Um relatório da Polícia Federal baseado em interceptações telefônicas conclui que há indícios de um esquema de contratação de servidores fantasmas que repassariam parte de seus salários para deputados estaduais e assessores da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

As informações estão em um documento produzido pelo grupo de trabalho da PF responsável pelos casos relacionados à Lava Jato e foi anexado à Operação Furna da Onça – que apura o suposto envolvimento de parlamentares fluminenses com corrupção e loteamento de cargos públicos.

A investigação, batizada pela PF de “Senhores Feudais”, aponta para uma suposta atuação do servidor Jorge Luis de Oliveira Fernandes, responsável pelo setor do “preparo de pagamentos” da Casa, na “coordenação de nomeações fraudulentas” para cargos comissionados na Alerj. Ele é um dos citados no relatório do Conselho de Controle de Atividade Financeira (Coaf) que mostra funcionários e ex-funcionários da Casa com movimentações financeiras incompatíveis com suas capacidades financeiras.

O jornal O Estado de S. Paulo revelou que o órgão encontrou movimentação considerada atípica de R$ 1,2 milhão na conta do policial militar Fabrício de Queiroz, ex-assessor do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL). Um cruzamento de dados mostra que mais da metade dos depósitos em espécie recebidos por Queiroz em 2016 ocorreu no dia do pagamento de funcionários da Assembleia ou em até três dias úteis depois.

Assim como Queiroz, o servidor Jorge Fernandes apareceu no documento produzido pelo Coaf por causa de transações suspeitas de R$ 845 mil em um ano e por ter um fluxo padrão de recebimentos em sua conta proveniente de outros funcionários da Alerj.

O relatório sobre a atuação de Fernandes foi feito a pedido da delegada da operação Furna da Onça, Xênia Ribeiro Soares, e trata apenas de parte da documentação recolhida na investigação. Até o momento, segundo a PF, foi possível mapear a atuação de Fernandes na nomeação de funcionários atrelados aos deputados Coronel Jairo (preso na Furna da Onça), Jair Bittencourt, Gilberto Palmares e Márcio Pacheco. Entretanto, segundo a delegada do caso, a nomeação de funcionários fantasmas e posterior devolução de parte dos salários seria “uma prática criminosa disseminada na Alerj”.

Função

O documento de 30 páginas explica a função de Fernandes em “arregimentar pessoas”, sendo que a remuneração de cada cargo seria repartida, segundo a PF, entre os envolvidos no esquema, inclusive o deputado que sedia a vaga no gabinete. Nas interceptações telefônicas feitas pela PF, o servidor explica aos fantasmas como devolver parte até da restituição do imposto de renda dos funcionários.

Em uma delas, um funcionário de nome “Lerri” diz que ligou para Fernandes para “dar uma satisfação” que “bateu” R$ 4 mil em sua conta e que o dinheiro não é seu. Após isso, Fernandes afirma que ele deve repassar R$ 1.500 e que isso “foi um esquema que o contador fez”. Ao ouvir esta resposta, Lerri avisa a Fernandes que ele pode ir buscar o dinheiro, mas recebe a orientação de transferir a quantia para a conta do “contador”. “Mil e quinhentos e o restante é seu, tá bom?”, diz ele.

‘Pratinha’

Em outra conversa, desta vez com uma pessoa indentificada como “Rômulo”, Fernandes negocia um repasse de R$ 200 porque o cargo da pessoa “é baixo”.

“Tipo assim, vamos dizer que vai perder uma semana do cargo, vai tipo R$ 250, R$ 300, porque o cargo que eu vou dar a ela é baixo, aí dá até para fazer isso. Ela vai perder essa pratinha, entendeu? Mas aí ela já está dentro do esquema”, afirma o servidor, na gravação feita pelos agentes da Polícia Federal.

A reportagem não conseguiu contato com o gabinete do coronel Jairo na Alerj. O deputado está preso pela operação Furna da Onça. A assessoria de imprensa da Alerj informou que não comentará o caso de Fernandes – que foi exonerado da Alerj por uma determinação judicial do TRF2. Procurado para comentar o caso, Fernandes também não foi encontrado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.