Aos 67 anos, o taiwanês Jonney Shih pode se orgulhar de ter transformado a Asus numa das maiores empresas do mercado tecnológico do mundo. CEO da companhia por 14 anos, de 1993 a 2007, e até hoje presidente do conselho de administração, o simpático Shih acredita que os seres humanos terão de conviver cada dia mais com máquinas e robôs. Mas não vê nisso um problema. Em sua segunda passagem pelo Brasil, a última foi há oito anos, ele falou com exclusividade à DINHEIRO sobre as mudanças promovidas pelo advento da Inteligência Artificial, a quinta geração da internet móvel no mundo e as apostas da Asus, que mira o público gamer e acaba de lançar sua nova linha de celulares Zenfone e ROG Phone. “As máquinas de hoje têm mais dinâmica e capacidade intelectual”, diz Shih. “Há muitas coisas que elas conseguem fazer bem e melhor do que o próprio ser humano.”

A tendência é que nos próximos anos o 5G chegue finalmente ao Brasil. O que podemos esperar dessa nova tecnologia?
Hoje, nós estamos no meio de uma transição para a Nova Era. Entrando na Era da Internet das Coisas [IoT, na sigla em inglês]. Antes da Revolução Industrial, a principal força do povo era seu poder físico. Hoje isso mudou. A principal extensão do ser humano é a sua inteligência. E é por isso que acho importante falarmos de 5G, que é algo que não servirá apenas para celulares, tudo se beneficiará da ampla banda larga móvel para promover benefícios de todas as formas. O 5G é altamente confiável e sua baixa latência fará com que a experiência do usuário se torne cada vez melhor. Quando você está jogando on-line, cada milímetro de segundo é importante. E o 5G nos ajudará a atendermos essa demanda.

A implementação do 5G virou a nova “corrida do ouro”?
Hoje, nós temos os Estados Unidos e a China competindo por esse mercado. A China é a mais avançada nesse ponto. Ela já está focando em desenvolver a tecnologia 6G, porque isso também fará com que a frequência 5G se torne melhor. A tecnologia 5G já está pronta. Se eles conseguirem dar esse passo para o 6G, terão o 5G mais rápido do mundo. E isso é gratificante.

A chinesa Huawei disputa ponta a ponta com a americana Qualcomm o desenvolvimento de novas tecnologias pelo mundo. Quem irá liderar esse mercado?
A respeito da infraestrutura para o 5G, até este ano aconteceram muitas coisas. A Huawei hoje é muito forte nessa área. O governo dos Estados Unidos até tentou se proteger e defender as empresas de tecnologia americana, mas já era muito tarde. A Huawei se tornou a número 1. E eu ainda me lembro que, em 2003, a Huawei foi acusada de roubar propriedade intelectual da Cisco. Mas agora isso é passado e eles que lideram o desenvolvimento de novas tecnologias.

Num passado não muito distante muitas pessoas acreditaram que as máquinas tomariam o lugar do ser humano. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
Hoje, as máquinas já conseguem trabalhar sem a necessidade de ter qualquer comunicação com pessoas. É claro que as máquinas não irão matar ninguém, como alguns acreditam que pode acontecer. É preciso muito treinamento e muita otimização. É por causa disso que a Inteligência Artificial se tornou de suma importância. Mesmo o primeiro computador, uma máquina, mas era uma máquina pré-programada. As de hoje têm mais dinâmica e capacidade intelectual. Há muitas coisas que elas conseguem fazer bem e melhor do que o próprio ser humano. As pessoas, inclusive, ficaram chocadas ao ver que o AlphaGo [Inteligência Artificial do Google] foi capaz de bater campeão mundial [Lee Sedol] em um dos desafios de raciocínio lógico mais antigos e complexos do mundo. E isso acontece porque a máquina tem seus objetivos definidos de forma clara e objetiva. Só que ainda estamos longe de alcançar todo o potencial gerado pela Inteligência Artificial.

Mas o que precisaria ser feito, na sua visão, para que seres humanos e robôs convivam da melhor forma?
Primeiro não se preocupar tanto assim com eles. Muitos estudos mostram que as máquinas não vão limitar a capacidade de aprendizagem do ser humano. Eu consigo ver como os jovens adquirem muito conhecimento rapidamente, mas o segredo para o futuro da sociedade é estudar cada vez mais a revolução tecnológica em vez de se empenhar tanto na ‘revolução da inteligência própria’. É preciso usar a inteligência humana e a inteligência das máquinas juntas. Acho que essa é a chave de tudo.

Em dezembro de 2018, Jerry Shen deixou o cargo de CEO da Asus, após mais de uma década à frente da companhia. O que isso significa?
Tivemos um crescimento extraordinário nos últimos anos. O último CEO é um ótimo profissional e é um dos principais responsáveis pelo nosso crescimento na última década. Ele sempre foi muito rápido em termos de atender o público com a melhor tecnologia possível. Agora, nós queremos alavancar a inovação em direção à Internet das Coisas [IoT]. Os novos CEOs também têm muito conhecimento tecnológico e também são ótimos em design thinking, não importa se voltado a smartphones ou PCs. Essa foi uma mudança importante e nós fizemos uma campanha internamente chamada “retransforrmação”.

Isso significa que a empresa passará por mudanças?
Uma das coisas é que iremos investir mais em design thinking. Outra é termos a certeza de que nós podemos desenvolver e entregar o melhor do melhor e voltar às nossas origens, quando a empresa foi fundada [1989], para focar na parcela mais difícil da invenção dos produtos. Quando você consegue lidar com essa parcela mais difícil, o resto é fácil.

A performance do mercado gamer vem crescendo ano a ano no Brasil. Vocês pretendem explorar mais esse nicho?
Sim. O mundo passa por um crescimento fenomenal impulsionado, principalmente, pelas empresas chinesas, que foram muito agressivas nos últimos anos. Isso é o que nós temos que percorrer para sermos o melhor desse segmento. E a Internet das Coisas vai nos ajudar nesse sentido. Não é uma tecnologia apenas para os smartphones, mas para todo um ecossistema. Ela ajudará a termos mais qualidade em PCs, placa-mãe, placa de vídeo e, até mesmo, em roteadores e monitores. Temos uma estratégia e um time para atender a demanda crescente desse mercado e vamos competir de igual para igual nessa batalha.

Existe uma percepção de que boa parte da população brasileira gosta de inovação e já tem acesso a um smartphone de primeira linha. O que podemos esperar de melhorias para esses produtos?
É o que nós pensamos desde 2014. Estamos desenvolvendo novos produtos para oferecermos o melhor do melhor do segmento. Uma coisa importante é que o mercado brasileiro e as pessoas no Brasil querem receber inovação e tecnologia. O consumidor gosta disso. E eles seguem fielmente algumas marcas. Então, precisamos ter o melhor do melhor para conquistar esse cliente. O mercado brasileiro é muito importante para nós.

A Alexa, assistente virtual inteligente da Amazon, acaba de ser lançada em língua portuguesa. Esse tipo de tecnologia tende a tomar o espaço dos smartphones?
A voz será a nova visão. Não é difícil perceber que as pessoas estão mais ocupadas e buscam formas de facilitar as coisas e economizar tempo e energia. Nessa linha, a Inteligência Artificial se tornará algo cada vez mais comum. Isso faz parte de outra dimensão, uma dimensão muito importante para o futuro do ser humano. Mas não vejo, num primeiro momento, que isso irá extinguir o uso de smartphones.