A tradicional fabricante austríaca de cristais aposta no conceito omnichannel, investe em relógios e anuncia planos para crescer no País

Ao assumir a presidência do conselho executivo da Swarovski, em 2002, Robert Buchbauer deu de cara com um cenário nada excitante: a receita da empresa estava estagnada e o lucro em queda. Para driblar as dificuldades e voltar a crescer, ele, que é tataraneto do fundador (o austríaco Daniel Swarovski), decidiu rever as estratégias da companhia. Para dar mais visibilidade à marca, apostou no segmento de joias e fez investimentos robustos em e-commerce. Foi o próprio Buchbauer quem executou a estratégia. Deu certo. O grupo mais que dobrou o faturamento, chegando a US$ 3,9 bilhões no último ano. Nesta entrevista à DINHEIRO, o executivo conta que, apesar de o Brasil ser um mercado de alta relevância para a Swarovski, as taxas de importação ainda são um grande empecilho para aumentar as vendas no país.

“O cenário político e as barreiras comerciais são situações desafiadoras que fazem os nossos produtos ficarem muito caros no Brasil”, diz. Ainda assim, Buchbauer tem planos para abrir novas lojas por aqui e já prepara a renovação das unidades existentes em todo o mundo. “Vamos acelerar o segmento de relógios, mudar o visual das lojas e iniciar um novo processo de venda”, resume.

DINHEIRO – Qual é a estratégia para a Swarovski se manter relevante por quase 125 anos?

ROBERT BUCHBAUER – O espírito de inovação e a reinvenção da companhia de tempos em tempos são os dois pilares mais importantes da Swarovski. Hoje somos uma empresa muito diferente daquela que foi fundada por Daniel Swarovski em 1862. É claro que mantemos as raízes — e o núcleo principal do negócio ainda é o cristal. No entanto, a forma como ele chega até o consumidor mudou drasticamente. Durante décadas, a empresa era puramente orientada para a produção em massa. Esse modelo simples de negócio funcionou por muitos anos. Contudo, a companhia viu que havia a necessidade de fazer algumas atualizações. A primeira mudança veio com a personalização das pedras. Grandes marcas trouxeram suas próprias ideias e requisitos específicos para a produção, como cores, formatos e cortes diferentes. A segunda virada veio com a aposta no mercado de iluminação, já com cristais maiores. Foram essas mudanças que ajudaram a impulsionar as receitas da companhia em momentos de dificuldade.

DINHEIRO – A crise econômica global afetou os negócios?

ROBERT BUCHBAUER – É claro que há momentos de altos e baixos. Como somos uma empresa que tem um histórico recorrente de sucesso, quando há um ano mais lento, ficamos até que satisfeitos. Essas fases mornas acontecem no nosso negócio mas, mesmo em períodos de crise, nossa operação sempre foi rentável. A empresa é familiar e nós não temos acesso ao mercado de capitais. Somos o nosso próprio banco e isso exige que o trabalho seja feito com muita prudência, já que temos que alimentar acionistas e funcionários. Além disso, temos outras duas companhias dentro do grupo Swarovski que ajudam a balancear os riscos: a Tyrolit e a Swarovski Optik. A primeira é voltada para a indústria e fornece ferramentas de corte, perfuração e polimento para outras empresas. A outra é especializada em binóculos e acessórios óticos. Temos um ótimo equilíbrio no nosso portfólio.

“Temos 3 mil lojas ao redor do mundo e queremos abrir unidades maiores nas cidades mais importantes” (Crédito:Divulgação )

DINHEIRO – Dentro dessa gama de negócios, qual é o principal mercado para a Swarovski?

ROBERT BUCHBAUER – Quando eu me tornei o CEO, em 2002, aconteceu uma transformação nos negócios. Antes da minha entrada, o principal mercado eram os cristais para figurinos. Porém, naquele ano, as receitas não estavam crescendo e o lucro estava indo por água abaixo. A nossa primeira ação para contornar esse momento foi acelerar o segmento de joias, que já demonstrava um potencial extremamente promissor, e criar a versão on-line da Swarovski. Hoje só o e-commerce responde por 10% da nossa receita global.

DINHEIRO – Existe o risco de que a marca se popularize muito e perca o nicho de alto luxo?

ROBERT BUCHBAUER – A abordagem do fundador sempre foi democratizar os cristais. Isso aconteceu.
É sempre importante para uma empresa construir e alimentar o topo da pirâmide antes de expandir os negócios para fora. Fazer investimentos de maneira ampla, sem consolidar o topo antes, isso sim poderia representar um problema. Esse é o motivo da nossa aposta em novas tecnologias. Queremos inovar com coisas que podem nem sequer fazer a empresa gerar caixa, mas que vão surpreender o mundo. Hoje não importa se nós somos democráticos e se as peças que a gente produz também são, porque o nosso consumidor já sabe que todas elas são produzidas e fabricadas com o mesmo amor, detalhe e cuidado. Dessa forma não há riscos.

DINHEIRO – Agora que já chegaram ao topo, para onde vai a Swarovski?

ROBERT BUCHBAUER – Nós queremos brilhar e trazer esse mesmo brilho para a vida das pessoas em todo o mundo. Se continuarmos fazendo isso, não há nada para temer. Temos um ótimo futuro pela frente.

DINHEIRO – O que mudou para a empresa depois da aposta no segmento de joias?

