O presidente Bolsonaro teve mais uma de suas tiradas que talvez seguidores possam classificar como geniais. Ele resolveu levantar a proposta de uma visita de cortesia a Vladmir Putin com uma comitiva formada por chefes de Estado, que teria por objetivo aplainar os ânimos, numa viagem a Rússia justamente em um dos momentos mais tensos das relações internacionais. Risível, caso o inquilino do Planalto não tivesse levado a ideia tão a sério que chegou a manifestá-la abertamente a autoridades turcas, em encontro recente. Essas, perplexas, desconversaram. O capitão, que já emprestou solidariedade às intenções belicistas de Moscou, vem se mantendo em cima do muro, contrariando a postura global de retaliações contra a invasão à Ucrânia. Talvez seja por essas e por outras que o Brasil ficou de fora, pelo terceiro ano consecutivo, da lista de convidados a participarem da reunião anual do grupo do G-7, o clube que reúne as nações mais ricas do planeta. Na prática, desde que Jair Bolsonaro tomou posse, o Brasil vem sendo sistematicamente preterido, excluído desses encontros pelo líder do país anfitrião. Em 2019, Emmanuel Macron, da França, evitou chamar o presidente brasileiro, com quem nunca cultivou as melhores relações, e optou pelo Chile. A Inglaterra, a seguir, também fez o mesmo. Desta feita, até o Senegal, Índia, Indonésia e África do Sul (dois dos integrantes do BRICs) estarão lá enquanto o Brasil segue na geladeira. Não há dúvida: a condição de pária, fora do concerto das nações, é o figurino que cai como uma luva no momento. Após toda má impressão passada com o recorde de desmatamentos e queimadas – justamente quando o mundo persegue metas de sustentabilidade – o sinal de alerta já havia sido acendido contra as injuncões do governo brasileiro. As ameaças antidemocráticas de questionamento das eleições apenas agravaram o quadro. Bolsonaro é tido e havido na comunidade externa como um personagem pitoresco, para dizer o mínimo. Não causa qualquer boa impressão em parceiros europeus, asiáticos e muito menos americanos. Os principais parceiros latinos, inclusive, torcem o nariz as suas diatribes. O episódio recente de sugerir uma circunstância na qual representantes internacionais seguissem a Rússia quase para prestar uma espécie de vassalagem a alguém que está tumultuando as relações diplomáticas com os seus impulsos de conquista gera ainda mais repulsa e desprezo ao por aqui chamado de “mito”. São delírios que atendem, talvez, a seus planos de palanque eleitoral, para se mostrar aceito lá fora, ao menos por alguns. Poderia sugerir convidar o vizinho venezuelano, Nicolás Maduro, que, como ele, também faz vista grossa e apoia as movimentações de Moscou. Fora eles, quem mais entraria nessa canoa furada? Putin, por sua vez, torce por um sinal como esse. Serviria de argumento contra os opositores que o criticam por causa do isolamento e rompimento de relações gerados até aqui. Em outras palavras: seria uma aproximação de extremistas cujo benefício ficaria limitado exclusivamente a eles próprios. A guerra de Putin já gerou mais de cinco milhões de refugiados e outras milhares de mortes. Bolsonaro parece não colocar na balança tais inconvenientes. Provavelmente por encarar como meros efeitos colaterais. “É da vida”, como fala. O mesmo tipo de reação já verificado diante da hecatombe da pandemia da Covid. Falta um pouco de “semancol” para tanta proposta indecente.

Carlos José Marques Diretor editorial