Netflix perde. A sequência de ações e decisões do sistema judicial brasileiro é imbatível em termos de reviravoltas, novos dramas, alguma tragédia e, claro, buracos no roteiro. Ou alguém entendeu por que Dilma Rousseff sofreu impeachment e não perdeu os direitos políticos por oito anos – um daqueles momentos Joguei-A-Constituição-No-Lixo. O episódio mais recente na temporada 2021 começa com a determinação do ministro Luiz Edson Fachin, na segunda-feira (8), de anular as condenações do ex-presidente Lula. Fachin decidiu que a 13ª Vara Federal de Curitiba, do qual Sergio Moro era titular, não poderia julgar os casos e que tudo deve ser feito na justiça de Brasília. Na prática, restabeleceu os direitos políticos de Lula.

Mas o efeito igualmente maior do ministro do STF passou sob menos holofote da mídia: quem Fachin livrou mesmo foi Moro, que passaria ao largo de ser considerado parcial – termo equivalente a juiz ladrão, no futebol. Se os processos não ‘existiram’ em Curitiba, Moro nada de errado fez na capital paranaense.

DESTINO DE MORO ESTÁ EMPATADO NO STF

Foi o bastante para irritar Gilmar Mendes que, 24 horas depois, decide ressuscitar o julgamento de suspeição de Moro, adormecido no STF desde 2018. Na terça-feira (9), fez um longo e elogiado voto de abate ao ex-juiz. Foi seguido por Ricardo Lewandowski. Agora a votação está 2 a 2 (há três anos, Fachin e Cármen Lúcia haviam votado pela imparcialidade de Moro). Entre 2018 e hoje uma peça importante entrou na trama: os vazamentos das conversas republicanas pelo site The Intercept. Para dar pitadas de reviravolta, Cármen Lúcia indicou que pode mudar seu voto. Com esse tipo de enredo na mão, o voto de minerva coube ao novato Kassio Nunes Marques, recém-indicado pelo presidente. Ele pediu vistas. Ou seja, interrompeu o desfecho. Na trama, está claro que os membros do STF não conversam antes de decisões que impactam todo o País. Está claro que não se entendem tecnicamente. Está claro que preferem levar suas discordâncias para o público antes de resolvê-las no colegiado. Só não está claro aonde o Brasil vai com esse interminável vaivém legal.

NOVO DE CARA NOVA

Na segunda-feira (8), o Partido Novo declarou oposição à gestão do presidente Jair e afirmou que ela pode causar tantos danos quanto o petismo. “O governo federal abandonou pautas fundamentais, como reformas essenciais para o cidadão e para o retorno ao crescimento sustentável do País”. Pela diretriz, os políticos do partido – que teve João Amoêdo como candidato a presidente – terão de votar de acordo com os princípios da legenda. Na mesma decisão, a bancada federal se coloca como independente. Isso significa que não haverá alinhamento automático à oposição. O partido se coloca como a terceira via de 2022, de olho na polarização Bolsonaro-Lula. “O Novo trabalhará arduamente para que o Brasil tenha um caminho alternativo nas urnas.”

BAD TRIP EM ISRAEL

Raul Spinass

Além de fazer um tour com gastos ainda desconhecidos, a delegação brasileira que viajou a Israel para conhecer o spray nasal de combate à Covid-19 deparou com um país sério, científico, cético e… irônico. A recepção israelense levou a galera para conhecer os métodos do país na luta contra a pandemia: distanciamento social, uso de máscaras e vacinação em massa. Quem diria. Ernesto Araújo, que comandou a comitiva, até usou máscara (uia!). Por exigência dos israelenses, que sabem o que a cúpula do governo brasileiro pensa a respeito. “Jair Bolsonaro tornou-se famoso por seu ceticismo sobre o novo coronavírus, evitando máscaras e dizendo que não receberá a vacina”, afirmou reportagem do Jerusalem Post. Dos 35 pacientes nos quais o spray foi testado, 31 deixaram o hospital entre dois e cinco dias de tratamento. Apesar de promissor, o número de pessoas testadas é baixo, sem um grupo de placebo, nem a pesquisa foi revisada por pares. Ciência é o nome dessa parte. Na volta ao País, Eduardo Bolsonaro disse que Israel quer fazer testes em massa com o spray por aqui, “por causa da diversidade do povo brasileiro”. Se isso ocorreu, a imprensa israelense não ficou sabendo. Ou desprezou a veracidade. O que recebeu destaque positivo foi a posição brasileira para que não prossiga a investigação aberta no Tribunal Penal Internacional (TPI) por supostos crimes de guerra de Israel cometidos nas áreas palestinas ocupadas.

“A PARCERIA ENTRE BRASIL E ISRAEL VAI MUITO ALÉM DO SPRAY NASAL”

Divulgação

Qual sua visão sobre a visita da comitiva do governo brasileiro a Israel, na semana passada, em busca do spray nasal contra a Covid-19?
Acredito que a aproximação do governo brasileiro tenha objetivos maiores. A parceria entre Brasil e Israel vai muito além do spray nasal. As tecnologias israelenses voltadas à telemedicina são hoje as mais avançadas do mundo e podem ajudar muito o Brasil a superar os obstáculos de atendimento e de custos na área da saúde. Com o uso de big data, monitoramento e o chamado Prontuário Eletrônico Único, Israel tem muito a contribuir com o País.

Por que Israel investiria no Brasil agora, enquanto a grande maioria dos estrangeiros está saindo?
Por enquanto, os empresários de Israel estão analisando como o Brasil vai conduzir a recuperação econômica pós-pandemia. Na minha visão, independentemente do ambiente atual, os dois países têm perfis complementares. Israel tem a tecnologia e o Brasil possui as condições ideais de mercado e de produção.

As relações entre Brasil e Israel estão melhores hoje?
O intercâmbio político e cultural entre as duas nações é o melhor de todos os tempos, sem dúvida. No campo econômico, não tem ocorrido grandes mudanças nos últimos anos. O crescimento tem sido discreto. Mas queremos fortalecer os laços. Não posso dar detalhes, mas estamos negociando parcerias com governos, especialmente para a área da saúde. No Brasil, negociar com os governos é muito difícil, mas as perspectivas são positivas.

JOHN ABBOTT

“A atividade de pesquisa em todo o mundo com esse vírus (da Covid-19) é de tirar o fôlego e está mudando a maneira como a ciência é feita. Mostra o que pode acontecer se as pessoas realmente se mobilizarem e trabalharem juntas” Charles M. Rice, Nobel 2020 de Fisiologia/Medicina.

PARAGUAI NAS RUAS

Nossos vizinhos tiveram bem menos paciência com o descaso governamental em relação à Covid-19. Na quarta-feira (10), os paraguaios completaram seis dias seguidos de protestos contra a falta de vacinas. Pelo menos uma pessoa morreu, segundo a imprensa local. A crise dos últimos dias já derrubou quatro ministros, incluindo o da Saúde, Julio Mazzoleni, e deu início a movimentações de congressistas para o impeachment do presidente Aldo Benítez. O país tem mais de 172 mil infectados com o coronavírus e mais de 3,3 mil mortes. O Paraguai recebeu apenas 4 mil doses da russa Sputnik V. Além de não ter se programado com antecedência para a compra de vacinas – como fez Brasília – há várias acusações de desvio de dinheiro público destinado ao combater a pandemia. O Chile informou que enviará 20 mil doses de vacinas para os paraguaios.