A mais recente estimativa de crescimento para o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil para este ano indica uma pífia alta de 0,80%, ainda menor do que a previsão anterior, de 0,83%. Com a guerra comercial entre Estados Unidos e China cada vez mais acirrada, a economia mundial cambaleando e as declarações e atitudes atabalhoadas do presidente Bolsonaro, a tendência segue negativa para o País. Mas há, ao menos, um estado brasileiro que resiste às intempéries políticas e econômicas e segue crescendo a um ritmo admirável. Em Pernambuco, a economia vai muito bem, obrigado.

No primeiro trimestre deste ano, o PIB do estado teve alta de 1,2%, em relação ao mesmo período de 2018, o que representa um crescimento 140% maior do que o registrado pelo Brasil, com alta de 0,5%. Em 2018, os pernambucanos celebraram alta de 1,9% no PIB – quase o dobro do nacional, que foi de 1,1% –, alcançando R$ 183 bilhões. Para este ano, o cenário deve ser praticamente o mesmo, com as previsões indicando alta de 1,4% na economia estadual, ante os já citados inexpressivos 0,80% do PIB brasileiro. E os cofres oficiais de Pernambuco devem seguir engordando.

Para os próximos 3 anos, já estão acertados investimentos de quase R$ 13 bilhões, vindos dos mais diversos setores. Um dos fatores que explicam a pujança da economia local é justamente a diversidade de segmentos em expansão. Na terra de Gilberto Freyre e Lampião, há grandes operações da indústria automobilística, do setor de bebidas e alimentos (BRFood, Ambev, Itaipava), de refinaria de petróleo, de confecções (que gera 150 mil empregos diretos), de petroquímica, da produção de resinas PET (com a presença da Indorama, companhia tailandesa e uma das líderes mundiais), de hospitais, de energia solar e do agronegócio, incluindo o maior exportador de mangas do Brasil. Nada disso seria possível, porém, se o governo não tivesse combatido três dos maiores problemas da economia brasileira: a burocracia, a falta de transparência e a ausência de mão-de-obra capacitada. “Tem sido um trabalho complexo, mas que está gerando ótimos resultados para o nosso estado”, diz o governador de Pernambuco, o economista Paulo Câmara, 47 anos (leia entrevista ao final da reportagem).

Dos R$ 13 bilhões que vão engordar a economia do estado nos próximos anos, R$ 7,5 bi virão de uma única empresa, a Fiat Chrysler Automóveis (FCA). Na sua fábrica em Goiana, a 60 quilômetros do Recife, a montadora produz três dos seus principais modelos, o Fiat Toro e os dois Jeep: Renegade e Compass. Inaugurada há pouco mais de 4 anos, a planta custou R$ 11 bilhões – incluindo construção, instalação e equipamentos – e gerou 15 mil empregos na região, entre funcionários da própria FCA e fornecedores. “Das mais de 100 fábricas que temos espalhadas pelo mundo, a de Pernambuco é a mais moderna e tecnológica”, afirma o presidente da FCA na América Latina, o italiano Antonio Filosa, 46 anos. Agora, Filosa anuncia o investimento de mais R$ 7,5 bilhões na operação em Pernambuco, para modernizar ainda mais a fábrica e produzir um novo modelo Jeep, que será um SUV premium. “A confiança e o diálogo que temos com o governo são fundamentais para tomarmos esse tipo de decisão. Assim como a agilidade e a burocracia reduzida”, destaca Filosa.

Roberto de Abreu e Lima, CEO da Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (Addiper): “Procuramos agilizar e facilitar o trabalho das empresas e, com isso, gerar renda e empregos para o estado” (Crédito:Heudes Regis/SEI)

Outro investimento que já está saindo do papel é o Recife Outlet Premium, o primeiro do estado e terceiro de todo o Nordeste – os outros ficam em Salvador e em Fortaleza. Com previsão para ser inaugurado em setembro de 2020, o empreendimento ocupará 30 mil metros quadrados de Área Bruta Locável (ABL), em duas etapas, tornando-se o maior outlet do Nordeste. Entre as marcas com presença garantida, estão Calvin Klein, McDonald’s, New Balance, Tommy Hilfiger e Outback. À frente do negócio está o empresário Paulo Perez, 55, presidente do Grupo BCI, que também atua nas áreas de importação e exportação de combustíveis e na fabricação de motos. Para erguer o Recife Outlet Premium, ele vai investir, ao todo, R$ 60 milhões, num empreendimento que deve gerar 2 mil empregos diretos. “O empenho do governo em atender às nossas demandas, sem relaxar no cumprimento da legislação, foi imprescindível para o negócio”, diz Perez. “Apenas 40 dias após o lançamento do projeto, as obras já estavam sendo iniciadas, com todas as licenças ambientais devidamente atendidas”.

