É um número terrível: 3,28 milhões de casos de Covid confirmados no mundo em apenas um dia. Foi na segunda-feira (10). A taxa recuou levemente nas 24 horas seguintes, para 2,86 milhões. Mesmo assim, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou para o estrago que a atual velocidade de contágio da variante Ômicron pode causar na Europa, onde metade da população deverá contrair o vírus em até oito semanas. Nos Estados Unidos, onde estão 45% dos atuais infectados, o Centro de Prevenção e Controle de Doenças, equivalente à Anvisa, afirmou que irá adotar novas recomendações para o uso de máscaras, entendendo que a maior parte das que estão sendo usadas pela população tem baixa eficácia. No Brasil, que ocupa a terceira colocação no ranking de países com mais pessoas contaminadas pelo coronavírus (22,6 milhões, atrás de EUA e Índia) e a segunda posição em número de óbitos (621 mil), um colapso nos sistemas de saúde vem se desenhando conforme mais profissionais contraem o vírus e precisam ser afastados do atendimento à população. Uma das definições de colapso, segundo o dicionário Oxford, é prostração extrema. É provavelmente isso que veremos nas próximas semanas. Não apenas na saúde, mas por todo lado.

Debilidade física, emocional e psicológica. Esgotamento, melancolia, tristeza. Os sinônimos de prostração trazem imagens desoladoras, que se aplicam ao que estamos vivendo no Brasil desde o início da pandemia. Um quadro que agrava com as atitudes de um presidente negacionista que prefere fazer ameaças aos profissionais da Anvisa por terem liberado a vacina para crianças a admitir que o combate à pandemia exige um esforço de guerra. Vacinas, testes — inclusive os autotestes caseiros, que já deveriam ter sido liberados há tempos —, higiene e isolamento são as poucas armas de que dispomos. Mas nem elas são suficientes para lidar com um vírus que se adapta rapidamente. Sem outros recursos para contê-lo, a disseminação é inevitável. Pior: ela provou ser ainda mais acelerada no caso da variante Ômicron, ainda que a cepa seja menos letal. Se há o consolo relativo de que menos pessoas estão morrendo de Covid agora do que no início da pandemia, quando não havia vacina, há o fato inegável de que atuais níveis de contágio tendam a tirar mais pessoas de suas atividades profissionais, ainda que por um curto período.

Em 2020, a receita adotada globalmente para lidar com a pandemia foi o isolamento. Muitas cidades adotaram o lockdown. Para compensar as perdas na economia, bancos centrais de todo o mundo abriram seus cofres, despejando quantias antes inimagináveis de dinheiro. No Brasil, o auxílio emergencial representou alívio a muita gente impossibilitada de obter renda de outra forma. Agora, a realidade é outra. Como os incentivos governamentais não podem ser distribuídos eternamente, essa nova onda de afastamentos não poderá ser compensada com mais dinheiro público — até porque o teto de gastos do Orçamento já foi comprometido. E os efeitos deletérios da explosão de casos de Covid não se limitam à população de baixa renda que recebeu o auxílio emergencial. Se aquele dinheiro ajudou a sustentar uma parte do consumo desde o início da pandemia, agora ele fará falta.

Ao mesmo tempo, a iniciativa de reduzir bruscamente os juros, que produziu efeitos positivos na economia brasileira em 2020, se tornou impensável. A taxa Selic será elevada conforme a necessidade do Banco Central de conter a inflação, que ficará acima da meta também este ano, depois de fechar 2021 em 10,06% — a maior desde 2015. Juros mais altos significam crédito mais caro. Ou seja, menos investimentos por parte das empresas — e, consequentemente, menor geração de empregos. A lógica é perversa, mas é assim que a coisa funciona. E é neste horizonte lúgubre que a Covid avança.

Celso Masson é diretor de núcleo da DINHEIRO