O projeto de lei apresentado pelo Ministro da Economia ao Congresso Nacional no âmbito da segunda fase da reforma tributária tem vários pontos questionáveis. Mas um deles pode ser particularmente desastroso no curto prazo. É a taxação de 20% sobre os dividendos (a parcela destinada aos acionistas de uma empresa como remuneração pelo lucro obtido). Pela proposta de Paulo Guedes, o teto de isenção para a incidência de impostos é de R$ 20 mil e a cobrança de 20% valeria já em 2022. Com isso, muitas empresas já pensam em antecipar para este ano o pagamento de dividendos que o ocorreria no próximo. O resultado dessa antecipação seria esvaziar o caixa das empresas, o que traz dois riscos imediatos para a economia.

Guedes: Foi interditado o debate da reforma tributária ampla, mas será retomado

O primeiro é a disparada do dólar. A razão para isso é a remessa para o exterior dos lucros das multinacionais que atuam no Brasil. Com a fuga de capitais ocorrendo simultaneamente, além do impacto direto no câmbio, haveria outra consequência nociva par ao ambiente de negócios: falta de recursos para reinvestir no crescimento das empresas. Isso pode inibir aportes em fusões e aquisições e até travar expansões orgânicas, o que impacta na geração de empregos.

Mas Guedes não está preocupado com da disso. Na quinta-feira (22), em um encontro com empresários realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), ele admitiu a possibilidade de elevar o teto de isenção para além dos R$ 20 mil previstos no projeto de lei. “Se precisar subir mais um pouquinho, sobe mais um pouco. Não quero mexer com dentista, médico, profissional liberal, não queremos atingir a classe média, nada disso. Queremos tributar os mais afluentes e desonerar as empresas e assalariados”, afirmou.

Por esse argumento, parece que Guedes está em busca de uma reforma tributária que promova “justiça fiscal”. Mas a verdade é que sua fala se deu para aliviar a uma eventual oposição de profissionais liberais. Na semana passada, a OAB manifestou descontentamento com a proposta. Segundo a entidade, ela resultaria em dupla tributação sobre os rendimentos das sociedades de advogados. Médicos também entendem que deveriam ficar de fora da taxação. Se elevar o teto, Guedes pode ganhar o apoio de parte da classe média, o que atende ao plano de reeleger Bolsonaro.

Segundo o ministro, “os vetores da reforma são claros: vamos tributar lucros e dividendos que nçao pagam impostos há mais de 25 anos”. Pelos cálculos do ministério, só no ano passado 20 mil pessoas receberam rendimentos não tributáveis que somam quase R$ 400 bilhões. É nessa cifra que Guedes está de olho. Se o leão não começar a morder aí, não haverá mais de onde tirar dinheiro para bancar as despesas correntes da administração federal. Mesmo que o efeito colateral dessa cobrança seja a fuga de capitais e o esvaziamento do caixa das empresas.