Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato, anunciou sua demissão do Ministério da Justiça na manhã desta sexta-feira (24). Em coletiva de imprensa, o ex-ministro disse que sempre teve medo de interferência da presidência nas funções da Pasta, tipo de condução que o presidente Jair Bolsonaro teria indicado que violaria em diversos momentos como forma de proteger aliados próximos. A demissão acontece em meio à exoneração de Maurício Valeixo do cargo de diretor-geral da Polícia Federal (PF), publicada na edição do dia do Diário Oficial da União (DOU).

O ex-juiz disse que Bolsonaro queria alguém para indicar andamentos de investigações internas da PF, indo contra as funções desempenhadas por um diretor-geral na Polícia. “O presidente queria ter alguém do contato pessoal dele, para ligar, colher informações, colher relatórios de inteligência. Não é o papel da PF prestar esse tipo de investigação”, disparou ele durante a coletiva.

“Meu entendimento foi que eu não tinha como aceitar a substituição. Há uma questão envolvida na minha biografia. Eu respeito a lei, a impessoalidade no trato das coisas do governo. Vivenciei isso na Lava Jato”, apontou o ex-ministro.

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Em outro momento, Moro fez indicações contundentes contra o presidente sobre mais interferências políticas em favor de políticos do seu entorno, agora envolvendo inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF). “O presidente também me informou que tinha preocupação com inquéritos em curso no STF e que a troca também seria oportuna por este motivo. Também não é razão que justifique a troca, gera uma grande preocupação.”

Um dos filhos de Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro, é investigado no STF pelo esquema de “rachadinhas” envolvendo funcionários de seu gabinete enquanto era deputado estadual no Rio de Janeiro.

Moro não gostou da indicação, ainda na quinta-feira (23), de que Valeixo seria demitido pelo presidente. A troca do substituto, no entanto, seria condicionada a uma nomeação do então ministro, o que não aconteceu. Ele disse que não tem vocação para ser “carbonário” e que tentou contornar a crise para agravar as tensões neste momento de quarentena contra o coronavírus. “Para evitar crise durante a pandemia, eu sinalizei que vamos substituir Valeixo por alguém com perfil técnico e que fosse uma sugestão minha. Não obtive resposta”, observou.

A edição desta sexta do Diário Oficial veio com a exoneração, “a pedido”, de Valeixo, o que teria causado surpresa a Moro e sua equipe.

“Fiquei sabendo da exoneração pelo Diário Oficial. Não assinei essa desoneração”, afirmou o ministro. A publicação do ato de retirada de Valeixo do comando da PF, no entanto foi publicada com Moro como um dos autores.

O documento assinado pelo presidente no DOU mostra que a exoneração aconteceu “a pedido”, indicando que Valeixo pediu para sair. Moro indicou que Valeixo não se voluntariou a sair do cargo, como mostraria o ato presidencial. “Isso não é totalmente verdadeiro. O ápice da carreira de um delegado da PF é a direção-geral. Ele entrou com uma missão. Claro que depois de tantas pressões para que ele saísse, até ele achou que talvez fosse melhor ele sair, nunca voluntariamente.”

Moro avaliou que o ato de exoneração de Valeixo “é uma indicação que o presidente me quer fora do cargo”.

“A questão não é quem colocar, mas o porquê trocar e permitir a interferência política na PF”, comentou Moro sobre a substituição de Valeixo e outras mudanças futuras em cargos de confiança do ministério no governo. “Foi me prometido carta branca para nomear todos os assessores”, completou.

“Abandonei os 22 anos de magistratura. É um caminho sem volta, mas quando assumi [o cargo], sabia dos riscos. Vou descansar um pouco. Nesses 22 anos, tive muito trabalho, não tive descanso durante a Lava Jato e no cargo de ministro. Vou procurar um emprego. Não enriqueci no serviço público”, refletiu.