Uma das poucas piadas publicáveis sobre a nova troca de comando na Petrobras diz que, dado o histórico recente, é adequado que o indicado se chame Caio. Ironias à parte, o fato de o Conselho de Administração da estatal ter de analisar o terceiro presidente em pouco mais de um ano ­– processo que promete não ser tão fácil como previa Jair Bolsonaro – evidencia um problema grave. Há um divórcio permanentemente litigioso entre a gestão da empresa, seu controlador (o governo) e os milhões de consumidores que dependem de seus produtos. Sem falar, claro, das centenas de milhares de acionistas no Brasil e no exterior. A Petrobras precisa resolver a contradição de preservar suas margens de lucro e, ao mesmo tempo, manter controlados os preços dos combustíveis – algo estratégico em um país onde 78% das cargas circulam pelo transporte rodoviário. Sem apresentar soluções, Bolsonaro reproduz na estatal o comportamento que adota no governo. Um permanente voo cego, em que as decisões tem alto potencial de provocar tumulto e probabilidade zero de resolver qualquer problema.

É enorme a tentação de usar a maior empresa brasileira, que faturou R$ 452 bilhões em 2021, como ferramenta de política econômica. A descrição de cargo do presidente da estatal sempre foi muito além do petróleo. Passou pela atração de capital externo no governo de José Sarney e pela tentativa de conter a inflação na gestão de Dilma Rousseff. Isso até Michel Temer buscar colocar ordem na bagunça. Em 2016, ele conseguiu aprovar a Lei das Estatais, que passou a exigir qualificações mínimas para os indicados para os cargos de diretoria. A Petrobras também alterou seu Estatuto de modo a proibir que os gestores façam investimentos ou negócios que provoquem prejuízo. E estabeleceu a polêmica política de Paridade de Preços Internacional (PPI), que vincula o valor pago na bomba aos solavancos do mercado externo.

Isso azedou de vez a relação entre a petrolífera e Bolsonaro. Quando percebeu que não poderia usar a estatal como instrumento, ele passou a chacoalhar as coisas para criar uma sensação de movimento, já que não é possível sair do lugar. A indicação de Caio Mario de Andrade para substituir José Mauro Coelho, que estava no cargo há 40 dias, agitou os mercados, acendeu alertas sobre congelamentos dos preços e greve de caminhoneiros. Mesmo assim, os rompantes do presidente, que chamou o lucro da estatal de “estupro”, não devem passar de chilique.

Mauro Pimentel l Alaor Filho l Divulgação

Político calejado, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, já acendeu a caldeira da panela de panos quentes. Ele colocou a chacoalhada presidencial no contexto da chegada de Adolfo Sachsida ao Ministério de Minas e Energia. “A mudança era esperada. A gestão da Petrobras é independente, mas tem que estar alinhada com o novo ministro”, disse. Nogueira passou para o Conselho a batata quente de encontrar uma solução para a alta dos preços, embora não fosse necessário decapitar Coelho para isso.

Uma das soluções possíveis seria aproveitar as oscilações naturais das cotações. Quando os preços caen, a petrolífera cobra um pouco mais caro e guarda os lucros. Nos tempos de alta, o dinheiro armazenado subsidia os consumidores. É o que a Petrogal, congênere lusitana da Petrobras, vem fazendo desde a crise de 2009. Em novembro de 2021, o general Joaquim Silva e Luna, antecessor de Coelho, sugeriu montar um fundo de compensações com os R$ 33 bilhões em dividendos que o governo teria direito de receber naquele ano. A resposta do Ministério da Economia foi um “não” retumbante o suficiente para ser ouvido pelas jazidas do pré-sal. O dinheiro já tinha destino.

MINISTRO EM RISCO Para complicar, a cabeça de Sachsida não está longe da guilhotina. Bolsonaro se encontrou com o novo ministro na manhã de quarta-feira (25) e foi direto: “se o preço dos combustíveis não baixar, não tenho problema em trocar de ministro de novo”, informaram fontes próximas ao presidente. O mesmo vale para Andrade. A aliados no Congresso, Bolsonaro confirmou que não deixaria “um dos volantes da eleição nas mãos de burocratas da empresa”. Não há muito o que fazer no curto prazo. O ex-secretário do Planejamento do Estado de São Paulo, Lúcio Marques Albanês Filho diz que Bolsonaro faz pouco. “Cadê o fundo de amortecimento dos combustíveis? O subsídio para produtores e importadores? O auxílio diesel? Tudo isso derruba o preço sem mexer na paridade. Mas nada disso ele quer fazer.” Quando o presidente se preocupa mais com o movimento do que com as ações é grande o risco de que suas decisões não surtam efeito algum. Ainda que Coelho de fato caia, seu sucessor pode ser outro que não Caio.