E chegamos às portas do impasse absoluto. Com a ameaça de greve generalizada se confirmando no amplo universo do funcionalismo público, o mandatário Jair Bolsonaro está fulo da vida com o ministro Paulo Guedes, a quem atribui toda a culpa pelo ocorrido. Esquece-se que foi ele, em pessoa, quem criou o problema em curso ao manifestar o desejo de aumento salarial específico para as categorias policiais — necessidade essa que nem era tão urgente e inevitável assim, dado que tais profissionais integram uma parcela privilegiada dos servidores que vêm obtendo, há algum tempo, revisões de soldo acima da inflação. Não existia verba para a bondade presidencial, mas o capitão forçou a porta. Deu no que deu. O ministro, para atendê-lo, foi buscar recursos extras em pedaços de orçamentos de outras áreas. Um exercício contábil hercúleo que depois gerou a montanha de pressões sem fim, agora prestes a desmoronar. Aprovada no Congresso a concessão do aumento, logo explodiram insatisfações em série dos demais, como Guedes havia previsto e avisado ao presidente. A celeuma no funcionalismo está montada, com poucas chances de uma solução a bom termo. Ocorre que um mero aumento de 1%, indistintamente, significaria gastos da ordem de R$ 5 bilhões que não estão previstos na peça orçamentária. Muitos segmentos de servidores públicos vêm exigindo até 28% de reajuste. Ou seja: quase 30 vezes mais que o máximo possível para o governo. Imagine o tamanho da confusão! Bolsonaro tentou recuar: falou que não estava garantido aumento para ninguém. Emenda pior que o soneto. Com a faca no pescoço, correu para a tática manjada de sempre. A culpa foi jogada nos outros. Ele aparece de bacana, dizendo que quer dar reajuste a todos, que acha justo, e atribui a responsabilidade pela negativa ao ministro, aos parlamentares, até mesmo à oposição. O mandatário não se emenda. Fruto da mesma postura passional e irracional é a irritação que passou a alimentar contra o subordinado da Economia. Como garoto mimado, que não gosta de ser contrariado, mesmo diante da evidência da falta de recursos para tanto, resolveu transferir a gestão do Orçamento para o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. Aos olhos do mercado, foi um descredenciamento claro do papel e da importância do seu antigo czar, o propalado “Posto Ipiranga” do governo. Guedes segue gerindo a pasta da Economia, mas pouco apita. As relações entre ele e o presidente nunca estiveram tão difíceis. Passa pelo pior momento e convivas do presidente aproveitam para pedir a cabeça dele. Querem que Guedes saia na rodada de trocas que o mandatário deve fazer em outras pastas em abril próximo. De uma forma ou de outra, o grau de confusão do movimento dos grevistas é que irá pautar os humores do Planalto nesse sentido. Caso as paralisações, como a da Receita Federal, evoluam ao limite do colapso, o ministro, mesmo gozando de uma boa e histórica relação com o capitão, será lançado aos leões.

Carlos José Marques, Diretor editorial