Uma luz no fim do túnel. É assim que indústria de computadores enxerga os resultados de vendas do início deste ano. Após cinco anos de quedas, o mercado, finalmente, voltou a crescer: 10,5%, no primeiro semestre de 2017, em comparação ao mesmo período do ano passado, segundo a consultoria IT Data, especializada em tecnologia. Foram vendidas, no período, 2,5 milhões de máquinas. Líder no mercado global, com um faturamento de US$ 43 bilhões no ano passado, a chinesa Lenovo sentiu os efeitos da crise.

No final do ano passado, a empresa reduziu pela metade o tamanho de sua fábrica no Brasil, passando de um galpão de 52 mil m² em Itu, no interior de São Paulo, para um de 23 mil m² na vizinha Indaiatuba. Sua capacidade de produção atual é de 1 milhão de máquinas por ano. O enxugamento veio acompanhado de mudanças estratégicas. O foco, agora, é em computadores com mais recursos – e mais caros – e no segmento de servidores, que são equipamentos voltados para data centers. “Hoje, a demanda é por outro tipo de computador”, afirma Ricardo Bloj, CEO da Lenovo Brasil, que assumiu o cargo em março deste ano.

Essa nova fase representa uma guinada importante na estratégia da Lenovo no Brasil. Em 2012, último ano de crescimento do setor, a empresa chinesa pagou R$ 300 milhões pelas operações da CCE, incluindo suas três fábricas em Manaus. A meta era ganhar volume e mirar na liderança do mercado brasileiro – atualmente, ela ocupa a terceira posição no País, atrás das americanas Dell e HP. Três anos depois, a companhia devolveu a marca e as fábricas aos antigos donos e, pouco depois, resumiu sua operação ao galpão de Indaiatuba. Essa popularização está sendo deixada de lado.

O novo computador, mencionado por Bloj, é dotado de características como telas reversíveis, que permitem ao equipamento ser usado como tablet. As placas gráficas ganharam importância, já que a visualização e a produção de vídeos fazem cada vez mais parte da vida das pessoas, e as redes wi-fi estão ficando mais rápidas. O velho HD, ou disco rígido, dá lugar aos chamados SSD, muito mais eficientes, que permitem ligar a máquina instantaneamente, como um celular. “As pessoas se acostumaram com os smartphones e não querem mais esperar o sistema carregar”, diz Bloj.

Nova fase: a Lenovo, comandada por Ricardo Bloj no Brasil, devolveu as operações da CCE (acima), compradas em 2012, e agora aposta em computadores mais sofisticados (Crédito:Flávio Sampaio | Divulgação)

A competição com os celulares, e também com tablets e TVs inteligentes, por sinal, foi um dos principais motivos que levaram ao declínio dos PCs. Segundo Pedro Hagge, analista de pesquisas da IDC, até 2012, o computador era, praticamente, o único dispositivo na casa das pessoas com acesso à internet. Hoje, é apenas mais um. Outro fator importante nessa derrocada foi a alta do dólar, que fez o preço médio dos produtos subir quase R$ 1 mil, para R$ 2.413, no ano passado. A volta do crescimento também está relacionada ao dólar, que se estabilizou no último ano, levando o preço médio a cair para R$ 2.141. “O crescimento é modesto, mas demonstra que o mercado brasileiro está se estabilizando”, diz Hagge.

Nesse ponto, vale notar a saturação dos mercados de celulares e tablets, que apresentaram quedas no ano passado, de 5,2% e 32%, respectivamente. Passada a febre da novidade, os consumidores estão se voltando para um uso mais racional dos equipamentos, e acabam encontrando em suas mesas computadores defasados, principalmente nas empresas. “Há um momento em que as companhias precisam atualizar seus parques de máquinas”, diz Bloj. É nessa onda que a Lenovo agora espera surfar, trazendo ao mercado novidades como o Yoga, um híbrido de notebook e tablet voltado para produtividade e entretenimento.

Focada no mercado corporativo, a linha ThinkPad, que veio com a compra da unidade de PCs da IBM, em 2005, agora passa por 12 testes militares para garantir o funcionamento do notebook, apesar dos solavancos. Os preços, entre R$ 4 mil e R$ 6 mil, acompanham esse aumento de sofisticação. Segundo Bloj, apesar da queda na venda de celulares, essa transformação do mercado de computação pessoal deve continuar, a partir de agora, com a internet das coisas, que pressupõe a conexão de dispositivos diversos à internet. Nesse processo, o computador, na verdade, tende a ganhar importância, mas demandará uma capacidade maior de processamento.

Nessa mesma linha de raciocínio, a Lenovo está apostando no segmento de servidores. Esse tipo de máquina é usada na infraestrutura da chamada “nuvem”, o universo digital de data centers que compõe a internet atual. Há dois anos, a empresa chinesa comprou a divisão de servidores x86 (referente ao tipo de processador mais utilizado no mercado) da IBM, num complemento à aquisição feita em 2005. O segmento, segundo a IDC, teve um desempenho superior ao de PCs, no primeiro trimestre de 2017, com elevação de 15% nas vendas. Não é comum ver uma empresa chinesa diminuir de tamanho. Mas, no caso da Lenovo, a esperança é que o passo para trás resulte em dois para frente, num futuro próximo.