Com graves dificuldades financeiras, a concessionária Santo Antônio Energia apresentou à Justiça um pedido para se livrar de pagamentos devidos ao sistema de transmissão de energia, uma solicitação inédita dentro do setor elétrico, acostumado há anos a uma guerra de liminares. A empresa justifica que está à beira da falência.

A ação foi negada pela Justiça Federal do Distrito Federal, mas a empresa recorreu ao Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1) para se livrar dos pagamentos neste mês, que somavam R$ 169 milhões. Se a decisão for acatada, a concessionária, dona da usina, não será penalizada por ficar inadimplente.

A taxa de uso do sistema de transmissão se assemelha a um pedágio: o gerador paga mensalmente para ter acesso às redes de transmissão e, assim, pode entregar energia em qualquer ponto do sistema. Ao não pagar as taxas, os geradores recebem penalidades, como multas e até o desligamento do mercado.

No limite, a usina pode ser punida com a rescisão dos contratos de compra e venda de energia. Essa é a consequência mais grave, pois esses contratos são usados como garantia e isso pode levar ao vencimento antecipado de financiamentos.

Na terça-feira, 25, à noite, a concessionária informou, em fato relevante, ter obtido decisão favorável no TRF-1 para se livrar de pagamentos devidos no mercado de curto prazo, mas não mencionou se isso incluía também a isenção das taxas de transmissão. A reportagem não teve acesso à decisão.

A ação levantou temor no setor, diante da possibilidade de abertura de um precedente perigoso que pode aumentar ainda mais a judicialização no setor. Isso porque o sistema de transmissão de energia funciona como uma espécie de condomínio, em que todos os agentes rateiam as despesas. Se um deixa de pagar, os demais têm de pagar mais para cobrir os gastos do sistema. Num movimento cascata, outros agentes podem adotar a mesma estratégia, reduzindo cada vez mais a parcela de agentes pagantes.

Defesa

Na ação, a Santo Antônio Energia alega dificuldades financeiras para continuar a pagar suas contas e afirma ter negociado pagamentos parcelados de outras dívidas “para evitar sua quebra”, mas a situação de inadimplência dificulta a renegociação. A empresa diz ainda não ter “disponibilidade financeira” para fazer o pagamento do aporte de garantias financeiras exigido no mercado. O prejuízo acumulado, desde o início da operação em 2007 até dezembro de 2017, segundo a empresa, é de R$ 3,7 bilhões, e os acionistas já aportaram R$ 9,3 bilhões, mais que o dobro dos R$ 4,2 bilhões inicialmente previstos.

“Os principais acionistas encontram dificuldades decorrentes da crise fiscal do Estado Brasileiro (39% pertencem a Furnas, estatal federal; 10% à Cemig, estatal estadual; e 20% à FIP Amazônia, dos quais 49,9% pertencem ao FI-FGTS). Os acionistas minoritários (Andrade Gutierrez 12,4% e Odebrecht 18,6%) também se encontram em dificuldade financeira notoriamente conhecida e noticiada pela mídia nacional”, diz a ação.

O presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica, Mário Miranda, disse que a falta de pagamentos da Santo Antônio Energia vai onerar outros agentes e até mesmo os consumidores finais. “Imagina se começam a tolerar ou consentem a inadimplência de um determinado agente? Isso sobrecarrega outras empresas.”

O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica, André Pepitone, reconheceu que a usina passa por dificuldades e que o projeto está estruturalmente desequilibrado, mas disse que qualquer discussão deve necessariamente passar pelo órgão regulador, e não pela Justiça.

A Santo Antônio Energia não se pronunciou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.