A provada em 2005, a Lei de Falências modernizou a salvação das empresas em dificuldade, ao transformar a antiga concordata em recuperação judicial. Mais rápida e menos burocrática, a recuperação prometia elevar a taxa de sobrevivência das empresas que a ela recorressem. O número de empresas que pedem recuperação vem crescendo, especialmente após a crise dos últimos anos, e Judiciário defere quase todos os pedidos (observe o gráfico abaixo). Porém, 12 anos depois, a taxa de sucesso das recuperações ainda é baixa, pois os processos são demorados. Para mudar isso, o governo quer reformar a lei.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou, na terça-feira 7, que um projeto para atualizar a lei será enviado ao Congresso neste mês. A proposta vem sendo discutida por técnicos do governo. “O projeto trará medidas que vão facilitar a recuperação das micro e pequenas empresas, que representam mais da metade das companhias no País”, disse Meirelles em um evento em São Paulo. Ele afirmou que as mudanças vão tornar o processo mais eficiente. “Hoje, temos dois problemas: a não recuperação rápida de empresas viáveis e a não liquidação rápida de empresas inviáveis”, disse o ministro. “É importante que as empresas viáveis voltem a produzir logo, e consolidem o processo de recuperação econômica do País.”

Telmo Schoeler, da Orchestra: “Crédito novo é fundamental para a recuperação e quem o concede deve ser privilegiado” (Crédito:Flavio R. Guarnieri)

Algumas das mudanças já são conhecidas. Muitas delas são ajustes nos trâmites, para tornar o processo mais simples. Por exemplo, dispensar a empresa em recuperação de publicar um edital detalhado, e permitir que os credores e demais partes interessadas realizem votações eletrônicas. A proposta também prevê o encerramento da recuperação judicial assim que o juiz confirmar a aceitação do plano pelos credores. Hoje, a empresa permanece em recuperação por até dois anos após a confirmação judicial, o que dificulta a volta dos negócios à normalidade. “É como realizar uma cirurgia bem-sucedida em um paciente e depois deixá-lo internado no hospital por mais dois anos”, diz o advogado Cássio Cavalli. “Isso aumenta o risco de ele contrair uma infecção e morrer.”

As alterações mais importantes, porém, referem-se ao calcanhar de Aquiles das empresas em recuperação: o acesso a capital para manter o negócio funcionando. “Sem dinheiro novo, a empresa não se recupera”, diz o advogado Jairo Saddi, especializado em falências. “Quando chega ao ponto de pedir recuperação judicial, ela já consumiu todos os seus recursos, todas as linhas de crédito e tudo o que pode ser dado em garantia.” Uma das soluções é aumentar o interesse por ativos da empresa em recuperação que podem ser vendidos, blindando esses bens dos riscos de sucessão em processos trabalhistas e fiscais.

O espírito da lei aprovada em 2005 visava alinhar os interesses dos credores com os dos controladores da empresa, mas a ordem de pagamento das dívidas acabou tornando essa mudança inócua. “Quem concede empréstimos a companhias nessa situação vai para o fim da fila dos credores e, assim, corre um sério risco de não receber”, diz o consultor Telmo Schoeler, presidente da Orchestra Soluções Empresariais. “Crédito novo é fundamental para a recuperação, e quem o concede deve ser privilegiado.” Não por acaso, uma das principais mudanças é a criação de uma categoria especial de credores, que receberiam o nome técnico de extra-concursais. A denominação assustadora é simples de explicar. “Ao emprestar dinheiro novo para a empresa, os credores extra-concursais vão para o início da fila na hora de receber”, diz Saddi.

Os advogados avaliam que essa deverá ser uma das alterações mais difíceis de ser aprovada no Congresso, com o argumento que ela pode prejudicar os trabalhadores. Parte mais frágil do processo, eles são protegidos pela lei atual e recebem em primeiro lugar no caso de a empresa em recuperação não sobreviver. Mudar isso será difícil, mas essencial, diz Saddi. “Fisco e trabalhadores não vão gostar de ver alguém passar à frente na fila dos pagamentos, mas a verdade é que, sem dinheiro novo, a empresa não sobrevive.”