Uma comparação entre dois números mostra o tamanho da encrenca em potencial envolvendo Rússia e Ucrânia. Há cerca de um mês, os governos da Rússia e da Bielorrússia vêm acumulando tropas nas fronteiras da ex-república soviética. Segundo estimativas ocidentais, há 130 mil soldados de prontidão. Para comparar, todo o Exército brasileiro tem 218 mil pessoas. Você leu certo: tropas equivalentes a 60% do efetivo militar brasileiro estão posicionadas para ocupar um país que tem fronteiras com Hungria, Polônia, Eslováquia e Romênia.

Isso explica a tensão que tomou conta dos mercados nos últimos dias. O barril de petróleo do tipo Brent, referência internacional para a Petrobras, chegou a US$ 95. Na quarta-feira (16), com a notícia de que o líder russo, Vladimir Putin, estava retirando parte das tropas, os preços arrefeceram para US$ 92,3 e as ações subiram no Brasil e nos Estados Unidos. Mesmo assim, após o fechamento dos mercados em Nova York na quarta-feira (16), começaram a circular notícias que as tropas russas estavam apenas mudando de lugar, e não se afastando da Ucrânia. Ou seja, esperam-se mais solavancos nos preços.

PUTIN, O IMPREVISÍVEL Líder russo quer evitar o alinhamento ucraniano com o Ocidente, o que pode elevar os preços dos grãos e fazer o barril de petróleo disparar (Crédito:Mikhail Klimentyev)

Os dois países têm uma relação conflituosa há décadas, desde o fim da União Soviética, em 1991. O entrevero mais recente ocorreu em 2014, quando a Rússia reocupou a Crimeia, que havia sido “presenteada” à Ucrânia em 1954. Beneficiada por sua proximidade geográfica com a Europa, a ex-república soviética vem se aproximando do Ocidente também em termos políticos. Isso incomoda muito Moscou. A convicção de quem conhece o assunto é que os esforços diplomáticos de alemães e franceses, ao lado das ameaças americanas, poderão adiar o conflito, mas não o impedirão. “Não há nenhuma indicação de que Putin desistiu de anexar a Ucrânia”, disse o ex-embaixador americano em Moscou Michael McFaul.

O que pode ocorrer a seguir? “O cenário é muito imprevisível, pois Putin está isolado em suas decisões”, disse McFaul. Com a desvantagem de, como todo governante autocrático, ele não precisar justificar seus atos. Ou seja, Putin tanto pode ordenar um recuo tático das tropas quanto forjar um pretexto para precipitar os acontecimentos. “Os russos poderão até criar um falso ataque ucraniano para justificar uma invasão”, afirmou McFaul.

MERCADOS As consequências para os mercados serão severas. Segundo o diretor de investimentos do Global Wealth Management do banco suíço UBS, Mark Haefele, as notícias de escalada ou distensão militar vão provocar altos e baixos nos preços das ações. “Nesse cenário, acreditamos que petróleo e commodities serão uma boa maneira de os investidores protegerem seu portfólio”, afirmou, em um relatório publicado na quarta-feira (16). A Ucrânia é um grande exportador de grãos. Ameaças a esse fornecimento vão pressionar os preços para cima.

 

O mesmo raciocínio vale para o petróleo e para o gás. A Rússia fornece cerca de 50% do gás usado na Alemanha para gerar energia. Boa parte dele passa por gasodutos que atravessam o território ucraniano. Putin nunca hesitou em cortar o fornecimento quando queria demonstrar seu desagrado. Agora, não está descartada a hipótese de uma redução da oferta russa para forçar o governo de Berlim a aceitar a ocupação da Ucrânia. Por isso o barril de petróleo, cujos preços oscilam em sintonia com os do gás, pode superar US$ 100, algo inédito desde 2014.

Como o investidor brasileiro pode lucrar com isso? Ações de petrolíferas como a Petrobras devem se valorizar com a alta dos preços do óleo. Já os resultados de empresas de proteína animal podem ser afetados pela alta dos custos decorrente do aumento dos preços dos grãos. Porém, como o cenário seguirá volátil por muito tempo, a recomendação é evitar tentar especular com os jogos de guerra de Moscou.