Produtos vêm, vão e se tornam obsoletos em um período de tempo cada vez mais curto. As tecnologias mudam rapidamente. Em uma empresa de 130 anos como a Philips, esses ciclos de transformação são constantes. Mas eles nunca foram tão desafiadores como agora. A empresa fundada em 1831, em Eindhoven, na Holanda, tem acompanhado essa dinâmica e alterado de maneira veloz sua visão de negócio com olhar para o futuro. Quando Frans van Houten assumiu o cargo de CEO global em abril de 2011, determinou que a companhia voltasse seu foco totalmente para a área de saúde. As linhas de televisores, iluminação, eletroportáteis e acessórios para casa, que fizeram a fama da marca nas últimas décadas, foram vendidas, ficando apenas alguns contratos de licenciamento. Até 2016 a Philips dedicou-se ao hardware, em equipamentos de ressonâncias, tomografia, ultrassonografia e monitores voltados para a área médica. E nos últimos dois anos acelerou o processo de mudança da chavinha, agora de hardware para software. Nesse período, fez cerca de 20 aquisições de empresas desse segmento. E, no Brasil, pilar da estratégia global, pretende dobrar o número de especialistas – de 800 para 1,6 mil –, até 2023, no Centro de Desenvolvimento e Operações de Software em Blumenau, que funciona como hub para a América Latina. “A Era já foi de indústria e agora é de serviço. Estamos migrando para SaaS [Software as a Service] e ter uma relação de longo prazo com osclientes”, afirmou Patricia Frossard, presidente da Philips no Brasil. “Para isso, não consigo vender mais caixa. Quando falamos em colocar software, é o coração da instituição. É mais do que casamento, é um filho. Porque casamento pode haver o divórcio, o filho é para sempre.”

A mudança na principal linha de negócio visa alterar a fonte de receita e, assim, tornar as finanças da companhia sustentáveis. Enquanto as vendas de equipamentos garantem grande receita em curto prazo, os contratos de software garantem vendas robustas e recorrentes. Em 2020, a Philips faturou 19,5 bilhões de euros, com lucro líquido de 1,195 bilhão de euros. O segmento de maior fatia no faturamento está na divisão de diagnóstico e tratamento, com 8,175 bilhões de euros, que correspondem a 41,8% da receita total. Os ganhos com softwares estão nessa divisão e estão na casa de 20% do geral faturado. A expectativa é de que, com os investimentos no segmento, o faturamento com softwares ultrapasse metade do revenue em cinco anos.

O Brasil tem grande contribuição nesse processo. É por aqui que o principal software de gestão da Philips, o Tasy, é desenvolvido e aprimorado. A ferramenta entrou no portfólio da empresa a partir da compra da empresa catarinense Wheb Sistemas, em 2011. Passa por aprimoramento constante, com inclusão de soluções e atualizações. Hoje roda em 1,3 mil clientes no País e está sendo comercializado em países como Alemanha, Japão e República Dominicana. “É um movimento global da companhia e na área de gestão hospitalar o Brasil é protagonista”, disse Patricia Frossard.

Com a introdução do software dedicado à administração de hospitais, a tecnologia passa a agir no coração das unidades de saúde. A solução é mais do que um prontuário eletrônico. Além de ser utilizada pelos médicos nas consultas e armazenar o histórico do paciente, ela organiza os suprimentos de farmácia, no faturamento e gera insights a partir da análise de dados para os gestores tomarem melhores decisões. “Com melhor gestão, tem menos desperdícios e, consequentemente, menos custos”, afirmou a executiva da Philips, ao destacar que a facilidade do uso pelo médico é essencial para o sucesso do programa. “Se não ele continua usando planilha do Excel.”

AGILIDADE E INTELIGÊNCIA Softwares de análises de imagens da empresa holandesa têm auxiliado profissionais a produzir diagnósticos mais precisos, com mais eficiência operacional. (Crédito:Divulgação)

Na ponta do processo, o atendimento ao paciente é aperfeiçoado. E o momento que passamos com a pandemia de Covid-19 tornou exponencial a visão das pessoas para sua saúde, em um movimento que joga a favor do plano da Philips, segundo Rafael Kenji, CEO da Feluma Ventures, uma corporate venture builder que desenvolve soluções inovadoras voltadas para as áreas de saúde e educação. “A medicina baseada no valor, com o paciente no foco do cuidado, se mostrou vantajosa não apenas para o paciente, que tem um acompanhamento de melhor qualidade, mas também para hospitais e unidades de saúde, já que diminui gastos e melhora processos.” O especialista cita ainda que, com a melhoria da experiência do paciente, o aumento da qualidade dos serviços e a redução dos custos, é atingido o chamado Triple Aim, modelo integrado de saúde criado pelo Institute for Healthcare Improvement, dos

Estados Unidos. “Com essa evolução em equipamentos e tecnologia, é possível ter imagens cada vez mais reais e detalhadas, além de uma análise de dados de forma mais rápida e segura.”

