Chefe de Estado de origem militar, ameaça de uso da força contra as instituições, incitação da violência em nome do bem contra o mal, questionamentos sobre a legitimidade eleitoral, apropriação de símbolos nacionais, populismo como política de Estado e perpetuação de poder… Tudo isso poderia descrever os trágicos governos bolivarianos da Venezuela, com Hugo Chávez (que comandou o país de 1999 até morrer, em 2013) e Nicolas Maduro (desde 2013). Mas pode definir também a cartilha de Jair Bolsonaro. Lá, os de esquerda. Aqui, o de direita. “As posições aparentemente contrárias na ideologia são semelhantes no comportamento”, disse o economista e cientista político George Castaneda, professor da New York University. Os palácios do Planalto e de Miraflores nunca estiveram tão perto.

1 – Imagem negativa no exterior
A falta de transparência nos dados oficiais da pandemia na Venezuela e a demora do Brasil em reagir ao avanço da doença — que já matou 675 mil pessoas — ajudaram a arranhar a imagem de ambos os países nos últimos anos. Nenhum país do mundo lidou de forma tão ruim com a pandemia do novo coronavírus como o Brasil, segundo um estudo publicado pelo Instituto Lowy, da Austrália. O levantamento levou em conta a reação à crise em 98 países, com base em seis critérios: mortes confirmadas; casos confirmados; casos por milhão de habitantes; mortes por milhão de habitantes; casos em proporção à testagem; número de testes por mil habitantes. “O uso da economia como ferramenta de subserviência à política é o que mais chama a atenção no exterior”, disse o economista e cientista político Ricardo Wahren.

2 – Aumento vertiginoso da miséria
Entre 2020 e 2022 mais de 14 milhões de pessoas entraram no mapa da fome no Brasil, somando 33,1 milhões de pessoas segundo a Rede Penssan. Por aqui, 125,2 milhões de brasileiros vivem com algum grau de insegurança alimentar (58% da população), o que representa 7,2% mais que em 2020. Em relação a 2018, a alta foi de 60%. Já na Venezuela, segundo Pesquisa Nacional de Condições de Vida (Encovi), 94,5% da população está em algum nível de pobreza. O mais notório é a pobreza extrema, que abriga 76,6% da população da Venezuela.

3 – Instituições sob ameaça constante
Os ataques de Bolsonaro ao STF e ao TSE levaram um grupo formado por juristas e acadêmicos brasileiros a encaminhar, na quinta-feira (7), um relatório à Comissão Interamericana de Direitos Humanos afirmando que o presidente é um risco à democracia e ao Judiciário. O relatório destaca que Bolsonaro atacou, sem provas, autoridades judiciárias e incita a população a fazer o mesmo. Na Venezuela, com Maduro comandando os Poderes, os direitos e deveres se misturam. Em 2021 a ONU definiu que o Judiciário do país é usado como ferramenta de repressão após escândalos de vista grossa para tortura e prisões arbitrárias.

4 – Inflação
Quando há instabilidade dentro do país e crise econômica no exterior há grandes chances de a inflação acelerar. E na Venezuela ela tem sido recorrente. Chegou a 1.000% em 12 meses em novembro de 2018, mas tem sido domada com a dolarização da economia. Segundo dados do Banco Central da Venezuela, o índice de preços ao consumidor foi de 1,4% em março. Em 12 meses ainda está em 172%. No Brasil o fantasma da inflação volta a assombrar. A alta de 11,89% no IPCA em 12 meses até junho é uma preocupação. E tanto Bolsonaro quanto Maduro usam como único remédio a subida de juros.

5 – Populismo 
Se baixar preço dos combustíveis é sinal de boa gestão, Nicolás Maduro é o melhor presidente do mundo. De 7 a 13 de junho, o preço do litro da gasolina por lá era R$ 0,11, informa o ranking Global Petrol Pricess. Por aqui o valor é 52 vezes mais alto. Bolsonaro usa a redução dos preços como aposta de campanha.

6 – Governo militarizado
O governo de Jair Bolsonaro chegou a superar o da Venezuela, proporcionalmente, na nomeação de militares como ministros. Em 2020, os militares controlavam oito dos 22 ministérios: 36,36%. Na Venezuela, onde há menor alternância nas posições, os militares comandam dez dos 34 ministérios, ou 29,4%, segundo a ONG venezuelana Control Ciudadano. Além da alta cúpula, um relatório de 2021 do Tribunal de Contas da União (TCU) mostrou que o governo federal mais que dobrou a presença de militares em cargos até então ocupados por civis. No último ano do governo do ex-presidente Michel Temer, 2.765 militares ocupavam esses cargos. O número saltou para 3,5 mil em 2019 e 6,1 mil em 2020.

7 – Corrosão da liberdade de imprensa
O Brasil é o terceiro país que mais perdeu liberdade de expressão entre 2011 e 2021, mostrou o Relatório Global de Expressão 2022 no final de junho. A queda foi de 38 pontos em uma escala de 0 a 100, ficando atrás apenas de Hong Kong e Afeganistão. O país ficou na 89a em 2010. No país de Maduro, só em 2021 foram 244 denúncias na ONU de violações à liberdade de imprensa. Ele ainda foi denunciado na ONU por elevar o imposto que incide sobre o papel jornal para estrangular publicações impressas.