O poderoso Rubens Ometto, 60 anos, presidente do conselho da Cosan, uma das maiores empresas de energia do Brasil, marca todos os dias em sua agenda: cobrar Sandra. Ela não é sua secretária e muito menos uma executiva do grupo, mas sua missão é fundamental no dia a dia do empresário. Sandra é uma das empregadas domésticas da família e a responsável por gravar os capítulos das novelas Ti-ti-ti e Passione, ambas da Rede Globo. “Adoro novelas. Quando é gravado, posso editar e ver só os núcleos que me interessam”, diz Ometto à DINHEIRO. 

 

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E palpita sobre a trama das oito, escrita por Silvio de Abreu. “A razão me diz que o assassino do Saulo (personagem de Werner Schünemann) é o Fred (Reynaldo Gianecchini), mas, como autor de novela gosta de inventar, pode ter sido o mordomo (Julio Andrade) da Stella (Maitê Proença)”, diz Ometto, referindo-se ao enigma de Passione sobre o assassino do empresário Saulo Gouveia. 

 

Quem observa essa faceta pacata de Ometto não consegue imaginar que ele é um dos homens de negócio mais ousados do País e forjou seu grupo com altas doses de risco, se endividando para comprar uma empresa atrás da outra. 

 

“Sempre disseram que eu estava endividado. A verdade é que eu sempre soube fazer minhas contas.” E, em fevereiro deste ano, ele mostrou que suas contas vão “muito bem, obrigado”. 

 

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Ao unir as redes de postos Esso e Shell, a Cosan se tornou a segunda

maior distribuidora do País com 4,5 mil unidades

 

Foi quando associou-se com a anglo-holandesa Shell, um colosso do setor de energia com faturamento mundial de US$ 285 bilhões. A companhia assumiu as dívidas da Cosan e uma nova empresa foi criada com 50% de participação para cada lado. 

 

Com isso, Ometto tornou-se o segundo maior distribuidor de combustível do Brasil, com uma rede superior a 4,5 mil postos, dono de uma empresa com 23 usinas, capacidade de moagem de 60 milhões de toneladas de cana, produção de 1 milhão de toneladas de açúcar e uma das maiores companhias de energia do mundo. 

 

Por essa e outras tacadas, Ometto foi eleito o Empreendedor do Ano pela revista DINHEIRO. “O nosso conglomerado será um dos seis maiores do Brasil com faturamento anual de R$ 50 bilhões”, diz. 

 

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A capacidade de moagem da Cosan é de 65 milhões de toneladas de cana-de-açúcar. Neste ano, deverá produzir 1,8 bilhão de litros de etanol

 

A história de Rubens Ometto, carinhosamente chamado pelos amigos pelo apelido Binho, poderia servir de pano de fundo para uma novela. De empresário quebrado, como diziam as más línguas no setor sucroalcooleiro, ele ergueu o único grupo do segmento que é verticalizado: atua desde a produção de açúcar, a fabricação de etanol até a venda de combustíveis para o cliente final. 

 

E a parceria com a Shell potencializa seu status. Afinal, abre as portas do mercado internacional para a Cosan. “Em meados do ano que vem começaremos a entrar no exterior com mais força”, diz Ometto, sem dar mais detalhes. 

 

É prudente não duvidar dos planos do empresário. “Tudo o que prometíamos nos road shows que fizemos em busca de investimentos nós sempre cumprimos”, afirma. Promessas, aliás, é o que não faltam na manga de Ometto. 

 

Nos últimos anos, a Cosan se tornou uma máquina de aquisições e de novos negócios. Em 2008, no auge da crise econômica mundial, a companhia comprou usinas no interior de São Paulo e criou a Rumo Logística, a maior exportadora mundial de açúcar. Depois, fundou a Radar, empresa voltada para a aquisição de terras com ativos de R$ 1,3 bilhão. 

 

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A nova fronteira: A Cosan pretende transformar a União em uma marca de alimentação com produtos que vão de chocolate a café 

 

Não o bastante, entrou no ramo de distribuição de combustíveis comprando as operações da Esso por US$ 826 milhões. No ano passado, adquiriu a NovAmérica Agroenergia, dona do famoso Açúcar União, e criou a Cosan Alimentos. Quando o mercado apostava no alto endividamento, veio o negócio com a Shell com uma injeção de capital de US$ 1,6 bilhão. 

 

“Mesmo em tempos de crise, ele não tira o pé do acelerador”, diz Marcos Lutz, CEO da Cosan, referindo-se a Ometto. Basta ver que nos últimos três anos o grupo investiu R$ 6 bilhões em novos negócios. “Temos condições de fazer muito mais agora porque temos mais dinheiro em caixa”, diz Lutz. Em que áreas pretende investir? 

 

Ometto responde a questão de uma forma peculiar. “Em energia”, diz. “A Cosan é uma empresa de energia limpa e renovável. Açúcar é energia humana, bagaço de cana vira energia elétrica e etanol é combustível”, conta. Mas a grande aposta do grupo será na Cosan Alimentação. “Essa divisão vai longe”, diz Ometto. 

