Os prognósticos para o crédito têm estado no centro das discussões. Depois de um crescimento vigoroso nos últimos dois anos, o panorama parece sombrio. Vários entraves ameaçam o crescimento sustentado dos empréstimos. Em primeiro lugar, a crise internacional, que pode reduzir a oferta de recursos externos para os bancos. Em seguida, seus efeitos colaterais internos, como a redução do crescimento econômico e a consequente elevação da inadimplência. No entanto, uma análise mais acurada dos dados mostra que as notícias da crise do crédito pecam pelo exagero. O crescimento dos empréstimos desacelerou, é certo. Mesmo assim, os indicadores mostram que o sistema continua vigoroso. Na opinião dos especialistas, ainda que as piores projeções se confirmem, o problema será muito menor que o susto de 2008. “Não há uma bolha de empréstimos”, diz Ricardo Loureiro, presidente da empresa de análise de informações de crédito Serasa Experian.

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Segundo Loureiro, em 2008, os problemas bancários americanos foram causados porque muitos devedores nos Estados Unidos financiaram investimentos especulativos contraindo dívidas e não conseguiram honrar seus compromissos. O cenário é bastante diferente no Brasil de 2011, pois os bancos concedem menos empréstimos e são mais bem  fiscalizados do que os dos Estados Unidos. O executivo sustenta sua avaliação observando o indicador mais importante para quem concede empréstimos: a inadimplência do tomador. Os bancos vão continuar emprestando, enquanto os números dos pagamentos em atraso permanecerem bem-comportados – e é isso o que vem ocorrendo. “A inadimplência apresentou uma pequena piora, mas nada comparável ao que foi registrado em 2008”, diz ele. A imensa maioria dos devedores paga suas dívidas em dia, liberando os recursos para os bancos e financeiras emprestarem para outros clientes. Com isso, o sistema permanece saudável, diz Loureiro. 

 

Em agosto, para cada R$ 100 em empréstimos concedidos, R$ 6,70 não voltaram para os bancos e financeiras. Essa cifra deve crescer até R$ 6,90 no fim do ano, e permanecer nesse patamar, avalia Loureiro. “A inadimplência subiu um pouco por causa da aceleração da inflação, mas não notamos um problema sistêmico tanto nos empréstimos para os indivíduos quanto para as empresas.” A inflação afetou as famílias mais endividadas. A conta é simples: em um orçamento apertado, cada real faz diferença. Se os preços dos alimentos avançam, sobra menos dinheiro para pagar as prestações. “O resultado é que o crescimento dos empréstimos está muito menor do que no ano passado”, diz Décio Carbonari de Almeida, presidente da Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef). O financiamento de veículos foi um dos principais combustíveis para o aumento dos empréstimos a partir de 2008. 

 

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Feirão imobiliário: aumento das vendas de imóveis não tem pressionado a capacidade dos bancos de emprestar

 

O temor de que os bancos exagerassem na dose levou o Banco Central (BC) a restringir as condições de concessão no início deste ano. Com isso, o crescimento dos empréstimos automotivos, que vinha sendo de 25% em média entre 2006 e 2010, deve encolher para apenas 10% em 2011. Na ponta do lápis, diz ele, esses empréstimos devem fechar 2011 com um total de R$ 204 bilhões. “Isso representa R$ 15 bilhões a menos no total de empréstimos concedidos”, afirma. Almeida também diz estar pessimista com os prognósticos para o calote. Segundo os dados da Anef, os atrasos de pagamento superiores a 90 dias eram de 2,5% da carteira no fim do ano passado, e esse percentual avançou para 4,2% em agosto, dado mais recente disponível. “Mais e mais consumidores de baixa renda estão deixando de honrar suas prestações”, afirma. De acordo com ele, cerca de 66% dos inadimplentes nos empréstimos de veículos costumam ter problemas temporários de caixa. 

 

Assim, os eventuais atrasos são resolvidos em menos de 30 dias. Esse percentual vem caindo sistematicamente. No entanto, Almeida diz acreditar que o calote não chegará aos 10% registrados em 2009, na ressaca da crise financeira do ano anterior. No caso dos financiamentos ao consumo, os especialistas avaliam que os solavancos provocados pela crise já foram absorvidos pelo sistema. “A alta recente da inadimplência devido à aceleração da inflação será compensada nos próximos meses pela redução dos juros”, diz o economista Márcio Nakane, sócio da consultoria Tendências. Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi) avalia que os excessos recentes na concessão de empréstimos consignados vão começar a ser purgados pelo sistema bancário. “Os créditos cresceram muito depressa, mas as medidas de restrição, que elevaram o pagamento mínimo, vão promover um saneamento”, diz ele.

 

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