A ofensiva do governo contra a importação de automóveis ganhou um novo capítulo na quinta-feira 6. O empresário Sergio Habib, representante da chinesa JAC Motors no País, dispôs-se a antecipar para 2012 a construção de uma fábrica de R$ 900 milhões no polo industrial de Camaçari, na Bahia. Em troca, quer a flexibilização do decreto que estipula um índice mínimo de nacionalização de 65% para isentar da sobretaxa de 30% o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre o valor do veículo, anunciado em setembro. A decisão de Habib, que planejava construir uma fábrica só depois que as vendas  de veículos importados da marca  chegassem a 100 mil unidades por ano (hoje a JAC vende três mil carros por mês), foi a primeira sinalização de que a medida protecionista pode acelerar planos de investimento no setor automobilístico. 

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Toma lá, dá cá: Sergio Habib, da JAC Motors no Brasil, promete fábrica de R$ 900 milhões
no País caso o governo dê condições para investir

“Apresentamos ao governo nossa garantia concreta de construção da fábrica em 2012 e agora aguardamos a contrapartida concreta de que haverá condições para investir”, disse Habib à DINHEIRO na quinta-feira 6, um dia depois de apresentar seus planos para a equipe econômica. “O Ministério do Desenvolvimento está avaliando quais condições serão apresentadas para viabilizar a nova fábrica.” Independentemente das negociações, o interesse explícito da montadorachinesa  de antecipar a construção da fábrica representa um inegável ponto para o governo. Duramente criticado depois do aumento do IPI, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, não se abalou e chegou a comparar a decisão às medidas protecionistas de outros países, como a China e os EUA, que dificultam o acesso a empresas estrangeiras. “Não vamos entregar nosso mercado a preço de banana”, disse Mantega. “Quem quiser vender aqui, venha produzir aqui.” A JAC, ao que tudo indica, acatou a sugestão. 

A nova fábrica da marca chinesa terá 80% de capital nacional – por meio do Grupo SHC, de Sergio Habib – e outros 20% serão da matriz. Essa participação acionária foi definida na última semana, em reunião do empresário brasileiro com executivos da JAC Motors. Em operação, a unidade teria capacidade para montar 100 mil automóveis por ano e gerar 13,5 mil empregos diretos e indiretos. Além da montadora chinesa, o governo espera que o aumento do IPI dos importados estimule outras montadoras a antecipar investimentos. É o caso, por exemplo, da alemã BMW. A companhia, que produz no Brasil apenas motos, em Manaus, anunciará até dezembro se construirá uma fábrica de carros aqui ou se escolherá outro país da América do Sul. “O lugar ainda não está definido, mas será em um mercado consumidor em ascensão e de grande potencial de crescimento”, disse à DINHEIRO o vice-presidente mundial de vendas da BMW, Ian Robertson. 

 

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Fábrica a caminho: a alemã BMW estuda fábrica na América do Sul, mas ainda não revela se o Brasil está na disputa

 

Diante dessas exigências, há poucas opções na América do Sul para a montadora. De janeiro a setembro, a marca vendeu 9,1 mil carros no País, um aumento de 55% sobre o mesmo período de 2010. Mesmo que a BMW decida não fabricar carros no Brasil, só o anúncio de Habib já agrada à equipe econômica do governo, que espera também motivar as montadoras locais a investir em inovação, conforme anunciado no plano Brasil Maio. É quase consenso que a pressão do governo mudará as estratégias das empresas. “O futuro da indústria automobilística, independentemente da questão do IPI, passa pelo aprimoramento de tecnologia local”, disse Cledorvino Bellini, presidente da Fiat e da Anfavea, a associação das fabricantes de automóveis. Já se sabe que como parte das ações para sofisticar a indústria o governo vem desenvolvendo estudos para viabilizar também a cadeia do carro elétrico. 

 

Técnicos do governo afirmam que se trata de um projeto interministerial, que há mais de um ano conta com as pastas da Fazenda, Ciência e Tecnologia, Minas e Energia e Desenvolvimento. Mas tão desafiador para a indústria quanto expandir os investimentos em pesquisa será manter o ritmo de vendas, que desabou 19,7% no mês passado, em comparação a agosto, fechando a marca de 261 mil unidades – a maior queda nas comparações mensais em 2011. A redução seria um reflexo da desaceleração das vendas, e das férias coletivas em várias empresas. “É normal setembro apresentar queda de produção, mas a média é de 9%, não de 20%”, diz Luiz Moan, vice-presidente da Anfavea.