Não existe isso de má propaganda, certo? A rede de restaurantes Hooters colocou o lema à prova na semana passada ao anunciar uma polêmica estratégia de atração de usuários pós-pico da pandemia: a eliminação de vários centímetros em seus já diminutos shorts, em plena era do movimento #metoo e redes sociais que causam mais barulho do que os falantes espalhados pelos salões das mais de 430 lojas da rede de casual dinning. Funcionou… numas. No TikTok não se postava outra coisa no dia do anúncio que não as esbeltas funcionárias exibindo as mudanças, tanto com críticas como com discursos mais subservientes grudados a frases como: “E daí? Estou recebendo mais gorjetas assim!’’ E daí que a Hooters of America, que nasceu em Clearwater, Flórida, nas mãos de seis amigos em 1o de abril de 1983, Dia da Mentira, por não achar que a empreitada duraria, teve de voltar atrás. “Continuamos ouvindo e atualizando a imagem das garotas Hooters e esclarecemos que elas têm a opção de escolher entre os tradicionais e os novos uniformes, podendo determinar que estilo se adequa ao seu tipo de corpo e imagem pessoal”, afirmou um porta voz ao Business Insider.

A Hooters já teve quatro restaurantes no Brasil, mas depois de 17 anos definhou em 2019, apesar de muita gente achar que ainda existe uma por aí. Sua principal concorrente no mundo é a Applebee’s, que apesar da maçã no logo não tem pecados à altura da Hooters – e seus trajes não assustam a família. Talvez tenha sido esse um dos motivos de ter perdido a batalha no Brasil. Sem o público familiar, somente homens com testosterona desenfreada, não se faz número suficiente. “Chamamos esses estabelecimentos de ‘Breastaurants’. Existe até um concorrente chamado Twin Peaks, acredita?”, diz à DINHEIRO Juelene Beck, expert e consultora de restaurantes na Flórida, citando as brincadeiras e sinônimos com a palavra seio em inglês e a tremenda heresia à série de 1990 de David Lynch. Alheio às críticas, Sal Melilli, CEO na sede atual do grupo, em Atlanta, afirmou ao Nation’s Restaurant News: “Quando se menciona Hooters, a associação de palavras é ‘garotas hooters’ e ‘asas de frango’. A boa notícia é que na pandemia a demanda pelo segundo item se manteve alta.”

Já no começo da pandemia, em janeiro de 2020, a Hooters lançou sua asa de frango vegetariana, sem carne, sem soja, glúten ou qualquer coisa geneticamente modificada, em uma parceria com a Quorn, líder nesse segmento de ‘carne de mentira’. O toque realista é o clássico tempero da Hooters, que se sobressai a qualquer coisa. Houve muita demissão com os salões fechados durante a pandemia, mas a rede começou a readmitir garotas recentemente em seus mais de 400 restaurantes pelo mundo.

DivulgaçãoAS BELAS E AS ASINHAS O antigo e clássico uniforme laranja, mais largo embaixo, e as asinhas de frango crocantes via delivery que salvaram a Hooters durante a pandemia. (Crédito:Divulgação)

NOVA DIREÇÃO Em julho de 2019 a Hooters foi vendida para a Nord Bay Capital e TriArtisan Capital Advisors, LLC, em um acordo financeiro não revelado. Apesar do incrível e aparente atendimento sexista, nos EUA a rede é uma das mais lucrativas – estima-se que sua receita anual esteja perto dos 900 milhões de dólares, segundo a consultoria Technomic. Eles batem facilmente restaurantes da Hard Rock Cafe e California Pizza Kitchen, só para citar alguns familiares aos brasileiros. Pré-pandemia, em 2018, a Hooters vinha crescendo 2%, comparado com a Applebees e TGI Friday, que vinham capotando com algarismos negativos. O short que virou biquíni queria desafiadoramente ampliar essa porcentagem, mas a estratégia não deu certo.

A garçonete americana Kirsten Songer, também uma estudante de medicina, em um dos vídeos de protesto virais no TikTok, disse que os shorts não têm a parte de baixo. “Não cobrem nada, é uma calcinha! Não foi isso que eu concordei em usar quando fui contratada.” O Calendário 2022, com suas meninas de biquíni e renda de US$ 1 por edição revertida para pesquisa do câncer de mama, não aliviou a barra. Em mais de 30 países, a Hooters continua a toda carga e atraindo o público masculino. A expert Juelene se espanta: “Coço a cabeça. É incrível que a marca tenha tanta força. É como se sexo continuasse vendendo!”