Em pleno cenário de aumento de consumo de GLP, o tradicional gás de cozinha, a partir do isolamento social, a companhia Liquigás vive hoje em compasso de espera. A expectativa gira em torno da definição do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) pela possível aprovação da venda da empresa, que é subsidiária da Petrobras, no valor de R$ 3,7 bilhões, anunciada em novembro do ano passado, para um consórcio formado pelo Itausa, braço de investimentos do Itaú, Copagaz e Nacional Gás. O mercado dá sinais de que aposta na aprovação ainda em novembro. Durante todo o processo de análise, o Cade chegou a afirmar mais de uma vez que a transação era “complexa”. “A empresa está em condições de se adequar à nova visão estratégica, a partir da concretização da venda. A Liquigás está sólida e é geradora de caixa e de resultados estáveis”, disse o CEO da Liquigás, Luiz Fernando Marinho Nunes. “A Liquigás está financeiramente sólida, sem dívida, para inclusive aumentar plano de investimentos.”

Segundo dados do Sindicato Nacional das Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás), entre março e setembro deste ano o volume de vendas de botijões de 13kg, os mais comuns, registrou alta de 7,79% em relação ao mesmo período do ano passado. Por outro lado, o consumo a granel, por indústrias e comércio, caiu 5,83%, associado ao fechamento, durante um período da crise sanitária, de empresas. Na média geral, o aumento no volume durante a quarentena chegou a 3,97%. O executivo da Liquigás não revela o dado da companhia, mas afirma que o crescimento nas vendas foi semelhante ao movimento do mercado de gás.

Os resultados financeiros refletem isso. Entre janeiro e setembro, a Liquigás registrou receita líquida de R$ 3,78 bilhões, contra R$ 3,62 bilhões no mesmo período de 2019 (alta de 4,41%). O lucro líquido disparou. Foram R$ 140,8 milhões nos primeiros três trimestres de 2020, acréscimo de 98,8% sobre o mesmo período de 2019, quando a empresa alcançou R$ 70,8 milhões. Para o presidente, os números refletem a diminuição dos custos por um período nos últimos meses, por conta da queda do petróleo. “No auge da pandemia, houve grande queda no preço da matéria-prima, porque o mercado de petróleo desabou. Portanto, houve uma expansão das margens mas não dos preços ao consumidor”, disse Nunes.

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“A Liquigás está financeiramente sólida, sem dívida, para inclusive aumentar plano de investimentos” Luiz Fernando Marinho Nunes, CEO da Liquigás.

Mas, o que se viu, nas primeiras semanas após o início da pandemia, foi uma procura intensa por botijões, o que resultou em desabastecimentos pontuais e alta de preço acima do praticado pelo mercado. No oficial, o valor se mantém estável. Segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), o preço médio praticado ao consumidor em abril era de R$ 69,06. Em outubro, foi a R$ 71,64, o que significa aumento de 3,8%. Entre maio e novembro, foram oito reajustes no preço do GLP realizados pela Petrobras aos distribuidores, que chegaram a 16%. O último aumento foi no dia 4, de 5%.

Se a venda da Liquigás for de fato concretizada, a nova companhia se tornará a maior do mercado, ultrapassando a líder Ultragaz, que, em 2018, tentou comprar a empresa da Petrobras, mas foi barrada pelo Cade. A Liquigás tem hoje 21,13% de participação no mercado, atrás da Ultragaz, com 23,20%. A Copagaz tem 8,68%.

Para Alexandre Borjaili, presidente da Associação Brasileira dos Revendedores de GLP, a preocupação é de que a venda da companhia não gere uma c ncentração maior de mercado. “Temos conversado com setores do governo sobre a preocupação de que esse processo não se torne o retrato de um setor cartelizado. A concorrência é muito importante para que não haja aumento do preço médio ao consumidor final”, disse.

O Brasil hoje tem 61.257 revendas autorizadas pela ANP, que comercializam, em média, 36 milhões de botijões de 13 quilos mensalmente e geram 380 mil empregos diretos e indiretos. Mas, segundo Borjaili, há potencial para venda de pelo menos 60 milhões de botijões por mês. “O que dificulta é o preço. Precisamos criar condições para atender a demanda de quem mais necessita do produto sem elevação do valor, ao contrário do que temos visto nos últimos meses. Isso afeta os clientes e os revendedores.”

Para o CEO da Liquigás, não há risco de prejuízo ao cliente final com a união da empresa com a Copagaz. “Uma negociação desse tipo é muito complexa e há algum nível de concentração nesse processo. Mas o importante é que não haja concentração que possa prejudicar o consumidor. Não entendo que esse seja o caso.” A expectativa do dirigente é de que, com a aprovação, a transição seja rápida. “É possível que a decisão saia neste mês. E, com isso, a condução do processo não deve ser maior do que três meses”, disse Nunes. Com cerca de 3 mil funcionários, a Liquigás deve fechar o ano no mesmo ritmo desde o início da pandemia. “A perspectiva é de fechar 2020 com aumento no volume de vendas próximo a 4%.”