O diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Tiago Couto Berriel, vê hoje um País em melhores condições para lidar com eventuais choques externos, após o processo de queda da inflação visto em 2016 e 2017. Para ele, no entanto, o andamento das reformas no Congresso, incluindo a da Previdência, continua sendo fundamental, inclusive para manter a expectativa dos estrangeiros em relação à agenda econômica brasileira. A seguir, trechos da entrevista.

Até pela natureza de sua diretoria no BC, o sr. é um dos dirigentes que mais falam com quem está lá fora. O que tem ouvido?

Existe certa esperança, uma crença de que estamos caminhando na direção correta. É uma crença de que a racionalidade vai se impor e as reformas, que são essenciais, vão ser feitas. Isso é bom em um sentido, porque dá tranquilidade para que a gente trabalhe, para que as mudanças sejam implementadas. Outra consequência é que é realmente importante que trabalhemos por essas reformas. Porque, se elas não vierem, vamos perder credibilidade. Não podemos esquecer que a tranquilidade é dependente de nossas ações.

O sr. tem se reunido com representantes de agências de risco. Qual é o principal interesse delas em relação ao Brasil? São as reformas?

Nas agências, eles têm uma visão muito clara de qual é o plano econômico do Brasil, de qual é a direção que estamos seguindo. As perguntas são mais sobre a viabilidade política da implementação da agenda econômica.

No passado, o cenário externo era uma grande preocupação. Agora, isso parece ter mudado. O País está preparado para eventuais abalos?

Comparada há um ano, a situação é muito mais favorável para o caso de termos de absorver um choque externo. Primeiro, porque o processo de desinflação já se deu em grande parte. Pegar um choque negativo no início de um processo de desinflação, com a inflação ainda muito longe da meta é muito pior. O espaço de manobra é maior. Além disso, temos uma série de bons fundamentos nas contas externas. Temos um déficit em conta corrente relativamente baixo, facilmente financiado pelo investimento estrangeiro direto que entra. Agora, o espaço para lidar com choques é muito maior.

No ano passado, logo após a eleição de Donald Trump, houve estresse nos mercados globais. Agora, após seis meses, o “risco Trump” diminuiu?

Num primeiro momento, houve uma reversão das expectativas do que seriam as políticas econômicas nos EUA. Tivemos um realinhamento do que seria a política fiscal, a política de gastos, a política de impostos, e isso tudo reverberou nos preços do mercado, com implicações também no que seria a política de juros americana nesse ambiente mais expansionista. De lá para cá, o que a gente aprendeu é que não é razoável esperar que se mantenha essa reversão de expectativas.

Os preços altos das commodities no mercado internacional ficaram para trás?

Sem dúvida. Nas projeções, vemos uma retomada, mas nada perto do que houve no passado. Não existe previsão de petróleo acima de US$ 100, de minério de ferro em níveis elevados. Isso não está na conta de ninguém.

Qual é a preocupação em relação à China?

Eles estão passando por uma transição em seu padrão de crescimento. De uma economia muito baseada em indústria para uma economia baseada em serviços. Mas ainda há muito estímulo sobre alguns setores da economia chinesa e também bastante controle do governo, que tem sucesso em promover essa transição de maneira suave. Parece haver espaço para manter a transição suave, mas a dúvida é: o espaço é infinito? Será que a transição não está gerando desequilíbrios em alguns setores, principalmente de crédito e fiscal, que teriam de ser revertidos? A gente percebe que algumas questões vão ter de ser endereçadas no futuro.