A Receita Federal é a máquina mais eficiente e importante do governo. Até novembro de 2000, o órgão arrecadou em tributos R$ 149,6 bilhões, mas por trás de toda essa eficiência existe uma realidade bem menos nobre, formada por corsários travestidos em funcionários do órgão, especialistas em saquear os contribuintes e desviar recursos do Tesouro Federal. DINHEIRO teve acesso à informações relacionadas a 10 casos de corrupção na Receita Federal ocorridos nos últimos dois anos. Elas causaram o afastamento de pelo menos 16 funcionários em 2000.
O mais recente caso envolvendo funcionários da Receita acontece em Brasília e ainda está sob investigação. Para armar o esquema, a quadrilha está usando um erro cometido pela própria Receita entre os anos de 1994 e 1995. Naquela época, as declarações de pagamento de impostos não vieram com espaços definidos para o PIS e Cofins. Mesmo sem discriminar os valores para os dois impostos, as empresas os incluíam no valor total a ser pago. Agora, de posse desses dados, os fiscais estão tentando convencer empresários a cobrar da Receita a diferença entre o valor pago na época e o valor sem o PIS e Cofins, que não estavam nas declarações. Podem ser pegos a qualquer momento.

? Em Manaus, o fiscal José Francisco dos Santos liberou no ano passado motores de popa sem o pagamento de impostos para um contribuinte de Goiás. Os produtos, no entanto, foram barrados pela Receita no Aeroporto de Brasília. O contribuinte pagou passagem para que o fiscal Santos liberasse a mercadoria com seus colegas. A insistência levantou suspeitas e o funcionário foi afastado.

? No início de 1999, o fiscal Granville Evaristo Castro havia sido destacado para inspecionar a cadeia de Lojas Primavera, de Recife. Depois de dois meses de fiscalização, Castro afirmou à Receita que não havia nada de errado com a empresa. O órgão, no entanto, investigou o caso e descobriu que a empresa não havia apresentado as declarações nos anos de 1992, 1993 e 1994.
l Em Santa Catarina, um contribuinte decidiu entregar voluntariamente à inspetora da Receita no porto de Itajaí, Lícia Costa de Toledo da Rocha, um Honda Civic que importou irregularmente. O carro, no entanto, foi devolvido sem vários componentes. A idéia era arrematar o veículo em leilão e remontá-lo. A inspetora foi afastada do cargo e poderá ser demitida após a conclusão do inquérito na Receita.

? Desde 1998, um grupo de fiscais comandados pelo ex-delegado da Receita em Goiânia, Antonio de Paula Carneiro, entrava no sistema da Receita para descobrir quais os contribuintes que, por erro, tinham pago impostos a mais. Depois transferiam o crédito para seus ?clientes? que, desta forma, não pagavam o que deviam. Era um negócio rentável: o grupo recebia 30% de cada R$ 1.000 de débitos devidos eliminados.

? No final do ano passado, o fiscal Airton Cairo teria aproveitado o período de licença médica para fazer inspeções por conta própria em cidades do interior do Maranhão. Embolsava o dinheiro de multas que aplicava a comerciantes com documentação irregular. Foi afastado.
? No início de 1999, 27 caminhões transportando cigarros e cervejas saíram de São Paulo com destino ao Chuí, no Rio Grande do Sul. O inspetor da Receita naquela cidade, João Luiz Filgueiras, afirmou na época que a caravana passou pela fronteira. A informação foi negada por outros fiscais do local. Os caminhões ficaram no País e os produtos ? que tinham impostos menores por serem exportados ? foram vendidos a preços mais baratos aqui.

? Os fiscais da Receita em Brasília José Müller, Waldir dos Santos Castro e Osias Ferrreira da Silva faziam mudança falsa de mobília dos Estados Unidos para o Brasil. A partir de 1997, os fiscais traziam produtos de informática em caixas onde deveriam estar móveis.

? No Rio de Janeiro, cinco funcionários da Receita ajudaram a contrabandear produtos eletrônicos pela alfândega do Aeroporto Internacional do Rio. A mercadoria era trazida ao Brasil como revistas estrangeiras, imunes à tributação. Os fiscais foram afastados da Receita em abril e uma aposentadoria foi cassada.

? Em Minas Gerais, o técnico da Receita Diane da Cruz Maciel usava os números de CPF de contribuintes, na maioria empregadas domésticas, e criava CPF de empresas fantasmas. Ele mostrava para a Receita que aqueles contribuintes tinham retenção de impostos e, por isso, tinham que receber a quantia de volta. A situação era comprovada pela declaração da empresa fictícia, que havia retido imposto das empregadas domésticas.