Executiva assume a direção da empresa no Brasil com a missão de torná-la a melhor de seu segmento ­— e quer promover avanços na equidade de gênero.

Suzeti Ferreira acaba de entrar para o seleto grupo de mulheres em cargos de alta liderança no majoritariamente masculino agronegócio brasileiro. A executiva assumiu o comando da Syngenta Seeds na segunda-feira (2) e tem entre suas prioridades estimular a diversidade de gênero na empresa. “Há muito o que evoluir. Por isso, investimos em ações para sermos mais inclusivos”, disse à DINHEIRO. Mas esse não é o único desafio. Sua missão é fazer da companhia a melhor do segmento. E isso pode ser mais difícil caso o Plano Safra para o biênio 22/23 não obtenha os recursos federais que o setor precisa, da ordem de R$ 330 bilhões, 31% acima do valor liberado.

Dinheiro — Sua promoção para o cargo de comando já era esperada?
Suzeti Ferreira — Em todos os lugares por onde passei, busquei evoluir nesse sentido. A oportunidade de passar pelo processo de seleção para chegar ao cargo mais alto não foi exatamente uma surpresa. Tudo o que fiz me trouxe até aqui. Então, era o momento de mostrar que líder eu sou e quais são meus valores.

Quais são esses seus valores como líder?
O papel de diretora-geral tem extremo impacto, as decisões devem ser tomadas levando em conta as famílias que fazem parte da organização, e na Syngenta Seeds são 1.100. Sempre vamos olhar para o agricultor e para as pessoas dentro da empresa, pois os resultados são muito importantes, mas como fazemos os negócios também é fundamental. Há dois valores primordiais que me trouxeram até aqui. O primeiro é que sou completamente orientada para os resultados. Gosto de realizar. O segundo está nas pessoas. Elas me energizam. Não sei trabalhar sozinha. A colaboração me nutre todos os dias. Por isso, são imprescindíveis a integridade e a lealdade. Como líder, até mais importante do que o resultado é o legado que se deixa.

Como é ocupar uma posição de liderança no agronegócio, um setor majoritariamente masculino e machista?
Me sinto mais responsável nesse momento, inclusive por representar colegas, amigas e mulheres da sociedade. Tenho competências e pontos de desenvolvimento como outras mulheres e a equidade é prioridade. Isso é muito importante porque, como indústria, também temos um papel social. Estamos em um contexto em que 50% ou mais da população é feminina. Me sinto muito feliz e responsável com o papel de ajudar a organização e de preparar a liderança do futuro.

“Quando entrevistamos candidatos, tomamos o cuidado de ter 50% de representatividade feminina para igualar as possibilidades de alcance” (Crédito:Istock)

De que forma irá tratar o tema equidade?
Meu compromisso como líder nessa agenda de diversidade e inclusão é promover um ambiente inclusivo e eliminar barreiras à equidade de gênero. Ainda temos um esforço a ser feito, até pelas características do agronegócio, como você citou. E isso exige ação, exige atitude. No short list dos processos de seleção, toda vez que entrevistamos candidatos tomamos o cuidado de ter 50% de representatividade feminina para igualar as possibilidades de alcance. E também promovemos discussões sobre quais são nossos vieses inconscientes. A gente precisa saber trabalhar em um ambiente diverso.

Essa é uma preocupação global da empresa?
Sim, diversidade e inclusão fazem parte da nossa cultura. Discutimos global e localmente. Eu, inclusive, faço parte de um grupo de liderança global feminina, no qual falamos sobre temas e desafios do mundo inteiro e traçamos ações relacionadas a isso.

Que resultados esse cultura já gerou?
A contração de mulheres na Syngenta Seeds Brasil cresceu 11% na comparação entre 2021 e 2020. Hoje elas representam 33% das admissões. No quadro geral de profissionais, esse índice é 28%; na alta liderança, 32%; e na minha unidade de negócios, diretamente, 45%. Na alta liderança da Amé­rica Latina 40% são mulheres. Ainda há muito o que evoluir, por isso investimos em ações para sermos mais inclusivos, como olhar atentamente o mercado para atrair mais mulheres e ter equidade de fato, para que não sintam qualquer tipo de distinção.

A Syngenta Seeds faturou US$ 4,1 bilhões globalmente no ano passado e cresceu 24% sobre 2020. Como foi no Brasil?
Na América Latina o crescimento foi de 26%. É a região em que a em­presa mais cresceu depois da China, que tem um exponencial maior do que o nosso. Temos uma agricultura mais consolidada, a gente vem de uma base agrícola bastante expandida no Brasil e no Paraguai. Os chineses têm uma estratégia de expansão agrícola bem definida e um potencial muito grande de mercado.