ROBERT BUCHBAUER – A Swarovski era o nome de uma empresa e não uma marca. Durante anos fomos reconhecidos na indústria por nossas pedras bonitas e excelente qualidade, mas não éramos uma marca muito conhecida. Por isso criamos diferentes departamentos e profissionalizamos a nossa área de marketing, de design e uma rede de produção internacional. Essa estratégia fez a companhia sair de um patamar de pequena e média para um patamar global.

DINHEIRO – Vocês já estudaram a possibilidade de abrir uma loja de departamentos Swarovski?

ROBERT BUCHBAUER – Nós colocamos essa ideia na gaveta por um tempo, mas eu voltei a olhar o nosso arquivo porque essa é uma proposta realmente boa. Eu gostaria que essa ideia se tornasse parte das nossas lojas próprias. Por um lado, estamos trabalhando com a próxima geração de varejo, que está passando por uma grande transformação, por isso é uma tarefa muito excitante. Mas também é um grande desafio, considerando que nós temos três mil lojas ao redor do mundo. Já construímos uma série de novas tecnologias, funcionalidades e experiências para as novas lojas e queremos abrir unidades maiores nas mais importantes ruas e cidades do mundo. Levando isso em consideração, o próximo passo é colocar essa ideia de loja de departamento em prática para que o nosso espaço seja aberto para criações de outras empresas, mas feitas com os nossos cristais. A ideia é tornar a oferta ainda mais emocionante para o cliente.

DINHEIRO – O que o Brasil representa para a Swarovski?

ROBERT BUCHBAUER – Eu amo o Brasil por muitas razões, mas o que mais me chama atenção é que a cultura de vocês tem uma alta afinidade com o nosso produto. Sempre que nós lançamos produtos para um grupo de latinos, recebemos o melhor feedback. O Brasil é definitivamente um mercado importante para nós.

DINHEIRO – Há planos de expansão no País?

ROBERT BUCHBAUER – Claro. E eles já estão em andamento. Todas as vezes que encontramos uma oportunidade para isso, nós abrimos uma nova loja.

DINHEIRO – Qual é o maior desafio para os negócios da Swarovski no Brasil?

ROBERT BUCHBAUER – A situação política e as barreiras comerciais são desafiadoras. Elas fazem os nossos produtos ficarem muito caros quando importamos para o Brasil. Nós tivemos problemas para trazer itens que não comercializamos, como material de propaganda e móveis para as lojas, pois o imposto de importação é extremamente alto para esse tipo de coisa. É por esse motivo que é caro vender no Brasil. Obviamente, parte desses impostos precisam ser repassados ao consumidor final, mas isso é algo que nós realmente não gostamos. Esse é um fenômeno que enfrentamos em outros países também, como a China.

DINHEIRO – Qual é a estratégia comercial para o Brasil?

ROBERT BUCHBAUER – O Brasil é parte do nosso mercado em crescimento. Trabalhamos com um grupo de países emergentes e com potencial de ascensão. Fazemos investimentos específicos e damos uma atenção especial para dar o suporte necessário e fazer o negócio funcionar. Sabemos que existe potencial, que as pessoas gostam do produto e da nossa marca, então fazemos de tudo para encontrar maneiras e soluções para que elas tenham acesso ao nosso produto.

DINHEIRO – Ainda há espaço para crescer no mercado brasileiro?

ROBERT BUCHBAUER – Sim, definitivamente. Precisamos reconhecer que o Brasil é o motor da América Latina. Se a situação do País permanecer estável, a economia deve crescer e com certeza haverá espaço para expansão. É claro que se acontecer uma crise política isso pode prejudicar os planos…

“Vamos acelerar o segmento de relógios, preparar um novo visual para as lojas e iniciar um novo processo de venda” (Crédito:Divulgação)

DINHEIRO – Qual é o foco dos seus investimentos hoje?

ROBERT BUCHBAUER – No passado, quando acontecia a abertura de uma nova loja, as pessoas questionavam quem seria arquiteto responsável pelo projeto. Hoje em dia, porém, o que realmente importa é a experiência do consumidor. A digitalização trouxe uma série de mudanças e precisamos ter certeza de que as lojas se encaixam nessa nova abordagem omnichannel e que estão totalmente integradas com as funcionalidades digitais. Tudo isso pede muito investimento em tecnologia e também em realidade aumentada para que os clientes possam experimentar o produto e ver todos os detalhes das joias.

DINHEIRO – O que vocês estão planejando para este ano?

ROBERT BUCHBAUER – Estamos rejuvenescendo a imagem da marca sem necessariamente comunicar isso de forma direta. Esse rejuvenescimento vai aparecer nos novos produtos. Já para o próximo ano, vamos acelerar o segmento de relógios, preparar um novo visual para as lojas e iniciar um novo processo de venda. A ideia é criar uma interação entre o consumidor e os aparelhos eletrônicos dentro das lojas Swarovski. Vamos investir algumas centenas de milhares de dólares por loja para fazer essas mudanças.

DINHEIRO – A Swarovski está na quinta geração da família administrando os negócios. Como vocês planejam a sucessão?

ROBERT BUCHBAUER – Ser uma empresa familiar não significa que apenas membros da família podem estar no comando. Até pouco tempo, o nosso corpo executivo era formado com membros externos. Eu encorajo os nossos familiares a trabalhar em outras empresas antes de se aplicarem para uma vaga na companhia. É claro que eu espero ter membros da família na próxima geração de gestores, mas se isso não acontecer vamos encontrar outros talentos.