SÃO PAULO (Reuters) – A indústria da construção civil revisou para baixo pela primeira vez em 10 trimestres sua perspectiva de crescimento do setor, cortando a estimativa de alta de 2,5% em 2023 para uma projeção de expansão de 2%, segundo dados divulgados nesta terça-feira pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic)

“Se estamos revisando para baixo…isso ocorre porque a causa não está sendo devidamente enfrentada e devemos ter mais problemas do que já estamos tendo”, afirmou o presidente da entidade, José Carlos Martins, durante feira do setor de construção, Feicon.

Em 2022, o setor cresceu 6,9%, após uma expansão de 10% em 2021, segundo os dados da entidade.

O setor da construção enfrenta problemas que incluem uma onda de saques às cadernetas de poupança, cujos recursos financiam parte relevante das vendas de imóveis residenciais do país, além de um descasamento entre os valores dos imóveis compatíveis com financiamento pelo FGTS em meio ao avanço da Selic para 13,75% ao ano.

Somente no primeiro trimestre, a poupança perdeu 41,5 bilhões de reais, mais do que o total de 34,75 bilhões de 2021 e cerca da metade da captação líquida negativa recorde de 81 bilhões de reais de 2022, segundo os dados da Cbic.

“Onde poderia financiar não tem dinheiro (SBPE) e onde pode financiar não tem limite técnico (FGTS) para isso”, disse Martins, citando que o conselho curador do FGTS ainda não conseguiu se reunir neste ano pois faltam indicações para membros do grupo pelo governo federal.

Questionado sobre a alta abaixo da esperada do IPCA, divulgada pelo IBGE nesta terça-feira, um sinalizador de possível redução de juros adiante, Martins afirmou que “se o juro (Selic) não baixar, sim, vamos revisar de novo (para baixo)”.

“Teria que baixar a taxa de juro da economia para a gente manter (a projeção atual) ou quem saber elevar”, afirmou.

Apesar do corte na perspectiva do setor, se a projeção de crescimento de 2% for confirmada este ano, 2023 marcará o terceiro ano consecutivo de expansão da indústria da construção acima do desempenho do PIB.

Martins voltou a cobrar uma revisão nos tetos de financiamento habitacional pelo FGTS, diante da alta de custos que fez o setor elevar preços dos imóveis, ajustes no programa Minha Casa Minha Vida e defendeu a liberação de compulsórios de bancos para ajudar no crédito aos consumidores.

Segundo os dados da CBIC, no primeiro trimestre o índice de expectativa de novos empreendimentos caiu para 51,2 pontos, perto da linha de 50 que divide crescimento de contração. Um ano antes, o indicador estava em 55,7 pontos.

Já o índice de confiança do empresário da construção recuou a 50,8 pontos, ante 55,9 no primeiro trimestre de 2022.

Segundo a Cbic, a construção de edifícios foi o segmento do setor de construção com a maior redução no ritmo do mercado de trabalho no primeiro bimestre, com uma queda de 29,4%, para 25.705 postos de trabalho.

Martins também criticou mudanças feitas via decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao marco do saneamento na semana passada, que deram mais tempo para empresas estatais se adequarem às regras do setor ante a concorrência de rivais privados mais capitalizados.

“Não podemos voltar no tempo no saneamento…Não é possível que o saneamento seja levado como fato político ao invés de questão de saúde pública”, afirmou.

O presidente da Cbic ainda classificou como “iniciativa infeliz” uma eventual liberação de recursos do FGTS para aquisição de carros. Nesta semana, o presidente da associação de montadoras, Anfavea, Márcio de Lima Leite, citou que a medida, se implementada, “teria efeito muito grande para o mercado” automotivo.

Em janeiro, um projeto foi apresentado na Câmara dos Deputados para permitir que o trabalhador saque o saldo disponível do FGTS para a compra de veículo novo ou usado.

“Não tem cabimento o FGTS financiar carro. O fundo não foi feito para isso”, disse Martins, recordando as origens da criação do fundo em 1966.

(Por Alberto Alerigi Jr.)

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