Os elogios feitos por executivos e empresários a Pernambuco são resultado de diversas iniciativas adotadas pelo governo. Tudo devidamente planejado. Coisas como incentivos fiscais, combate à burocracia, capacitação de mão-de-obra e atração de fornecedores fazem parte do Programa de Desenvolvimento Econômico (Prodepe) criado pelo estado. “Realizamos estudos detalhados, com o objetivo de identificar deficiências no processo e suas respectivas soluções. Tudo para agilizar e facilitar o trabalho das empresas e, com isso, gerar renda e empregos”, diz Roberto de Abreu e Lima, CEO da Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (AdDiper), que responde diretamente ao governador. Um dos exemplos mais eloquentes desse trabalho diz respeito à burocracia. Antes, o processo para uma empresa receber a licença de operação levava até 145 dias. Por meio de convênios com prefeituras, Receita Federal e juntas comerciais, esse prazo foi reduzido para impressionantes 2 dias.

A própria equipe da AdDiper é um bom retrato da atenção que o estado dedica à agência. Muitos dos seus profissionais têm formação técnica em instituições renomadas, como o Banco Mundial, e falam até três ou quatro idiomas, entre eles, o mandarim. “No mundo globalizado e ágil em que vivemos, esse tipo de capacitação faz muita diferença”, observa Abreu e Lima. Outro ponto que conta a favor é o fato de o próprio governador participar de algumas reuniões com industriais, empresários e possíveis investidores. “Quando o presidente ou o dono de uma grande companhia vê que o chefe do estado está realmente disposto a colaborar, tudo fica muito mais favorável, a ambos os lados”.

Em alta: o crescimento da avicultura deu emprego a Jefferson da Silva (à esq.) e lançou novos produtos, como o ovo engarrafado (Crédito:Divulgação e Heudes Regis/SEI)

O DESAFIO DA FALTA D’ÁGUA Mesmo com a economia dando exemplo ao resto do País, Pernambuco ainda sofre com um antigo problema: a falta d’água, produto imprescindível para qualquer tipo de indústria. Diferentemente do que se imagina, o sertão não é a região mais seca do estado. Esse título cabe ao agreste. Para se ter ideia, até hoje há municípios do agreste pernambucano que recebem abastecimento d’água por um dia e ficam até dez dias na seca. Com o objetivo de resolver – ou ao menos reduzir – esse problema, o governo tomou para si o desafio de levar água à região, para aplacar a sede do povo e atrair investimentos. “Nenhuma empresa vai se estabelecer num lugar que não tenha água.

Além disso, as pessoas não suportam mais viver desse jeito”, destaca o governador Paulo Câmara. “Precisamos acabar com esse problema, o quanto antes”. Para isso, está atualmente em andamento um projeto que surgiu de um acordo com a Paraíba e que consiste na construção de uma adutora que levará água do rio São Francisco, do lado paraibano, para Pernambuco. Em troca, parte dessa água será devolvida, já devidamente tratada e apta ao consumo humano, para municípios da Paraíba. Outra etapa desse mesmo projeto é atrair a indústria têxtil – muito forte no interior de Pernambuco e que não sobrevive sem água – para o agreste, gerando renda e empregos.

Caso exatamente oposto ao do agreste, mas igualmente merecedor de destaque, observa-se na Zona da Mata Sul do estado. Na região, um dos problemas era justamente o excesso de água. Não raro, chuvas em volumes acima do esperado causavam enchentes e prejuízos aos municípios. A partir de estudos técnicos, o governo construiu, há 2 anos, uma barragem de contenção e uma adutora na cidade de Palmares, a cerca de 120 quilômetros do Recife. Assim, a água da chuva é represada na barragem e levada, por meio da adutora, a municípios da região com forte presença da indústria têxtil. “Precisamos trabalhar com o que temos em mãos, usando nossos recursos da melhor forma possível”, declara Abreu e Lima. Todo esse trabalho já surtiu efeitos práticos. A empresa mineira Nova Fiação acertou a construção de uma fábrica de roupas na região. Com inauguração prevista para fevereiro do ano que vem, o empreendimento vai derramar R$ 100 milhões na economia pernambucana e gerar mais de 500 empregos diretos. Assim, Pernambuco segue crescendo e atraindo investidores.

