Os ?robôs? da linha de montagem do Citroën Xsara Picasso 2.0, em As mãos ágeis de Marcos André Leandro deslizam sobre as teclas da máquina de escrever. Seu trabalho é verificar se o alfabeto braile impresso nos teclados está correto. Ele é um dos deficientes visuais que trabalham na linha de montagem da Associação Laramara, uma entidade de assistência a cegos que encontrou um novo caminho para se sustentar: a atividade industrial. A falta de dinheiro que costuma tirar o sono das organizações de assistência a deficientes não parece, agora, incomodar tanto a Associação. No leque de produtos estão, além das máquinas de escrever com teclado em braile, impressoras de rótulos e bulas de remédio para cegos e até uma gravadora de CDs. ?Queremos mudar o conceito de que entidade social só pede. Há outras possibilidades de receita sem passar o chapéu?, resume Conceição Sadriano, coordenadora de marketing e eventos. Atualmente, 50% dos recursos da entidade vêm do bolso do próprio fundador, Victor Syaulis, sócio da Aché Laboratórios. Siaulys e a mulher Mara são os pais de Lara, a jovem de 22 anos que nasceu sem visão e motivou a família a criar a entidade. Até hoje 4 mil pessoas já foram atendidas ? por mês são 400. Boa parte da freqüência é de crianças e adolescentes.

Para ganhar um ?jeitão? de empresa, todas as unidades da Laramara estão sendo reformuladas e outras novas desenvolvidas. A associação foi a primeira na América Latina a fabricar uma máquina de escrever em braile. Os aparelhos começaram a ser construídos há pouco mais de um ano na oficina da Laramara. Quatro técnicos foram treinados nos Estados Unidos pela entidade Perkins School for the Blind, dona da tecnologia para produzir o equipamento e fornecedora das peças. Da fábrica da Laramara saem por mês 40 máquinas de escrever. A aceitação do produto é boa e o principal motivo é o preço. Enquanto um equipamento importado custa entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, o da associação é vendido por R$ 1,2 mil. As vendas só não são maiores por causa das dificuldades financeiras das escolas e entidades que precisam da máquina. Foi criado então um tipo de patrocínio, no qual empresas e voluntários podem ajudar comprando cotas a partir de R$ 15. Funciona da seguinte forma: quando se completa 80 cotas, uma das crianças ou adolescentes de outras entidades, cadastrados na Laramara, recebe um equipamento. Hoje há 535 máquinas em estoque e 800 pessoas esperando pela doação. Até o fim do ano as máquinas também começarão a ser exportadas para a América Latina.

Há duas semanas foi inaugurado um estúdio fonográfico, nova ferramenta para reforçar o caixa da entidade. Será usado para gravações de ?audio books? e CDs. O investimento inicial de US$ 50 mil serviu para a construção e compra de equipamentos, o que, segundo Ricardo Ibri, diretor da nova unidade, deu ao empreendimento o status de um dos 20 melhores estúdios do Brasil. A gráfica, especializada na impressão de rótulos e bulas de remédios, também vai se destacando nas atividades empresariais da Laramara. Tem uma receita mensal de R$ 300 mil, o suficiente para garantir 20% dos recursos utilizados pela instituição. A associação tem outras três unidades de negócio. Uma delas é um hotel em Mairiporã (Grande São Paulo), a Estância Lajota, que está sendo adaptada para receber eventos de empresas, e o Café Teen, onde podem ser feitos encontros de negócios ou palestras para até 200 pessoas. Há também um centro para crianças, em São Paulo, onde elas passam horas se distraindo com atividades como aulas de pintura, culinária e teatro. Se tudo acontecer de acordo com o que a direção da entidade espera, em breve o chapéu vai ser coisa do passado.