff, existe atualmente no País um parque de geração de energia a diesel entre 7 GW e 9 GW de capacidade instalada, que é disparado todos os dias da semana, entre 18 e 22 horas, na tentativa de evitar as tarifa de hora de pico. Krapels vislumbra que todo esse parque passará por uma transformação, sendo substituído, em grande medida, pelas baterias emu ma década, “assim como os cavalos foram substituídos por carros nos 1900”.

O investimento em geração distribuída e outros serviços ligados a energia tem movimentado nos últimos anos grandes grupos que atuam no setor elétrico brasileiro, na esteira do crescimento desse mercado e da proliferação de inúmeras pequenas prestadoras de serviço que foram tentando se estabelecer e agora passam por processo de consolidação.

O movimento é liderado por companhias elétricas tradicionais, como Engie, Enel e CPFL, que criaram ou reestruturam empresas voltadas para os chamados serviços ancilares, mas outros players do mercado também têm buscado se posicionar.

“É uma tendência do mercado os grupos investirem em inovação, em novas tecnologias aplicadas a energia, especialmente voltadas para questões relacionadas à eficiência”, comentou a sócia do escritório Perlman Vidigal Godoy Advogados, Ana Carolina Freire Gentil, comparando o movimento ao observado no setor bancário, com o “Open Banking”.