Agilidade: apenas 40 dias após lançar o projeto do primeiro outlet do Recife, um investimento de R$ 60 milhões, o empresário Paulo Perez já estava iniciando as obras (Crédito:Heudes Regis/SEI)

Outra forma de fazer isso é o que o governo batizou de “Match Day”, que nada mais é do que a tradução literal do termo, algo como “Dia da Combinação”. Nesses eventos, representantes do estado se reúnem com executivos de grandes empresas para discutir e elaborar projetos. Este ano, já foram realizados dois Match Days, ambos em São Paulo “Dependendo da magnitude dos negócios que podem ser fechados, o próprio governador marca presença”, conta Abreu e Lima. Algumas vezes, o encontro serve para aproximar companhias que já atuam em Pernambuco e que podem trabalhar juntas. Foi o que aconteceu no evento de maio, no qual representantes de mais de 40 empresas do setor automobilístico trocaram ideias com executivos da FCA, para entenderem as demandas da montadora e, a partir disso, oferecerem seus serviços e produtos.

Dessa reunião, resultou, entre outras, uma oportuna parceria entre a FCA e a Jodarc, empresa de confecção de uniformes sediada em Caruaru, interior do estado. Graças a essa articulação, agora todos os uniformes dos funcionários da FCA no Brasil são fabricados pela Jodarc. “Esse tipo de ação gera riqueza para empresas do nosso estado e, consequentemente, mais empregos”, ressalta Abreu e Lima. “Temos orgulho em saber que estamos contribuindo também socialmente com o povo pernambucano”, acrescenta Filosa, da FCA. O fato é que, até o final deste ano, empresas instaladas em Pernambuco irão fornecer mais de R$ 4 bilhões à FCA, em produtos e serviços.

TRADIÇÃO E INOVAÇÃO E as boas notícias no estado seguem num ritmo mais intenso do que as ondas da praia de Boa Viagem. Ainda este ano, entrará em operação uma fábrica de comprimidos da Aché, uma das maiores companhias farmacêuticas do País, com receita líquida de R$ 3,2 bilhões no ano passado. Localizada no município de Cabo de Santo Agostinho, na Região Metropolitana do Recife, a fábrica demandou investimentos de R$ 660 milhões e vai gerar cerca de 3 mil empregos diretos e indiretos, dos quais 80% serão de mão-de-obra pernambucana. Na planta, serão fabricados medicamentos a ser vendidos no Brasil e exportados. “Com certeza, será um grande modelo de produção de remédios no País”, afirma o governador. “Temos sempre dois objetivos em mente: aquecer a economia do estado e gerar emprego para o nosso povo”, diz Câmara.

No sertão: o Complexo Fontes é o primeiro parque híbrido do Brasil, gerando energia solar e eólica (Crédito:Divulgação)

Exemplo vivo disso é Jefferson Alexandre da Silva, 24 anos. Desempregado desde 2017, ele foi contratado há 1 mês pela Avimalta, empresa que é uma das maiores produtoras de ovos do estado, com produção de 330 mil unidades por dia e cerca de 100 funcionários. “Com a crise, eu tive muita dificuldade para encontrar trabalho. Felizmente, surgiu essa oportunidade e eu fui selecionado”, conta Jefferson, que trabalha na coleta dos ovos. A vaga que ele tanto buscava só apareceu porque a empresa cresceu. De 2016 a 2018, o faturamento da Avimalta, que não revela números, aumentou cerca de 10% por ano.

Graças a isso, a empresa resolveu investir R$ 3 milhões na automatização da coleta de ovos. Novamente, a confiança no estado foi fator preponderante na tomada de decisão. “O governo exige que cumpramos todas as regras, mas, por outro lado, nos ajuda e passa confiança”, diz Giulliano Malta, 46, dono da Avimalta. Um dos incentivos do estado ao setor foi a inclusão de ovos na merenda escolar, além de garantir o abastecimento de água em períodos críticos. Assim, a avicultura pernambucana passou de quinto para quarto lugar no ranking nacional, produzindo 11 milhões de ovos por dia e gerando cerca de 150 mil empregos diretos e indiretos.

