O que vale mais: 26 milhões de clientes ou 1,5 milhão de clientes? Para a fundadora do Nubank, Cris Junqueira, a resposta correta é a segunda alternativa. Na sexta-feira (11), o banco digital focado em cartões de crédito e presidido por David Vélez gastou um valor não revelado para comprar 100% das ações da plataforma de investimentos Easynvest. Estimada pelo mercado em algumas centenas de milhões de reais, a aquisição visa permitir ao Nubank diversificar suas atividades para além do segmento de cartões, contas e crédito pessoal, e migrar para o negócio potencialmente mais lucrativo da distribuição de investimentos, a especialidade da Easynvest. Seria possível fazer isso de maneira orgânica, mas o Nubank decidiu ganhar tempo. “Começar do zero ia demorar muito. Adquirir uma plataforma consolidada acelera nossa entrada nesse mercado e nos coloca em uma posição relevante”, disse Junqueira. Já o CEO da Easynvest, Fernando Miranda, afirmou que sua empresa buscava um parceiro que falasse a mesma língua. “Eu vejo que essa parceria permitirá que continuemos nossa história de empoderamento do investidor, só que a níveis muito maiores”, afirmou Miranda.

Amabilidades à parte, a operação evidencia um momento de transição em ambas as atividades. Do lado do Nubank, a estratégia de crescer aceleradamente, oferecendo alguns dos principais produtos dos bancos de varejo para uma base ampla de clientes, estava demorando para se converter em lucro. De acordo com o balanço do primeiro semestre, divulgado no dia 21 de agosto, o faturamento dos seis primeiros meses de 2020 foi de R$ 2,1 bilhões, considerando-se as receitas de intermediação financeira. Apesar de ter crescido 104% em relação ao mesmo período de 2019, o faturamento não foi suficiente para tirar do vermelho a última linha do balanço. Em 2020, o Nubank registrou um prejuízo de R$ 95 milhões no primeiro semestre. Foi melhor do que os R$ 139 milhões de prejuízo na primeira metade de 2019, mas ainda assim não foi capaz de remunerar os acionistas.

Boa parte da explicação desse resultado é a Provisão para Devedores Duvidosos (PDD), a reserva de segurança que o Banco Central (BC) obriga os bancos a manter para fazer frente a eventuais calotes. Em 30 de junho deste ano, o Nubank contabilizava uma carteira de empréstimos de R$ 12,5 bilhões e uma PDD de R$ 1,05 bilhão, ou 8,4%. Em 2019, para a carteira de empréstimos de R$ 12,4 bilhões, a PDD era de 7,4%. Ao entrar em uma atividade de prestação de serviços como a distribuição de investimentos, que não exige capital de referência nem requer provisionamento contra empréstimos problemáticos, o Nubank diversifica suas receitas, sem ter de pressionar o patrimônio dos acionistas.

CORRETAGEM ZERO Para a Easynvest, unificar seus negócios com um parceiro com muitos clientes facilita a competição em um momento de emagrecimento dos ganhos com corretagem e distribuição de investimentos. Para atrair mais clientes e manter os que já estão em casa, as empresas do setor têm se animado a trabalhar “de graça”, isentando a freguesia de gastar com corretagem. Em meados de agosto, a corretora digital Toro Investimentos anunciou que passaria a oferecer corretagem zero para atrair investidores iniciantes e ganhar escala.

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“Essa parceria permitirá que continuemos nossa história de empoderamento do investidor, só que a niveis muito maiores” Fernando Miranda, CEO da Easynvest.

Segundo o CEO, Gabriel Kallas, isso é possível porque a plataforma é totalmente digital e não tem de pagar intermediários, como os agentes autônomos. Mas nem tudo será gratuito. “Ainda ganhamos com a taxa de performance dos fundos, e alguns investimentos serão tarifados se o cliente tiver lucro”, disse Kallas. O movimento chegou à líder do mercado. Na sexta-feira (11), a XP anunciou que os clientes da corretora Rico, que pagavam R$ 7,50 por transação, estariam isentos da tarifa. A XP também reduziu em 75% suas taxas de corretagem. Agora, as operações que não contam com a assessoria de um agente autônomo custam de R$ 2,90 a R$ 4,90. A expectativa é acelerar a captação desses investidores.

Essa agressividade da concorrência justifica as razões que levaram Easynvest e Nubank a unir esforços. Segundo Kallas, da Toro, atualmente pouco mais de 1% da população brasileira investe na Bolsa, abaixo dos 5% em outros países emergentes. “Nosso mercado tem muito a crescer”, disse. E os participantes do mercado estão se preparando para surfar essa onda.

Arte: Revista Dinheiro