Quatro anos depois de sua primeira expedição às profundezas da remota floresta do Vale do Javari, no estado do Amazonas, Dom Phillips e Bruno Pereira se uniram novamente, cada um trabalhando em um grande projeto de defesa da Amazônia.

Em sua viagem de 2018, Pereira, então diretor do programa para tribos isoladas da agência governamental para assuntos indígenas do Brasil (Funai), convidou o jornalista Phillips, então enviado pelo The Guardian, para cobrir uma cansativa expedição de 17 dias na densa floresta tropical.

O objetivo era mapear as terras ocupadas por uma tribo isolada e tentar evitar conflitos com outras etnias. Em sua reportagem, Phillips escreveu com admiração sobre Pereira, com quem manteve uma estreita amizade.

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Na jornada de 2022, Phillips, 57 anos, escrevia um livro sobre a maior floresta tropical do planeta.

Pereira, 41 anos, se afastou da Funai e estabeleceu um programa para ajudar os indígenas a detectar e denunciar invasões de suas terras por madeireiros ilegais, garimpeiros e caçadores.

No dia 2 de junho, eles partiram de barco de Atalaia do Norte, município tranquilo na junção dos rios Itaguaí e Javari, para que Pereira pudesse mostrar seu projeto a Phillips.

Eles planejavam retornar em 5 de junho. A polícia diz que, quando voltavam para a cidade naquele domingo em um pequeno barco, pescadores ilegais atiraram contra eles. Eles foram então enterrados na floresta.

Um app indígena

Pereira se afastou da Funai por discordar dos cortes de programas promovidos quando o presidente Jair Bolsonaro assumiu o cargo em 2019, mas encontrou um novo lar no grupo de direitos indígenas Univaja.

Lá, ele treinou voluntários indígenas para patrulharem o Vale do Javari, inserindo as operações em um aplicativo especialmente criado.

A reserva vive uma onda de invasões de terras e outras ameaças, em um momento em que inúmeros estudos afirmam que a administração de suas terras pelos indígenas é fundamental para proteger a Amazônia, recurso vital na luta contra as mudanças climáticas.

O projeto rendeu ameaças de morte a Pereira. “Com o aplicativo, eles mapearam toda a cena do crime e estavam preparando um relatório para mostrar às autoridades”, disse a jornalista brasileira-americana Monica Yanakiew, da Al Jazeera English, que acompanhou Pereira em uma viagem semelhante em dezembro.

‘Como salvar a Amazônia’

Phillips, um dos correspondentes estrangeiros mais respeitados do Brasil, suspendeu suas atividades no ano passado quando recebeu apoio da prestigiosa fundação Alicia Patterson para se dedicar a seu livro sobre práticas de proteção à floresta tropical.

Seu título provisório era ‘How to save the Amazon’ (‘Como salvar a Amazônia’).

Seus amigos dizem que Phillips gostou muito de escrever o livro e estão procurando maneiras de terminá-lo e publicá-lo.

“Tenho certeza de que Dom gostaria que alguns pontos positivos fossem extraídos da tragédia”, disse o ex-correspondente estrangeiro escocês Andrew Downie.

“Se há algo de positivo nisso, é que pode ser que as pessoas agora estejam olhando para a Amazônia agora.”