A pandemia da Covid-19 teve início um mês depois de sua chegada à Syngenta. Como você superou aquele momento?
Foi um período que exigiu muita empatia e flexibilidade. Che­guei à empresa como head para venda vertical, que inclui negociações diretas e para os distribuidores. Estava conhecendo o time, formado por mais de 200 pessoas, indiretamente. Para mim, o começo é sempre pelas pessoas, pois o negócio acontece por meio delas. Até viajei, com todas as medidas de segurança, para conhecer parceiros comerciais e clientes. Partici­pei do comitê de Covid e foi muito bom para entendermos que era possível fazer negócios naquele ambiente e manter os relacionamentos. Mas imagine falar para o time de vendas que era preciso negociar via Zoom. Havia muitas incertezas, no entanto tínhamos a confiança de estar no caminho certo.

Vocês querem ser a melhor empresa de sementes da América Latina até 2028. Qual é a estratégia?
A gente dorme e acorda pensando em sementes, pois é aí que começam as decisões do agricultor, é o início de toda sua estratégia para a sequência da safra. Procuramos entender e atender suas necessidades para apresentar a melhor proposta de valor para cada segmento de clientes, e entregar um insumo que garanta maior produtividade e melhores resultados no campo. Estamos bem posicionados nas pesquisas de mercado sobre como o produtor vê empresas e marcas do setor, e acelerando para chegar aos melhores índices.

E como se diferenciam no mercado?
Seguimos em um trabalho forte para aprimorar a oferta de soluções, com qualidade de semente, e o atendimento. Todo o melhoramento genético é baseado em dados. Fazemos muitos testes e correlacionamos os resultados. Assim, aceleramos a vinda de opções ainda mais assertivas. No final do dia, o que fazemos tem de ser bom para o produtor e para o colaborador. Então, será bom também para o investidor. Esse é o trinômio que nos orienta.

O agricultor participa desse processo?
Fazemos ensaios dentro de casa e em determinado momento também realizamos testes nas propriedades de alguns clientes. Há inclusive grandes empresas agrícolas que colaboram com o processo. Fazemos cocriações, até porque é como se nos oferecessem um laboratório. Essa proximidade com o produtor é muito importante, e também um diferencial, pois nos dá a condição de acompanhar todo o ciclo da semente, do cultivo à colheita, e avaliar o resultado. Isso exige muita presença no campo, já analisando a próxima safra.

“O negócio de soja do Brasil está sempre em primeiro ou segundo lugar, temos uma participação enorme na alimentação do mundo” (Crédito:Istock)

Como a empresa se protege da pirataria de sementes, um problema sério do setor?
Trabalhamos com a CropLife Brasil [associação que representa os segmentos de mudas e sementes, biotecnologia, defensivos químicos e produtos biológicos], que tem um comitê específico para tratar desse assunto. A pirataria é algo desfavorável, pois não traz produtividade nem rentabilidade, é contraproducente para qualquer investimento em tecnologia. É muito diferente das sementes salvas, que correspondem a uma parte da colheita reservada pelo agricultor para plantar, desde que seja corretamente declarado.

Que papel tem o Brasil diante dos desafios globais da produção de alimentos?
A agricultura tem impacto fundamental no PIB brasileiro. O interior do País é agrícola e tem enorme influência na renda das pessoas. Como exemplo da representatividade do setor, nosso negócio de soja está sempre em primeiro ou segundo lugar no mundo. Grande parte do nosso grão vai para China, Europa e outras regiões. Temos uma participação enorme na alimentação do mundo. No milho, há grande relevância para o mercado interno, tanto para alimentação animal quanto para a humana. E há potencial de crescer em exportações e produção de etanol. Se houver problema em qualquer safra no Brasil, o fornecimento de alimento no mundo será prejudicado.

Como a guerra na Ucrânia impacta o cenário de oferta de alimentos?
Essa incerteza que vivemos com a guerra na Ucrâniaimpacta em segurança alimentar, principalmente. Aqui no Brasil temos o desafio de garantir a entrega da semente ao agricultor, para que vire alimento e chegue onde precisa. E o que essa guerra está trazendo é a dúvida se vai haver milho e trigo suficiente no mundo, se estamos preparados para atender o aumento de área que pode acontecer. São possibilidades, ainda não temos confirmação. A Ucrânia estaria no período de começar a plantar agora. Se houver o início do plantio, a colheita poderá reduzir a pressão sobre a segurança alimentar. Tudo vai depender dos desdobramentos. Nossa preocupação aqui está muito relacionada a garantir essa disponibilidade de sementes e naturalmente trabalhar com toda a flutuação em torno das commodities, devido às especulações no mercado global de investimentos.