Novos suspeitos são investigados pelo transporte e ocultação dos corpos de Pereira e Phillips, segundo polícia. Servidores da Funai anunciam greve, e Augusto Aras visita unidade do MPF responsável por apuração do crime.A Polícia Federal (PF) afirmou neste domingo (19/07) ter identificado mais cinco suspeitos de terem participado do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips na Amazônia.

Além dos cinco novos suspeitos, três pessoas já foram presas até o momento em conexão com as investigações. O primeiro foi o pescador Amarildo da Costa Oliveira, conhecido como Pelado, que confessou ter cometido o crime e acompanhou agentes até o local onde os corpos foram encontrados. Também foram presos o seu irmão, Oseney de Oliveira, conhecido como Dos Santos, e Jeferson da Silva Lima, conhecido como Pelado da Dinha. Todos tiveram a prisão temporária de 30 dias decretada pela Justiça do Amazonas.

A Polícia Civil de Atalaia do Norte, cidade ribeirinha onde Pereira e Phillips iniciaram sua última viagem pela Amazônia, afirmou que os cinco novos suspeitos são investigados pelo suposto envolvimento no transporte e ocultação dos corpos no dia seguinte ao assassinato.

Em um comunicado, a PF disse que as investigações continuavam, com o objetivo de “esclarecer todas as circunstâncias, os motivos e os envolvidos no caso”. Seguem as buscas pelo barco que era utilizado por Pereira e Phillips, que teria sido afundado por Amarildo da Costa Oliveira após o crime.

Uma autoridade policial afirmou ao jornal inglês The Guardian que considera as investigações “90% completas”, e que os cinco novos suspeitos eram parentes dos dois irmãos presos.

Neste domingo, servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) anunciaram que vão iniciar uma greve na próxima quinta-feira, pela responsabilização de todos os culpados pelos assassinatos e pela saída imediata do presidente da Funai, Marcelo Augusto Xavier da Silva, que segundo a associação de servidores INA (Indigenistas Associados) estaria “promovendo uma gestão anti-indígena e anti-indigenista na instituição”.

Também neste domingo, o procurador-geral da República, Augusto Aras, viajou para Tabatinga, no Amazonas, para acompanhar os desdobramentos do caso. Os procuradores lotados naquela unidade são responsáveis pela área de Atalaia do Norte e região.

Corpos identificados

No sábado, a PF informou ter identificado o corpo de Pereira, por meio de exame da arcada dentária por peritos do Instituto Nacional de Criminalística em Brasília. Os restos mortais do jornalista britânico Dom Phillips já haviam sido identificados na sexta-feira, também por meio de exame da arcada dentária.

Em nota, a PF afirmou que Pereira e Phillips foram mortos por tiros. O indigenista foi atingido três vezes, na cabeça e no tórax, e o jornalista uma vez, no tórax. Em ambos os casos, foi utilizada munição típica de caça, segundo a PF.

A morte de Pereira “foi causada por traumatismo toracoabdominal e craniano por disparos de arma de fogo com munição típica de caça, com múltiplos balins, que ocasionaram lesões sediadas no tórax/abdômen (2 tiros) e face/crânio (1 tiro)”, e a morte de Phillips “foi causada por traumatismo toracoabdominal por disparo de arma de fogo com munição típica de caça, com múltiplos balins, ocasionando lesões principalmente sediadas na região abdominal e torácica (1 tiro)”, informou a PF.

A corporação afirmou que os peritos do Instituto Nacional de Criminalística farão nos próximos dias novos exames “de Genética Forense, Antropologia Forense e métodos complementares de Medicina Legal, para identificação completa dos remanescentes e compreensão da dinâmica dos eventos”.

Investigação

Na sexta-feira, a PF informou que a investigação sobre os assassinatos não encontrou indícios de ter havido um mandante ou organização criminosa por trás das mortes, mas que as diligências continuavam.

A União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) discordou da conclusão da PF. Segundo a entidade, foram repassadas à polícia informações sobre organizações criminosas que estariam atuando na região e que poderiam estar ligadas às mortes. No documento, a Univaja solicita que as investigações continuem e que nenhuma hipótese seja descartada.

“Exigimos a continuidade e o aprofundamento das investigações. Exigimos que a PF considere as informações qualificadas que já repassamos a eles em nossos ofícios. Só assim teremos a oportunidade de viver em paz novamente em nosso território, o Vale do Javari”, afirmou a entidade.

Bruno Pereira fazia parte da Univaja e, segundo a entidade, era alvo de ameaças constantes de madeireiros, garimpeiros e pescadores da região.

Dom Phillips e Bruno Pereira tinham sido vistos pela última vez em 5 de junho, enquanto viajavam pelo Vale do Javari, uma região remota do estado do Amazonas palco de conflitos entre indígenas e invasores de terras.

Phillips e Pereira

Jornalista veterano e colaborador do The Guardian, Phillips tinha 57 anos e vivia no Brasil há 15 anos. Ao longo da sua carreira, ele também escreveu para vários outros veículos internacionais, incluindo Financial Times, New York Times e Washington Post, além de ter produzido reportagens para o serviço em inglês da Deutsche Welle (DW).

Antes de desaparecer, Phillips trabalhava num livro sobre preservação da Amazônia, com apoio da Fundação Alicia Patterson, que lhe concedeu uma bolsa de um ano para reportagens ambientais, que durou até janeiro. Phillips deixa uma viúva, Alessandra, que nos últimos dias divulgou diversos apelos para que as autoridades se empenhassem mais pela busca dos desaparecidos.

Pereira era considerado por organizações ambientais e indígenas um dos funcionários mais experientes da Fundação Nacional do Índio (Funai) que atuava na região do Vale do Javari. Em 2018, ele se tornou o coordenador-geral de Índios Isolados e de Recém Contatados da Funai, mas acabou exonerado do cargo em outubro de 2019, após pressão de setores ruralistas.

bl (ots)