Aproveitar uma oportunidade de negócios na qual a maioria das pessoas enxergaria problema é o principal mandamento de um empreendedor. O bilionário Jorge Paulo Lemann, 71 anos, é o exemplo mais notório dessa espécie. Ele se especializou em comprar empresas endividadas para reestruturá-las e, dessa forma, ganhar muito dinheiro. São negócios que geralmente envolvem bilhões de reais e exigem muito sanguefrio. Lemann, porém, não é o único que se aventura em empresas problemáticas. Guardadas as devidas proporções, o Brasil está repleto de empreendedores de pequeno e médio portes que encaram o desafio de transformar um negócio quase perdido em lucro. 

 

Essas oportunidades surgem porque, diferentemente das grandes corporações cujas operações são bem estruturadas, as pequenas e médias empresas não têm uma estratégia de mercado para crescer. Resultado: muitas entram em dificuldade e aí é preciso um empreendedor de visão que possa mudar o cenário. 

 

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Gissi, da Kimberlit: quando ele assumiu a empresa de fertilizantes, a companhia faturava R$ 200 mil
e estava endividada. Hoje, suas receitas são de R$ 20 milhões

 

Como? Para Ronaldo Fragoso, sócio-líder em soluções para empresas emergentes da consultoria Deloitte, um empreendedor precisa gostar e confiar naquilo que está fazendo e saber administrar riscos. Existem empreendedores que crescem porque conhecem bem o mercado em que atuam. Outros não conhecem necessariamente, mas têm bons planos de negócios, que permitem eliminar obstáculos existentes. 

 

O que aconteceu com a Indústria Química Kimberlit, localizada na cidade de Olímpia, no interior de São Paulo, é um bom exemplo de negócio que deu certo em razão do bom conhecimento de mercado de seus novos proprietários. O diretor comercial Antonio Carlos de Gissi Júnior, explica que a empresa surgiu em 1989, em Batatais, outra cidade do interior paulista. 

 

Era uma microempresa do ramo de fertilizantes comandada por três pessoas, o pai e dois filhos. Gissi, por sua vez, tinha um empresa chamada Gicitrus, que comprava defensivos agrícolas, fertilizantes e sementes para revender. Embora tivesse multinacionais entre seus fornecedores, a Gicitrus também comprava e revendia os produtos da pequena Kimberlit, que tinha quatro funcionários e faturava cerca de R$ 200 mil por ano. 

 

“A oportunidade para comprar a Kimberlit surgiu em 1994. O faturamento dela mal dava para cobrir os custos de produção. Os proprietários resolveram vender e, como eu era cliente, a ofereceram para mim. Como revenda, minha empresa estava obrigada a atuar numa área delimitada pelos fornecedores e a margem de lucro era pequena. Enxerguei na indústria a possibilidade de uma margem maior, além da liberdade de poder explorar outras áreas do Brasil e, por que não, do mundo”, comenta Gissi. 

 

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R$ 300 mil é quanto a Maqsherutti, empresa de Tiago Henrique de Souza, deve faturar até o fim de 2010. 
No ano passado, ela não tinha clientes, apenas dívidas

 

Ele topou o negócio e profissionalizou a empresa. A Kimberlit tinha uma produção quase artesanal e bem simples. Contava na época da compra com um misturador com capacidade para 300 quilos, uma balança para pesar até dez quilos, semelhante àquelas existentes em padarias, e uma seladora para encher saquinhos de dois quilos e empacotar. 

 

A produção era de 20 toneladas/mês e hoje é de mil toneladas/mês. O faturamento, em 2009, foi de R$ 20 milhões e a expectativa é de que a empresa feche 2010 com faturamento de R$ 30 milhões. Ou seja, de 1994 para cá, passou de microempresa para empresa de médio porte. “Vou aumentar meu faturamento para R$ 100 milhões em cinco anos”, afirma. Tiago Henrique de Souza, ex-vendedor de uma multinacional do setor de bebidas, é outro exemplo de empreendedor que obteve sucesso comprando uma empresa em situação difícil. 

 

A diferença é que ele não entendia nada de máquinas quando adquiriu parte da Maqsherutti, fabricante de rotogravuras, laminadoras, rebobinadeiras e equipamentos para impressão. Fundada em 2005, em São Paulo, a fábrica pertencia a seu tio, José Marques de Souza. No auge, chegou a produzir dez máquinas por ano. Parece pouco, mas cada uma custava a partir de R$ 50 mil. 

 

Tudo estava indo bem até que, em 2008, estourou a crise financeira nos EUA. A partir daí o negócio começou a degringolar. Em 2009 já não havia mais clientes, a empresa estava parada e com dívidas. Souza comprou 50% da empresa, manteve o tio como sócio e fez um curso no Sebrae. Com os conhecimentos adquiridos, montou um plano de negócios que tirou a empresa do sufoco. “Meu tio se concentrou na produção e eu fiquei na administração”, diz Souza.

 

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A PPardal Plasbor, fabricante de peças para motos, possui 40 funcionários e vende 240 itens

 

Para sanar as dívidas, Souza fez um empréstimo bancário de R$ 10 mil e juntou com economias próprias. Observou que, até conseguir novos compradores de máquinas, a empresa poderia ganhar dinheiro prestando serviços. “Construímos uma máquina para nosso uso e passamos a oferecer serviços de impressão para terceiros. Temos três clientes hoje.” Seu objetivo é ousado para quem saiu do zero: fechar 2010 com faturamento em torno de R$ 300 mil.

 

Essa mesma visão empreendedora foi o que moveu Valdir Tibúrcio Mariano, dono de uma pequena empresa de vedação, a se aventurar no setor de peças para motocicletas. Curiosamente, ele entrou no ramo a partir de uma empresa de brindes. Isso mesmo. Em 1992, ele comprou a  Professor Pardal, localizada na zona oeste de São Paulo.

 

Ele gastou o equivalente a R$ 50 mil (teve de vender dois veículos para juntar a quantia), mudou a razão social para PPardal Plasbor, para evitar problemas com a marca (Professor Pardal é um personagem de Walt Disney), e deu uma guinada em sua vida empresarial. Mas o que uma empresa de brindes tem a ver com o mercado de peças para motocicletas? Simples: as máquinas injetoras usadas pela microempresa eram as mesmas utilizadas na fabricação de peças plásticas para motos. Era nisso que Mariano estava de olho. Começou as operações produzindo manopla para um único modelo de motocicleta. 

 

“Naquela época o mercado era mal abastecido. Faltavam fornecedores. Eu não conhecia ninguém, mas comecei a oferecer meus produtos em lojas da rua General Osório, no centro de São Paulo. O local é o maior centro comercial de motopeças do País. Gente de todo o Brasil faz compras ali. Os comerciantes expunham meu produto e conforme percebiam que a aceitação era boa, faziam mais pedidos”, lembra. Hoje, sua marca é um sucesso, possui 40 funcionários e vende 240 itens.