O anúncio e posterior desmentido da retirada de tropas americanas do Iraque faz com que a estratégia militar dos Estados Unidos no país pareça indecifrável.

À confusão iniciada na noite de segunda-feira em torno de uma carta enviada aos iraquianos e apresentada como um “rascunho” anunciando a saída do país das tropas americanas, se seguiu a negativa pelo chefe do Pentágono nesta terça-feira de esta retirada vá de fato ocorrer.

Em declarações à imprensa em Washington, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Mark Esper, chegou inclusive a negar a existência de uma carta do lado americano anunciando a saída do Iraque.

Confira a seguir alguns destaques sobre este imbróglio.

– Retirar as tropas, mas como?

Um alto funcionário militar americano explicou à AFP como seria o passo a passo de uma retirada de tropas dos Estados Unidos, que lideram há anos a coalizão antijihadista. Levaria semanas, mas caso o contexto fique crítico, as operações poderão ser feitas em alguns dias. Aviões de carga transportariam os equipamentos pelo ar, enquanto as tropas terrestres seguiriam ao sul e ao Kuwait.

Em segundo lugar, seria preciso “estudar as vias terrestres e os planos de evacuação para os soldados, os civis e os trabalhadores terceirizados” que os acompanham, explicou à AFP Jack Watling, do Royal United Services Institute.

“E decidir quais equipamentos e documentos serão levados, abandonados ou destruídos”, emendou.

– Um impasse?

A carta dirigida aos iraquianos na noite de segunda-feira pelo general William H. Seely, comandante das operações militares americanas no país, dá algumas pistas. Refere-se a um “reposicionamento das forças para garantir que a retirada do Iraque se realize de forma segura e eficaz”, afirmando que os deslocamentos noturnos de helicóptero seriam intensificados em Bagdá, o que de fato ocorreu nos últimos três dias.

Por sua vez, o Exército alemão – membro da coalizão anti-Estado Islâmico – anunciou nesta terça-feira que à noite havia transladado 35 de seus soldados a Jordânia e Kuwait, “junto com soldados de outros três países-membros da coalizão”.

A razão, segundo um diplomata europeu informou à AFP, é que “se os americanos forem embora, nossas tropas não poderão ficar”, já que este contingente é vital para assegurar o conjunto das tropas da coalizão.

O primeiro-ministro iraquiano em fim de mandato, Adel Abdel Mahdi, por sua vez, reiterou ao embaixador americano Matthew Tueller e ao chefe da Otan, Jens Stoltenberg, que queria a retirada das tropas estrangeiras, como o Parlamento votou no domingo.

Embora Mahdi tenha confirmado a recepção de cópias assinadas de uma carta dos Estados Unidos descrevendo os passos para deixar o Iraque, em uma nova reviravolta do caso, o secretário de Defesa americano, Mark Esper, disse nesta terça-feira que os Estados Unidos não vão retirar suas tropas do Iraque, negando a existência da carta.

“Nossa política não mudou. Nós não estamos saindo do Iraque”, disse Esper a jornalistas.

“Não há carta assinada que eu saiba”, acrescentou.

– Por que soldados estrangeiros no Iraque?

Milhares de soldados estrangeiros estão posicionados em bases iraquianas em todo o país no âmbito da luta comum contra o grupo Estado Islâmico (EI).

Em 2014, quando os extremistas ocuparam um terço do Iraque e grandes setores da Síria, o ministério iraquiano de Assuntos Exteriores pediu ajuda ao Conselho de Segurança da ONU.

A coalizão internacional enviou soldados e instrutores para apoiar e treinar as forças iraquianas. Este deslocamento foi feito a pedido do governo e nunca foi objeto de um texto ratificado pelo Parlamento.

Não há um acordo detalhado, como o “Estatuto das Forças” de 2008, que permitia a presença de tropas americanas até a retirada em 2011.

Outras forças estrangeiras participaram da missão de formação da Otan, lançada no fim de 2018.

– Quem está destacado onde? –

O maior contingente da coalizão é americano (5.200 soldados). Está destacado em várias bases, sendo a maior delas a de Ain al Asad (oeste), assim como na capital do Curdistão iraquiano, Erbil, e em Bagdá, perto da embaixada americana.

A coalizão conta com 400 soldados britânicos, 200 franceses e 120 alemães, além de milhares de trabalhadores terceirizados civis.

No entanto, o número de soldados americanos variou nos últimos dias, enquanto Washington anunciava até 4.000 soldados extra no Iraque e arredores, em meio à tensão com o Irã.

Na semana passada chegaram a Bagdá pelo menos outros 150 soldados americanos para proteger a embaixada americana após um ataque sem precedentes de partidários do Irã. Outras centenas foram enviados a Taji, ao norte de Bagdá.