O caminho traçado pela montadora sueca Scania para o Brasil está bem definido: quer, até 2025, tirar de vez o motorista da boleia do caminhão e ser responsável pelo gerenciamento e monitoramento de veículos autônomos. Se tudo sair como planeja, até lá a Lots Group, braço logístico da companhia automobilística, irá triplicar de tamanho. Hoje a logtech fatura R$ 150 milhões ao ano, o que equivale a 60% do faturamento global, e foca horizonte perto de R$ 500 milhões em receita nos próximos quatro anos. “Vamos estar prontos para comercializar e operar a futura frota de caminhões autônomos”, disse Huber Mastelari, diretor-presidente da Lots na América Latina. “Como a tecnologia ainda está em desenvolvimento, no momento somos um laboratório de transporte para desenvolver todos esses dados.”

De fato, ainda há um longo caminho a percorrer para que esse planejamento se torne realidade. E nem tudo depende da empresa logística controlada pela Scania. Um levantamento recente da consultoria KPMG mostra o quanto o Brasil patina nesse assunto. Entre os 30 países medidos pelo Índice de Prontidão para Veículos Autônomos 2020, o País está na última posição. O relatório da empresa aponta que há poucas ações para incentivar a medida. Em 2019, quando foram analisados 25 países, o Brasil já ocupava a lanterna. No documento, o líder de governo da KPMG no Brasil e América do Sul, Maurício Endo, é claro: “Ainda não vemos nenhuma política pública em torno da criação de vias para os veículos autônomos começarem a operar nas cidades”, diz ele. Resumindo: o Brasil não tem legislação para isso e os avanços caminham no ritmo de uma estrada congestionada.

Enquanto isso, a Lots funciona como uma empresa de transporte mais convencional, ainda que com soluções importantes em conectividade e segurança. A empresa na área de agricultura e florestas, que são segmentos que possuem alta demanda logística e que devem aderir de forma mais rápida à tecnologia autônoma. No Brasil, a Vale já conta com carminhões em áreas internas pequenas e são monitorados por GPS.

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“Como a tecnologia autônoma está em desenvolvimento, no momento somos laboratório de transporte da companhia para desenvolver todos esses dados” Huber Mastelari Presidente da Lots na América Latina.

Com 150 veículos em operação no Brasil — incluindo caminhões e máquinas pesadas —, a Lots tem cinco operações para quatro clientes. Um deles é a própria Scania, em que a logtech faz o operação de transporte de contêineres entre o porto de Santos e a planta de São Bernardo do Campo (SP). Os outros casos são de ambientes confinados, ou seja, da porteira para dentro da propriedade. Na prática, os veículos monitorados rodam em estradas particulares. Nesse contexto, a empresa faz a logística em duas usinas de cana-de-açúcar, no interior de São Paulo, e na operação da Suzano, em Três Lagoas (MS), transportando as toras das fazendas da companhia de papel e celulose para as plantas industriais. O contrato na área de mineração deve ter início em janeiro. Os veículos são monitorados por uma torre de controle, que acompanha a movimentação e corrige rotas.

A Lots, que nasceu em 2016 na Suécia, chegou ao Brasil em 2018. À época, eram 16 caminhões no País. O número de funcionários também cresceu, saltando de 50 para os atuais 650. Mas, para crescer, como prevê o diretor-presidente, também é necessário investir. A conta para crescer três vezes de tamanho na receita também vale no caso de veículos e equipamentos. Para alcançar o faturamento planejado de meio bilhão de reais, será necessário também triplicar a quantidade de caminhões e adquirir mais 350. Como cada equipamento custa, em média, R$ 1 milhão, significa dizer que a empresa sueca terá de aportar, até 2025, pelo menos R$ 350 milhões.

Ainda não há definição se os caminhões autônomos, quando o sistema for regulamentado, serão produzidos no Brasil ou na Suécia. A montadora já tem protótipos de caminhões autônomos em atividade no país europeu e na Austrália. “O que nós acreditamos é que até 2025 a tecnologia e os produtos estarão aptos para operar em ambientes confinados no Brasil”, afirmou Mastelari. “Temos tempo, mas precisamos do envolvimento de governos e da indústria.” Com esse cenário otimista, a executivo acredita que, entre 2025 e 2030, poderemos ter caminhões sem motorista rodando em estradas públicas, e não só em áreas particulares. A partir daí, ainda sem data certa, mas não antes de pelo menos 10 anos, em centros urbanos. E é justamente nessa transição que entram os principais desafios. “Precisa de uma tecnologia desenvolvida pelo fabricantes e a garantia da conectividade no percurso, mesmo que seja o modelo 3G ou 4G”, disse o presidente da Lots.

