No início de janeiro, o ano revelava-se tranquilo do ponto de vista geopolítico e extremamente promissor em termos econômicos. Tanto o Fundo Monetário Internacional (FMI) quanto o Banco Mundial projetavam expansão do PIB global superior a 3%, sem sustos no horizonte. As premissas eram de que os juros americanos subiriam gradativamente, o crescimento chinês continuaria próximo de 7% e a Europa manteria um ritmo de expansão em torno de 2%. Passado quase um terço do ano, essas expectativas estão, na prática, se confirmando. Ótimo.

O problema é que dois fatos não previstos apareceram no radar financeiro, tornando o cenário um pouco mais nebuloso. O primeiro foi a disputa comercial entre Estados Unidos e China, desencadeada pela política protecionista do presidente Donald Trump, anunciada em março. O segundo deles é ainda mais recente. Em 14 de abril, tropas americanas, britânicas e francesas atacaram a Síria, cujo comando político goza do apoio da Rússia. “[O ataque] não poderia ter tido um resultado melhor”, escreveu Trump no Twitter, no mesmo dia da operação na Síria. “Missão cumprida!”

General Putin: o presidente russo (de gravata preta) apoia o ditador sírio Assad (de gravata azul). eles negam o uso de armas químicas contra os rebeldes (Crédito:Kremlin Press Office / Handout / Anadolu Agency)

O ataque militar obrigou os analistas a dar um peso maior ao risco bélico em suas planilhas. O indicador Zew de sentimento econômico na Alemanha passou de 5,1 pontos positivos em março para 8,2 pontos negativos em abril. Segundo o instituto responsável pelo índice, a piora nas percepções dos agentes decorre dos conflitos comerciais entre Estados Unidos e China e da situação imprevisível na Síria. Antes dos ataques, as tensões militares se limitavam à troca de bravatas entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte, cujo ditador Kim Jong-um costuma se exibir ao lado de mísseis.

No caso da Síria, no entanto, o temor é de uma possível reação do presidente russo Vladimir Putin, que apoia o regime de Bashar al-Assad. Em sua campanha à reeleição, em março, o líder russo exibiu um vídeo com mísseis que seriam capazes de burlar os escudos antiaéreos no mundo inteiro. Segundo ele, os sistemas de defesa dos Estados Unidos e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) são “inúteis” perante à arma supersônica. “Ninguém no mundo tem algo assim”, disse. “O míssil é invencível.”

Ironicamente, Trump é investigado nos Estados Unidos por ter sido favorecido pela Rússia na sua campanha presidencial, na qual derrotou a candidata democrata, Hillary Clinton, em 2016. Em determinados momentos, o presidente americano parece buscar uma aproximação com a Rússia. Em outros, como na última ação militar, ignora a posição de Putin. “A reação moderada da Rússia mostra que nenhum dos lados quer realmente uma guerra”, afirma Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados. De fato, só houve contragolpe verbal. “As ações dos EUA na Síria pioraram a catástrofe humanitária”, afirmou Putin. A missão militar ocidental foi justificada pelos governos aliados a partir do suposto uso de armas químicas por Assad contra os rebeldes. Ele nega.

Destruição: soldado sírio observa os destroços após o bombardeio em Damasco. Os alvos do ataque foram laboratórios químicos (Crédito:AFP Photo / Louai Beshara)

O impacto imediato ocorreu nas cotações de petróleo, que subiram 10% nos dias seguintes aos ataques, atingindo o maior patamar desde 2014. Apenas nos últimos 12 meses, o óleo tipo WTI negociado em Nova York saltou 30%, passando de US$ 52 para US$ 68 o barril. “O temor é de um conflito mais amplo no Oriente Médio, mas, por enquanto, a ação foi localizada”, diz Roberto Indech, analista-chefe da Rico Investimentos. “O radar dos investidores incorporou essas questões militares.” Além da tensão geopolítica, os analistas explicam que o nível baixo dos estoques de petróleo nos Estados Unidos ajuda a impulsionar a cotação dos barris.

Por ora, a repercussão no Brasil ocorre basicamente através de oscilações na bolsa e no câmbio, além do repasse aos preços dos combustíveis. Desde o ano passado, a Petrobras vem adotando uma política de reajustes frequentes atrelados à variação do dólar e do petróleo no mercado internacional. Com a cotação maior do barril, há um impacto na inflação doméstica, o que pode obrigar o Banco Central a interromper o ciclo de queda dos juros. Em comunicado, a Petrobras informa que não tem o poder de interferir nas cotações de ativos negociados globalmente.

“O que a companhia faz é refletir essa variação de preço do mercado internacional”, diz a empresa. Já o Banco Central reitera em seus relatórios de inflação e nas atas das reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) que está monitorando todos os riscos benignos e malignos à inflação, antes de tomar decisões de política monetária. Diante dos novos riscos bélicos, a melhor forma de o pequeno investidor se proteger é obedecer aquela que virou a regra de bolso número um do mercado financeiro: seguir Donald Trump no Twitter.