O número de investidores pessoa física na bolsa brasileira atingiu a casa dos 5 milhões. Um marco na história do mercado de capitais e o dobro do registrado em 2020. Na esteira desse crescimento acelerado, nos dois últimos anos também dobrou o número de agentes autônomos por todo o País, somando cerca de 15 mil. Esses profissionais atendem especialmente o público mais novo do mercado financeiro, tirando dúvidas e servindo como uma bússola com os caminhos para adentrar no complexo mundo dos investimentos. E foi esse papel de “aconselhador financeiro” aumentou a popularidade deles entre os clientes.

Na última semana, um dos maiores empecilhos para o avanço no número desses profissionais pode ser superado. O Senado deve votar na terça-feira (8) a Medida Provisória 1072/2021. Já aprovada por unanimidade na Câmara dos Deputados, no último dia 22 de fevereiro, ela pode perder a validade após o dia 10. A maior mudança proposta diz respeito à forma de cálculo das taxas de fiscalização cobradas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Dessa forma, os agentes pessoa física terão uma redução de 80% nos valores anuais e os escritórios, na pessoa jurídica, pagariam 50% menos.

Pelas antigas regras, um agente autônomo de investimento paga R$ 2.538 por ano. Já um escritório paga R$ 5.077 por ano, mais R$ 2.538 por agente autônomo atuando no escritório. Pela nova regra, o agente autônomo passa a pagar R$ 530 por ano e os escritórios R$ 2.538,50. “Essa redução vai abrir oportunidades para novos agentes e vai aumentar a competição no setor financeiro”, disse o porta-voz da Associação dos Assessores de Investimentos Livres (Ais Livres), Alfredo Sequeira Filho. Em uma apresentação feita para o ministro da Economia, Paulo Guedes, o representante comparou os valores pagos anualmente por outros profissionais como o médico, que paga cerca de R$ 800 de CRM e o advogado, quase R$ 997,30 de OAB. “Um escritório com 100 profissionais paga R$ 258.929,00 de taxas para a CVM, valor superior aos R$ 253.851,40 pagos pelos cinco maiores bancos do Brasil juntos no período”, afirmou Sequeira Filho.

Rodrigo Rodrigues

“A redução das taxas deve elevar o número de profissionais nesse mercado” Tiago Feitosa CEO da C2 Educação.

Segundo CEO da C2 Educação, Tiago Feitosa, as taxas são pagas por consultores, analistas, gestores de carteiras, auditores independentes e todo o ecossistema do mercado de capitais para que o órgão regulador faça a fiscalização. “Mas nós, que preparamos os profissionais para os exames de certificação obrigatórios no mercado financeiro, percebemos que isso era uma barreira de entrada”, disse Feitosa. Para ele, são infundados os argumentos de que a redução das taxas poderia comprometer a capacidade de fiscalização da CVM. “Com a redução, novos profissionais entrarão nesse mercado, aumentando o número de pagantes.”

Questionada se as mudanças podem causar prejuízo para a fiscalização, a CVM não disse nem sim, nem não. “Estamos acompanhando a tramitação da MP 1072 e, caso sua conversão em lei se confirme, faremos nova comunicação tratando dos benefícios gerados pelas mudanças no texto da Lei 7.940/89”, disse em nota.

A entrada de novos agentes não traz riscos ao investidor. Segundo o sócio do escritório Warde Advogados e professor de direito societário do Ibmec e Insper, Isac Costa, para atuar no mercado de capitais esses profissionais precisam passar em um rigoroso exame para conseguir uma certificação e assim poder atuar. “O fato de termos mais agentes não quer dizer que teremos uma qualidade duvidosa”, afirmou. Para o advogado, que já atuou na CVM, os serviços do órgão fiscalizador não devem ser afetados por falta de recursos. Isso porque, além da redução das taxas, foi incluída uma nova taxa de fiscalização de ofertas públicas de valores mobiliários dispensadas de registro. “É possível até que haja um aumento da arrecadação, porque antes essas ofertas não pagavam e agora pagarão 0,03% sobre cada operação, incluindo ofertas iniciadas em 2021 com encerramento para 2022.”

CONTROVÉRSIA Dois únicos pontos ficaram de fora do texto da MP 1072, desagradando os agentes autônomos. Um deles trata da possibilidade de se ter sócios capitalistas em escritórios de agentes autônomos. O outro diz respeito à questão da exclusividade de atuação dos agentes autônomos junto às corretoras, que obriga os profissionais a estarem ligados apenas a uma delas. “Só uma corretora reúne cerca de 80% dos agentes autônomos no País, o que impede uma concorrência maior”, afirmou Sequeira Filho.

Mas para o advogado do Warde, isso é um ponto sensível porque permite que um agente atue em várias corretoras, o que abre um espaço para troca de informações de clientes entre empresas. “Mesmo assim a MP já será um avanço e deve permitir o surgimento de um novo profissional: o planejador financeiro, que mais do que oferecer produtos das corretoras eles irá ajudar o investidor, especialmente os novatos, entendendo sua realidade econômica e sugerindo os melhores investimentos”, disse.