FROTA CONECTADA Lots tem hoje 150 caminhões monitorados por torres de controle no País e que rodam em ambientes confinados. (Crédito:Divulgação)

DISTÂNCIA Mas, para o consultor Carlos Briganti, responsável pela operação da Power Systems Research, o Brasil ainda está muito distante do avanço na tecnologia autônoma. “No agronegócio e na mineração é mais fácil o avanço dessa tecnologia. No Brasil é possível dentro de circuitos fechados. Nas rodovias, há uma limitação grande em relação à infraestrutura brasileira. Temos estradas boas, como em São Paulo, mas no restante do País há muitos problemas. O desafio é muito grande.” Mastelari acredita que seja necessário, antes que as próprias empresas adotem esse modelo, foquem na otimização dos processos de logística. “É preciso reduzir o desperdício de tempo com papelada, burocracia e falta de sintonia entre o processo logístico e o processo produtivo. Isso precisa ser feito antes.” Para ele, a redução de custos pode chegar a 30%. “Além de financeiro, há a questão de segurança. Como muitos rodam à noite, em estradas não tão boas, é possível evitar acidentes com motoristas, além de conseguir a melhor extração de consumo.” O caminho ainda é longo e cheio de curvas para os veículos autônomos no Brasil. Mas a Scania sabe onde quer chegar. E sem tripulante.

GM APOSTA EM VELHO CONHECIDO PARA RENASCER

A cadeira de Carlos Zarlenga mal esfriou e a General Motors anunciou na terça-feira (31) o retorno do executivo Santiago Chamorro à presidência das operações sul-americanas. O colombiano, que ocupou o cargo até 2016, sendo substituído justamente pelo argentino, reassume o posto após período na vice-presidência da área de conectividade da companhia, a GM Global Connected, em Detroit, sede da montadora. O executivo terá como principal desafio no mercado brasileiro recolocar o modelo Onix no posto de mais vendido do País e, no âmbito regional, inserir a América do Sul no processo de transformação dos veículos com a eletrificação. A decisão da marca ocorreu seis dias após a saída repentina de Zarlenga, que nem sequer se despediu da rede e dos fornecedores, o que é tradicional no setor. A GM informou que o argentino deixou a companhia para buscar novas oportunidades.

O conhecimento da região foi determinante para a decisão de optar por Santiago Chamorro. “Ele tem profundo conhecimento de nossos mercados sul-americanos, bem como forte relacionamento com nossa organização global”, afirmou, por meio de comunicado, Steve Kiefer, presidente da GM Internacional e vice-presidente sênior. “Essas características o posicionam muito bem para continuar a conectar os negócios na América do Sul.”

Chamorro tem vasta experiência no mercado nacional. Além de presidente, ocupou as diretorias de marketing e de vendas no Brasil. Com a paralisação por cinco meses da linha de produção de Gravataí (RS), por causa da escassez de semicondutores, o veículo acabou superado no ranking – ocupa a quinta posição nas vendas acumuladas até julho, com 42,8 mil unidades, quase 11 mil a menos que o líder Hyundai HB20. A fabricação do modelo e do sedã Onix Plus foi retomada apenas na segunda quinzena de agosto na planta no Rio Grande do Sul.

Enquanto isso, a GM segue firme na estratégia mundial de eletrificação. A aposta no Brasil é o Chevrolet Bolt. No entanto, ele teve as 235 unidades comercializadas em 2020 convocadas para um recall. A justificativa da bandeira é uma possível falha nos módulos de bateria de alta voltagem. Em casos de carregamento total da bateria, ou algo próximo, há risco de incêndio. Apesar disso, a GM prepara para este mês o lançamento do novo Bolt EV, com promessa de renovação em tecnologia, assim como em design. A nova aposta da marca sob o comando de um velho conhecido. Angelo Verotti