1. O milagre de Pedro. O mundo celebra em 29 de junho o dia de São Pedro, fundador do cristianismo e primeiro papa da igreja católica. Para os moradores de Manduria, cidade da Puglia, no extremo sul da Itália, Pedro teria naufragado na costa da região, sendo salvo pelo povo de Felline no ano 45 d.C. À época, havia ali um surto de lepra. A cura do povo e de seu rei é atribuída a Pedro. Hoje, Felline dá nome a uma vinícola tão premiada quanto inovadora.

2. Os Crus da Manduria. Com uma equipe enológica comandada por Gregory Perucci, a Felline impulsionou a descoberta de variedades autóctones e foi protagonista do sucesso do Primitivo di Manduria, além der ter fixado o conceito francês de Cru na região, a partir das características de cada tipo de solo: vermelho, negro e arenoso. Cada cru dá origem a um vinho autêntico, de personalidade própria.

Da “terre rosse”, de argila com alta presença de óxido de ferro que lhe dá a cor avermelhada, vem o Archidamo, 100% Primitivo com 14% de álcool e coloração rubi. Seus taninos persistentes, mas não cansativos, pedem pratos gordos e estruturados.

Plantadas em pé franco (sem enxertia) a poucos metros do mar, as videiras de mais de 60 anos do cru Sabia Areia dão origem ao Dunico (93 pontos Vincus, R$ 508,70 no site da importadora Decanter), com teor alcóolico de 16 graus, perfume de cereja ao licor e potencial de 15 anos de guarda.

3. Primitivo ou Zinfandel? Única variedade não autóctone cultivada pela Felline em sua terra preta formada pela degradação de antigas florestas, a Zinfandel foi levada há vinte anos dos vinhedos de Geyerseville de Ridge, na Califórnia, para a Puglia. A ideia era compará-la à sua “irmã gêmea”, a uva Primitivo. Segundo Salvatore Mero, agrônomo da Felline, quando a “americana” começou a dar frutos, ninguém era capaz de notar diferenças em relação à europeia. Hoje está provado que ambas são geneticamente idênticas. Por isso a Felline produz seu Primitivo di Manduria Sinfarosa com o nome Zinfandel no rótulo (92 pontos Vincus e tre biccieri no guia Gambero Rosso). Com 15 graus, aromas de especiarias, notas mentoladas e balsâmicas, o vinho pede pratos como javali, avestruz e cordeiro.

4. Negroamaro não é uma uva amarga. E a quarta curiosidade deste texto não é exatamente sobre a Primitivo mas sobre a variedade quase tão famosa quanto ela na Puglia, em especial na região de Salento. A Negroamaro costuma ter seu nome erroneamente interpretado. A etimologia da palavra tem duas raízes: latina e grega. Ambas significam negro: níger (latim) e mavrus (grego). Sua tradução literal, portanto, seria algo como duas vezes preta. É essa uva que entra em 60% da composição do Anarkos 2018, um vinho “criado para ir contra as regras”, segundo Salvatore Mero, da Felline. As outras uvas são a Primitivo (30%) e a Malvasia Nera (10%), também escura. E qual a sugestão do enólogo para acompanhar esse rótulo anarquista? Churrasco brasileiro com farofa e vinagrete, ou pizzas em geral. Custa R$ 159,20 na Decanter.