No poema de Augusto dos Anjos, a mão que afaga é a mesma que apedreja. Nos últimos dias, o ex-banqueiro Luiz Cezar Fernandes, criador de dois ícones do mercado brasileiro, o Pactual e o Garantia, descobriu que a frase funciona no sentido inverso ? a mão que apedreja, por vezes, afaga. Na manhã da segunda-feira 5, ele ligou para seus antigos sócios do Pactual.

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Tinha urgência em falar com André Esteves, dono do banco e hoje um dos homens mais ricos do Brasil, mas também seu ex-funcionário. Não um qualquer, mas aquele que assumiu o comando do Pactual em 1999, colocando os antigos donos contra a parede ? o que fez Luiz Cezar declarar que André ?venderia até a mãe? para subir na vida.

Na semana passada, no entanto, o antigo banqueiro precisava de um favor. Sua casa, a Fazenda Marambaia, uma das mais belas propriedades rurais do País, iria a leilão em 72 horas. Era a garantia de um empréstimo de R$ 6 milhões, contraído junto ao BBM, da família Mariani. ?Nós o atendemos na hora?, disse à DINHEIRO Antônio Carlos Porto, um dos sócios do Pactual, que foi contratado pelo próprio Luiz Cezar.
 

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Uma fazenda em garantia: Luiz Cezar fez um contrato de alienação fiduciária da propriedade, que tem jardins

projetados por Burle Marx, num empréstimo de R$ 6 milhões contraído junto ao banco BBM

 

?Temos grande respeito e admiração por ele.? Dois dias depois, o depósito foi efetuado, numa operação intermediada pelo banqueiro Edson Macedo, da SolFin. ?Está resolvido, foi feito o pagamento?, confirmou à DINHEIRO o advogado José Castro Neves, representante do BBM.

A surpreendente história expõe os bastidores de uma operação entre figurões do mundo das finanças, mas representa também uma parábola sobre os limites da ambição humana. Luiz Cezar criou o Pactual, mas saiu antes das grandes tacadas do banco. Deixou a casa após se desentender com os sócios sobre qual seria o melhor caminho a seguir ? ele defendia uma instituição de varejo, enquanto os mais jovens, como Esteves, queriam continuar à frente de um autêntico banco de investimentos. Veio a febre dos IPOs e os garotos do Pactual se tornaram bilionários.

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Mariani, o algoz Dono do BBM executou a garantia sem antes ligar para o cliente. Luiz Cezar era seu amigo

 Fora desse jogo, mas com ânsia de recuperar o protagonismo na cena empresarial brasileira, Luiz Cezar tentou voltar à ribalta várias vezes. Criou um banco com o embaixador Jorio Dauster, mas a iniciativa não deu certo. No ano passado, no entanto, surgiu uma chance. Com a crise financeira global, o alemão Commerzbank decidiu colocar à venda os ativos do Dresdner no Brasil.

Luiz Cezar fez uma proposta de US$ 100 milhões, deu uma entrada relativamente modesta e conseguiu um contrato de exclusividade até 4 de dezembro do ano passado para liquidar o restante. ?A crise é o melhor momento para investir?, disse ele à época.

Luiz Cezar só não contava com as pedras no caminho. Seu parceiro na compra seria o polêmico financista Eugênio Holanda, dono da Tetto Habitação, que bancaria a maior parte dos US$ 100 milhões. O Banco Central, no entanto, não aprovou o nome de Holanda e Luiz Cezar ficou sozinho na aventura. Para não perder a oportunidade, pediu um empréstimo de R$ 6 milhões junto ao BBM, pagou a parte já desembolsada por Holanda e saiu em busca de novos parceiros. Com a operação vencida, o banco liderado por Pedro Henrique Mariani determinou o leilão judicial da Fazenda Marambaia. ?Eu esperava ao menos um telefonema?, disse Luiz Cezar, magoado, à DINHEIRO. ?Éramos amigos.?
 

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Esteves, o salvador Sócio do BTG Pactual atendeu em minutos ao pedido de ajuda feito pelo ex-patrão

Depois de liquidar a operação junto ao BBM, o ex-banqueiro conseguiu evitar o pior. Continuará dono da Fazenda Marambaia, que é também sua residência. Localizada na cidade de Correias, nas proximidades de Petrópolis, a fazenda tem 400 hectares, jardins projetados por Burle Marx e uma das mais belas sedes do País.

Lá que Luiz Cezar mantém sua criação de ovelhas e alguns dos reprodutores mais premiados do ranking nacional. É uma propriedade tão suntuosa que vale bem mais do que os R$ 6 milhões que eram devidos ao BBM ? tanto que o preço mínimo do leilão havia sido fixado em R$ 12 milhões. Comenta-se até que o próprio Mariani teria interesse em ficar com a Marambaia.

Se a fazenda foi preservada, dificilmente Luiz Cezar terá chances de ficar com o Dresdner Bank. Um dos candidatos à compra é o próprio BBM. Outro é o Royal Bank of Canada. Passado o susto, talvez seja a hora de Luiz Cezar redimensionar suas ambições. O foguete do Pactual decolou ? e ele ficou de fora.

E hoje, seus antigos estagiários, como Esteves, são seus credores, que estendem a mão generosa, mas têm, como garantia, a própria Fazenda Marambaia. O ex-banqueiro, no entanto, já pensa na próxima tacada. ?O Brasil está num grande momento e eu preciso pegar essa onda?, disse Luiz Cezar à DINHEIRO.