Independentemente dos tumultos e dos protestos em países da América Latina – Bolívia, Chile, Colômbia e Equador – nas últimas semanas, e dos receios exagerados de algum contágio dessas revoltas sociais chegar ao País, o cenário que se desenha para o próximo ano ainda é considerado positivo. “O Brasil vai voltar a ser investment grade em 2020. O crescimento do PIB entre 2% e 2,5% deve ajudar muito o fiscal, ou seja, o governo terá mais receitas para pagar seus compromissos”, diz Rafael Bevilacqua, estrategista-chefe da Levante. Uma eventual melhora na nota soberana para o chamado “grau de investimento” pode atrair investimento para o Brasil, por exemplo, de fundos que só aplicam recursos em países considerados bons pagadores.

PIB EM ELEVAÇÂO Rafael Bevilacqua aponta que crescimento da economia ajudará questão fiscal pelo lado das receitas (Crédito:Divulgação)

Para Daniel Jannuzzi, economista, planejador financeiro CFP e consultor da Magnetis Investimentos, o seguro de crédito de cinco anos (CDS) do Brasil está em linha com países que possuem grau de investimento. “Mas ainda não se consegue prever quando a nota vai melhorar”, afirma. Jannuzzi lembra que estamos com inflação controlada e taxa básica de juros (Selic) na mínima histórica. “O dólar voltou a subir, mas, por enquanto, sem causar pressão inflacionária. Se continuar subindo talvez tenha alguma elevação dos juros no final de 2020 ou 2021”, diz. Na opinião dele, esse ambiente favorece o investimento em bolsa de valores (ações). “Mas precisamos de notícias boas, como o crescimento do PIB”, afirma.

Alexandre Espírito Santo, economista-chefe da Órama Investimentos, aponta que as agências internacionais vão ajustar nossa nota de crédito. “O risco País está no nível do grau de investimento. Há um sentimento melhor, de aumento do PIB. Se crescer vai dar uma melhorada significativa”, diz. Segundo ele, o cenário é de positivo para bom. “Juro baixo a 4,5%, eventualmente para 4,25%, mas ainda não tenho convicção disso. Mesmo assim é um juro que nunca experimentamos antes, com ancoragem da inflação e desemprego ainda muito elevado”, afirma.

ANCORAGEM DA INFLAÇÃO Alexandre Espírito Santo, economista-chefe da Órama, diz que inflação controlada permite taxa básica de juros menor, Selic ao redor de 4,5% (Crédito:Divulgação)

Para João Mauricio Rosal, economista-chefe da Guide Investimentos, a redução drástica da taxa de juros no Brasil vai provocar um impacto fiscal positivo em 2020. “O custo do serviço da dívida vai cair de forma significativa, e deve se refletir na nota de crédito do País. O grau de investimento pode até vir no próximo ano”, diz. Por outro lado, Rosal observa que as manifestações políticas ocorridas em Bolívia, Chile, Colômbia e Equador afetam o fluxo financeiro da bolsa brasileira. “Quando surge uma ordem de venda para emergentes da América do Sul, os fundos se desfazem dos ativos mais líquidos primeiro, e por isso, vendem ações no Brasil”, diz. Mas graças ao momento de migração das aplicações domésticas do varejo alta renda que gradualmente está deixando a renda fixa por causa dos juros baixos, o investidor local tem sustentado a saída dos estrangeiros do Ibovespa. “O retorno baixo na renda fixa leva a migração de carteiras para a bolsa”, afirma Rosal.

RISCOS EXTERNOS Por outro lado, Bevilacqua identifica que uma intensificação da guerra comercial entre Estados Unidos e China atrapalha o fluxo de investimentos pelo mundo. “A guerra comercial trava a roda de investimentos para os emergentes. Mas teremos a eleição americana, e o presidente dos EUA, Donald Trump, vai acelerar a economia para se reeleger, ao passo que uma elevação maior de tarifas sobre produtos chineses poderia sinalizar recessão. Dá para contornar”, afirma. Em visão semelhante, Jannuzzi diz que uma guerra comercial aberta entre EUA e China não é de interesse de nenhuma das duas potências globais. “Trump está indo para eleições presidenciais, essa questão vai ficar num vai e vem. Mas qualquer sinal ruim do consumo nos EUA pode trazer preocupações”, diz.

João Mauricio Rosal, economista-chefe da Guide Investimentos: “O custo de serviço da dívida brasileira vai cair de forma significativa no próximo ano por causa da redução dos juros nos títulos públicos federais” (Crédito:Divulgação)

Em outra opinião, Rosal ressalta que a grande variável é a guerra de tarifas. “Todo mês se espera algum tipo de acordo comercial entre as potências, mas não se conclui”, diz. Para Emy Shayo Cherman, estrategista de renda variável para Brasil e América Latina do J.P Morgan, a tendência é que a desglobalização veio para ficar. “O dólar segue forte em relação aos seus parceiros comerciais. Não temos a perspectiva de um dólar desvalorizando”, disse Cherman, ao participar do 14° Siac, realizado em São Paulo. Ela afirmou que o Brasil é “muito único” na América Latina com uma história boa para contar, de andamento das reformas, e de taxas de juros baixas que vão continuar por alguns anos. “Estamos comprados em Brasil”, diz.