A falta de saneamento básico é um dos maiores problemas de saúde pública. Mais de 40% da população não têm acesso adequado à água e 60% não conta com esgoto. O assunto era urgente há dez anos. Hoje, é crítico, ainda mais com as epidemias de zika e dengue. Na semana passada, o governo Temer adotou uma estratégia de mercado para lidar com a situação. E anunciou, junto com um pacote amplo de privatizações, a venda de parte das operações de empresas estatais de saneamento, entre elas a Cedae, do Rio de Janeiro, a Caerd, de Rondônia, e a Cosanpa, do Pará. A ideia é entregar a operação à iniciativa privada e, assim, melhorar as finanças públicas e a qualidade dos serviços prestados à população. Em outros setores, como o de telefonia, a tática funcionou. Na área de saneamento, porém, os casos de sucesso são raros, alerta a Organização das Nações Unidas (ONU).

O Estado precisa ficar de olho para garantir as melhorias, como faz na telefonia. O brasileiro Leo Heller, relator da ONU para água e saneamento, afirma que há uma tendência de reestatização desses serviços em diversos países. “A empresa privada não investe o suficiente e adota políticas de exclusão dos mais pobres, impondo tarifas mais altas”, diz Heller. Um estudo realizado em 2014 aponta que, em 15 anos, houve ao menos 180 casos de remunicipalização do fornecimento de água e esgoto em 35 países. Desse total, 136 aconteceram em países de alta renda e 44, em países pobres. Paris, Berlim, Buenos Aires, La Paz e Budapeste preferiram o modelo público. “Por trás do discurso da privatização, podemos ter uma tentativa de afastamento do Estado em sua obrigação de fornecer saneamento.” No caso do Brasil, o fracasso do modelo estatal não ajuda a defender essa tese.

(Nota publicada na Edição 985 da Revista Dinheiro)