É o que buscou o Grupo H. Olhos, de São Paulo, ao adotar a solução Philips Tasy, por meio da Digisystem, para gerenciamento de processos, prontuário eletrônico e integração entre as áreas da empresa. A ferramenta permite à instituição centralizar e conectar todos os pontos de cuidado com os pacientes, agilizar diagnósticos, diminuir – ou até eliminar – erros humanos e aprimorar suas atividades financeiras e administrativas.

A utilização de software em hospitais tem aberto um campo importante para a Philips. Os clientes têm entrado em um ciclo virtuoso com a melhoria da gestão, pois começam a ter ambição por fazer projetos maiores, que muitas vezes estavam encostados por falta de verba ou por falta de organização. É nesse ambiente que o uso de inteligência artificial tem avançado, principalmente no campo de diagnósticos inteligentes. A solução da companhia holandesa lançada recentemente é o Digital Pathology Suite, que aumenta a confiança no diagnóstico e agiliza fluxos de trabalho de laboratórios. Scanners de slides cruzam informações das imagens dos exames e apontam com maior precisão o diagnóstico, que obviamente tem última análise de um profissional de medicina.

A Philips, por meio de sua fundação, foi parceira do Rally dos Sertões deste ano, em que colocou em prática seus serviços, tanto de hardware – que não vão sair do portfólio da companhia holandesa, como os produtos de áudio, vídeo e eletrodomésticos – quanto de software. Enquanto os carros, motos, quadriciclos e UTVs desbravavam os terrenos inóspitos das cidades do interior de Goiás, Ceará e Maranhão, no mês de agosto, equipes médicas realizavam consultas e exames nas comunidades carentes das localidades. A empresa doou monitores fetais e maternos, cardiógrafos, monitor de sinais vitais e ultrassons portáteis. A instituição também ofereceu um novo software que permitiu identificar riscos no pré-natal, receber assistência diagnóstica à distância e avaliar o progresso das pacientes. A solução estava conectada ao ultrassom móvel, que funciona em uma mochila com uma bateria a luz solar, o que garantiu mobilidade ao profissional de saúde e facilitou o encontro com as mulheres grávidas em lugares de difícil acesso. Houve ainda atendimentos por meio de plataforma de telemedicina.

AMPLIAÇÃO O centro de desenvolvimento de softwares de Blumenau (SC) da Philips vai dobrar de tamanho, passando dos atuais 800 engenherios para 1,6 mil profissionais. (Crédito:Divulgação)

PÚBLICO Com uma estrada asfaltada para acelerar rumo a potenciais clientes das redes privadas de saúde, o desafio da Philips é avançar em contratos com o setor público. “Existem tecnologias acessíveis que melhoram o atendimento ao paciente e trazem ganho de eficiência e produtividade para o governo também”, afirmou Patricia Frossard. “Existe vontade política, mas precisamos de celeridade dobrada.”

Um dos projetos que a Philips implantou junto ao poder público no Brasil foi na Bahia, desde 2015, por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) em que também participaram as empresas Alliar e Fidi. Doze unidades de diagnóstico de saúde do estado receberam equipamentos e software para realizar e gerir serviços de exames de radiologia, mamografia, tomografia e ressonância magnética. Apenas no primeiro ano foram realizados 183 mil exames, um aumento de 44% de aumento na capacidade em relação ao ano período anterior. “Estamos em contado com autoridades pra replicar esse projeto em outros estados”, disse a presidente da operação brasileira da Philips.

São projetos e soluções para redes públicas e privadas que vão ao encontro dos resultados do relatório Future Health Index 2021, realizado pela Philips sobre o cenário de digitalização do setor de saúde no Brasil. Segundo o estudo, 84% dos principais líderes do segmento investem em registros eletrônicos e 61% em telemedicina. Outro insight importante aponta que 60% gostariam que a inteligência artificial fosse implementada em suas instituições para maior eficiência e integração de diagnósticos. Entre as tendências, espera-se aumento no atendimento domiciliar nos próximos três anos. São pilares que norteiam a Philips em seu novo caminho iluminado, agora não por lâmpadas, mas por tecnologia.