 

“Vamos lançar diversos produtos com as marcas Da Barra e União como chocolate, sorvete, café”, afirma o empresário. A julgar pelos planos de Ometto não vai demorar para que a Cosan comece a incomodar gigantes do setor como uma Nestlé. E, quando o empresário põe uma coisa na cabeça, é difícil demovê-lo de seus objetivos. 

 

“Sou persistente. Tem usina que eu demorei dez anos para comprar. Só sosseguei quando comprei.” Essa teimosia muitas vezes é confundida com megalomania. Ometto lembra de quando começou a adquirir uma usina atrás da outra ao redor da sua e os colegas do setor passaram a criticá-lo. 

 

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O grande dia: Ometto (ao microfone) no anúncio da parceria com a Shell de Vasco Dias (ao fundo)

 

“Diziam que eu ia quebrar, que estava endividado, mas eles não calculavam o quanto meus custos caíam.” Essa incompreensão de seus pares se deve, principalmente, ao estilo do empresário. Apesar de ter nascido em Piracicaba (SP), dentro de uma usina, ele se diferencia pela formação. 

 

Em 1968, desembarcou em São Paulo para estudar engenharia na Escola Politécnica da USP. “Ele era brilhante com números. Fazia contas complexas de cabeça”, diz Pedro de Camargo Neto, seu primeiro amigo na capital paulista e atual presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs). 

 

Discreto, Ometto só chamava atenção quando chegava na faculdade a bordo de um reluzente carro da Fiat. “Todos olhavam para o carro dele.” Discreto, não dava muita bola para esse tipo de coisa e nem passava por sua cabeça trabalhar nas empresas da família. “Sempre fui muito independente. Nunca fui de ficar pendurado na barra de ninguém”, diz Ometto. 

 

Ainda jovem, Ometto começou a carreira como estagiário no Unibanco. Logo depois, se deparou com um dilema. Em uma festa de família conheceu José Ermírio de Moraes, do grupo Votorantim, que o convidou para trabalhar ao seu lado. 

 

“Ou eu viajava para o exterior para fazer um MBA ou aceitava o convite dele”, diz Ometto. “Preferi ficar e trabalhar com o José Ermírio.” Aos 24 anos de idade, o jovem prodígio já era diretor financeiro de um dos maiores grupos empresariais do País. Só saiu de lá para ajudar seu tio na companhia aérea da família, a TAM. 

 

Os Ometto tinham 70% da empresa e Rolim Amaro era dono de 30%. Mas seu tio vivia se desentendendo com Rolim e chamou Rubens para dar um jeito nas pendengas. Rubens, então, se tornou o primeiro presidente do conselho da empresa aérea. Logo percebeu que Rolim tinha tino para o negócio e convenceu a família a vender o restante da empresa para o comandante. 

 

“Ele era muito bom, entendia daquele negócio como poucos”, diz Ometto. Essa é a mesma percepção que o mercado sucroalcooleiro tem sobre ele. “O Ometto é diferenciado. Por isso todos acompanham os movimentos da Cosan”, diz Auro Rozenbaum, analista do setor de energia do Bradesco. 

 

Um deles é o de tornar a marca etanol conhecida no Brasil. Por isso, criou a campanha Etanol é Esso para colar a marca do combustível na mente dos consumidores. “Se você parar para pensar, tudo é álcool. Propanol, butanol, entre outros”, diz Ometto.

 

Atualmente, ele é o único empresário do etanol a fazer parte da lista dos homens mais ricos do mundo da revista americana Forbes com uma fortuna de US$ 2,1 bilhões. É praticante de golfe, de tênis e transita na alta roda do poder. 

 

Costuma falar freqüentemente com Roberto Setúbal, presidente do Itaú, com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com o presidente Lula e também com a presidenta eleita Dilma Rousseff, com quem já teve algumas discussões sobre o segmento de energia. 

 

Ometto é ouvido porque suas decisões têm influência no setor. Em 2005, por exemplo, ele foi o primeiro usineiro a abrir o capital de sua empresa na Bovespa. Dois anos depois faria o mesmo na Bolsa de Nova York. “A Cosan é, de longe, a empresa do setor de etanol com maior liquidez na Bolsa”, diz Rozenbaum. 

 

“Em novembro, enquanto a Cosan movimentou R$ 60 milhões por dia, a São Martinho, sua concorrente, movimentou R$ 2,5 milhões.” O negócio com a Shell vai potencializar essa cifra. “Eles terão sinergias de R$ 1 bilhão”, diz Rozembaum. 

 

Para chegar no acordo com a gigante anglo-holandesa, as negociações com Ometto demoraram 1,5 ano. “Ele tinha tudo claro na cabeça. Ele sabe as brigas que tem que comprar e não se atinha a coisas pequenas”, diz Vasco Dias, CEO da nova empresa resultante da união entre Shell e Cosan. 

 

Ometto atualmente ocupa a presidência do conselho do grupo, mas fica de olho em todas as operações. “O acionista tem de estar perto do corpo diretivo da empresa. Tem executivo que começa a se achar mais dono da empresa do que o acionista.” 

 

Ele dá expediente na sede do grupo das 9h da manhã até as 7h da noite e costuma cobrar seus funcionários com rigor. “Questiono tudo. Quanto mais irritados com as minhas perguntas os executivos ficam, é sinal de que estou fazendo o meu trabalho direito”, diz ele.