SÃO PAULO (Reuters) -O dólar fechou em queda nesta sexta-feira, mas terminou o dia acima de 5,40 reais, com investidores repercutindo o alívio global no rali da divisa norte-americana, mas ainda cautelosos sobre as perspectivas para a economia mundial e temas fiscais no Brasil. Na semana, o dólar subiu, deixando a divisa brasileira na lanterna entre pares emergentes mais correlatos.

O dólar à vista caiu 0,49%, a 5,4059 reais. A cotação não sustentou a baixa de 1,06%, a 5,375 reais, da mínima do dia, mas também se afastou da máxima de 5,45 reais, quando marcou alta de 0,32%.

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O dia foi de forte recuperação em divisas e ativos de risco de forma geral, permitida pelo alívio em apostas numa alta ainda mais expressiva de juros nos Estados Unidos após falas de autoridades de política monetária do Fed –entre elas algumas das mais conservadoras– indicando elevação de 0,75 ponto percentual dos juros nos EUA no fim deste mês, e não de 1 ponto.

A perspectiva de um acréscimo de 1 ponto, absolutamente incomum no histórico do Fed, havia turbinado o dólar na véspera para perto de 5,50 reais e a um novo pico em 20 anos contra uma cesta de rivais de países ricos. Taxas de juros mais altas nos EUA atraem capital para a maior economia do mundo, o que gera conversão de moedas locais em dólar, valorizando a divisa norte-americana.

Mesmo com o respiro desta sexta, o dólar no Brasil ainda acumulou valorização semanal de 2,60%, a mais forte em um mês. Isso deixou o real com o pior desempenho comparado às moedas emergentes mais próximas: peso mexicano, peso chileno, peso colombiano, sol peruano, rand sul-africano e lira turca.

“No contexto atual há pouco espaço para depreciação do dólar”, disse Gabriel Cunha, analista de mercados do C6 Bank.

Cunha explicou que o real vinha liderando os ganhos entre seus pares nos primeiros meses do ano muito em função do rali das commodities e do aumento notável do diferencial de juros, com o Brasil já com processo de aperto monetário em curso enquanto vários países nem sequer o haviam começado.

O dólar chegou a acumular baixa em torno de 17% contra o real no acumulado do ano.

“Mas aí outros BCs começaram a subir as taxas. O superdiferencial de juros está diminuindo e, além disso, as commodities estão em queda e o fiscal aqui voltou a elevar o risco-país”, completou.

Desde os picos em cerca de 11 anos alcançados em junho, um índice de referência para as matérias-primas despencou quase 16%.

Chile, México e países desenvolvidos com moedas correlacionadas às commodities, como o Canadá, têm promovido constantes e em alguns casos fortes aumentos de juros, elevando a concorrência para o real.

E nesta semana o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional dos Benefícios, que prevê despesas de cerca de 40 bilhões de reais fora do teto de gastos –considerado antes uma espécie de âncora fiscal.

A emenda é vista por críticos como instrumento para aumentar chances de reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) e foi avaliada pela agência de classificação de risco Moody’s como evento negativo para a nota de crédito soberano do Brasil.

O C6 Bank vê a trajetória fiscal do Brasil como um dos fatores mais importantes para a direção do dólar. A instituição vê piora na relação dívida líquida/PIB do país para 65% em 2023, de 60% estimados para 2022. Com isso, calcula dólar de 5,80 reais ao fim do ano que vem, 5,45% acima da taxa esperada para o encerramento deste ano (5,50 reais) e 7,29% além da cotação de fechamento desta sexta-feira.

O analista de mercados do C6 Bank acredita que, mesmo já em patamares elevados, o dólar ainda pode tomar fôlego caso dados de índices de gerentes de compras (PMIs, na sigla em inglês) a serem divulgados na próxima semana venham a reforçar temores de recessão pelo mundo.

Em julho, o dólar avança 3,34% ante o real, amenizando as perdas no ano para 3,01%.