O alto preço dos combustíveis gera uma imagem negativa que nenhum político deseja assumir em ano eleitoral. Apesar de o preço da gasolina ter caído 0,15% em janeiro, segundo levantamento feito pela ValeCard, empresa especializada em gestão de frotas, o combustível fóssil atingiu a marca de R$ 8 pela primeira vez no Brasil, em Angra dos Reis (RJ), segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

O preço nacional médio do combustível, divulgado pela agência reguladora, ficou em R$ 6,65, o que representa uma alta de 44% em relação ao valor médio registrado em janeiro de 2021.

+ Com altas da luz e da gasolina, arrecadação do ICMS bate recorde
+ Guedes diz que corte de imposto sobre diesel pode avançar, mas questiona beneficio a gasolina

Mas quais são os fatores responsáveis pela escalada no preço dos combustíveis?

Inflação e câmbio

Com a pandemia causada pela Covid-19 e o isolamento social em todo o mundo, a demanda de consumo e também por combustível diminuíram. Com a vacina e a retomada de hábitos, a demanda por combustível e energia elétrica voltou, mas a oferta não conseguiu acompanhar, gerando um fenômeno de inflação de demanda.

“A retomada da pandemia, quando tivemos vacinas, aumentou a demanda por combustível e ajudou a aumentar o preço, já que a oferta não acompanhou a demanda”, explica Marcelo Braga, especialista em gestão de cadeia de suprimentos e gerente da ValeCard.

Outro fator relevante à alta no preço dos combustíveis é a desvalorização do real diante do dólar. Isso ocorre porque a Petrobras adota a política de Paridade de Preço Internacional (PPI), na qual estima o preço do barril de petróleo conforme o mercado internacional. Assim, por mais que o Brasil seja autossuficiente na produção de petróleo, está sujeito às variações internacionais, agravadas pelo conflito geopolítico na Ucrânia.

“Muitos fatores afetam o preço do combustível, mas o mais importante é o preço do barril de petróleo. Muita gente acha que a Petrobras não teria que considerar o preço internacional do barril, mas eu acho que deveria, sim. Isso porque a Petrobras tem acionistas privados no mundo inteiro. Se não praticar, ela corre o risco de ser processada pelos acionistas e seria proibida de vender suas ações na Bolsa de Nova York”, argumenta o professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Feldmann.

Feldmann, contrário à privatização da Petrobras, diz que o governo poderia injetar mais dólares no mercado nacional, o que reduziria o preço dos combustíveis. Isso seria preferível à adoção de subsídios para custear o impacto no preço dos combustíveis, como foi feito durante o governo Dilma Rousseff (PT).

Petrobras

Quem é contra a PPI da Petrobras é Carlos Alberto Litti Dahmer, diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTLL), uma das entidades de caminhoneiros mais ativas e que participou da greve de 2018 e das paralisações do final de 2021. Litti critica uma política que lesaria o povo brasileiro em função do lucro de acionistas internacionais da Petrobras.

“Não estamos aqui para fazer caridade para investidor americano. A função social da Petrobras, já que o petróleo é nosso, é usá-lo em favor do desenvolvimento do País. Um governo que se diz nacionalista deve defender esses princípios. Ela funciona como um Robin Hood paraguaio: tira dos pobres e distribui aos ricos”, argumenta o líder caminhoneiro. “Rico não precisa de estado. Nós trabalhadores precisamos do estado”.

Impostos

A Petrobras divulgou uma tabela com a formação do preço da gasolina, com dados coletados entre 26 de dezembro de 2021 a 1 de janeiro de 2022:

– R$ 1,77 – ICMS (imposto estadual)
– R$ 0,87 – Distribuição e revenda
– R$ 1,04 – Custo Etanol Anidro (a legislação brasileira determina a mistura do produto na gasolina)
– R$ 0,69 – CIDE, PIS/PASEP e COFINS (impostos federais)
– R$ 2,26 – Custo da Petrobras

Ou seja, a gasolina sai da Petrobras a um custo de R$ 2,26 e chega ao consumidor final em R$ 6,63. Somados, os valores de todos os impostos ficam em R$ 2,46, maior que o preço do combustível que sai da Petrobras.

Depois da troca de acusações políticas para evitar o rótulo de responsabilidade pelo preço da gasolina, os governadores congelaram o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre combustíveis em 1 de novembro de 2021, o que terminou apenas neste mês de fevereiro.

Veja os preços médios da gasolina, segundo a ANP:

– 24 a 30 de outubro, semana anterior ao congelamento de ICMS: R$ 6,75;
– 31 de outubro a 6 de novembro, primeira semana de congelamento de ICMS: R$ 6,91;
– 9 a 14 de janeiro: R$ 6,91.

Durante o congelamento de ICMS, a Petrobras fez dois ajustes nos preços cobrados nas refinarias: reduziu a gasolina em 3,1% em dezembro de 2021, mas depois aumentou o custo da gasolina em 4,85%.

Observa-se que a questão tributária é relevante na constituição do preço do combustível, mas a variação do barril de petróleo, a crise cambial e os reajustes da Petrobras, seguindo o mercado internacional, têm mais relevância.

Distribuição

Uma das poucas privatizações do governo Bolsonaro foi a BR Distribuidora, que detinha o monopólio estatal da distribuição de combustíveis. Hoje em dia, além da Vibra Energia, Raízen (Shell) e Ultrapar (Ipiranga) atuam no mercado. Segundo Feldmann, o governo teria condições de regulamentar a distribuição de modo a buscar a redução do preço do combustível nesta etapa da cadeia logística.

“É oligopólio; se é para mexer, o governo tem condição de regulamentar a distribuição. Os lucros são astronômicos. Imposto não é possível mexer, sobretudo os estaduais. Talvez possa mexer na taxa de conversão do dólar, o que compete ao Banco Central. Ou então mexer na distribuição”, afirma o professor universitário.

Em resposta à IstoÉ Dinheiro, a Vibra Energia nega oligopólio e diz que “a margem de distribuição (do preço do combustível) é de cerca de 4%, a menor margem. Não há e nunca houve oligopólio: o mercado é competitivo, com outras grandes distribuidoras”.

Questionado sobre a atuação para reduzir o preço no valor dos combustíveis, o Ministério da Economia disse que “não vai comentar”.

A ANP também declarou que “não tem participação na formação dos preços dos combustíveis e não comenta variações. Tanto refinarias, quanto distribuidoras e postos de combustíveis podem fazer reajustes, sem autorização, nem da ANP, nem de nenhum órgão público. Ou seja, os preços são fixados pelo mercado”, informa a ANP.