E para mostrar que também está atento à questão da energia sustentável, Pernambuco já atraiu dois grandes investimentos nesse setor. O primeiro deles foi inaugurado há 4 anos, quando a multinacional italiana Enel Green Power colocou em operação o Complexo Fontes, o primeiro parque híbrido do Brasil, gerando energia solar e eólica. Com investimento de R$ 660 milhões, o parque fica no município de Tacaratu, no adurente sertão pernambucano, a 440 quilômetros do Recife. Todo o sistema tem capacidade para gerar 340 gigawatts/hora por ano, o suficiente para abastecer uma cidade de 1 milhão de habitantes.

O segundo é uma usina solar, que será instalada no município de São José do Belmonte, também no sertão, com investimentos de R$ 3,5 bilhões. Durante as obras, que começarão em janeiro do ano que vem e devem terminar em meados de 2021, serão gerados 1,1 mil empregos. O empreendimento pertence à companhia espanhola Solatio e será o maior parque fotovoltaico do Brasil. “O futuro do mundo depende da geração de energia limpa. Estamos nos preparando para isso”, diz o governador.
Tudo leva a crer que Pernambuco seguirá crescendo por um bom tempo.


“Conseguimos criar uma relação de confiança entre os investidores e o Poder Público”

Divulgação

Um dos mais jovens governadores do País, o recifense Paulo Câmara acabou de completar 47 anos. Casado e pai de duas meninas, tem aplicado em sua gestão os ensinamentos que acumulou durante os anos que passou na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde se formou em Economia e fez mestrado em Gestão Pública. Suas ideias estão sempre voltadas a incrementar a economia do estado. “Nosso maior objetivo é melhorar a vida do nosso povo. E só vamos obter êxito atraindo grandes empresas e investimentos que gerem riqueza e empregos”, diz Câmara, que foi reeleito no ano passado, no primeiro turno, com quase 51% dos votos. A seguir, a entrevista exclusiva que ele concedeu à DINHEIRO, no sábado 24, na sua sala no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo estadual, no Recife.

Como o senhor analisa o fortalecimento da economia de Pernambuco?
Primeiro, temos de olhar um pouco para a nossa história. Até os anos 80, nossa economia era basicamente voltada à produção de cana-de-açúcar e algodão, áreas em que perdemos espaço para outros estados, como São Paulo e Mato Grosso. Tivemos de criar oportunidades em outras frentes. Em meados dos anos 2000, soubemos aproveitar o boom da economia nacional para plantar sementes em setores nos quais éramos fracos. No governo de Eduardo Campos (falecido num acidente aéreo, em 2014, Campos governou de 2007 a abril de 2014), conseguimos dar um grande salto, principalmente na indústria.

Que fatores o senhor considera fundamentais para a economia do estado demonstrar vigor, mesmo nesses tempos de crise?
Um dos pontos cruciais foi o plano que montamos para combater a burocracia e atrair investidores de diversos segmentos. Hoje, Pernambuco tem grandes empresas de praticamente todos os grandes setores da economia. De montadora de automóveis a fabricante de remédios. De agronegócio a confecção de roupas. De usina de energia solar a indústria de PET. Com tudo isso, a economia permanece aquecida e conseguimos gerar emprego, que é a maior demanda da nossa sociedade. O povo quer trabalhar.

E o que ainda precisa ser feito?
Sempre há o que melhorar. Uma das nossas metas é levar riqueza às regiões menos favorecidas. E já estamos conseguindo. Para isso, elaboramos uma política fiscal que eleva o incentivo concedido às empresas, de acordo com a região na qual ela vai investir. Quanto mais distante e carente de indústria for a cidade, maior o incentivo. Na Região Metropolitana do Recife, por exemplo, o incentivo é de 70%. No Agreste, esse valor sobe para 85% e no Sertão, para 90%. Muitos dos novos investimentos que estamos recebendo são justamente para essas regiões. Precisamos atrair os grandes investidores, mas sem esquecer dos pequenos. Todo mundo precisa, pode e deve ganhar.

Que desafios o senhor ainda enxerga pela frente?
Conseguimos criar uma relação de confiança entre os investidores e o Poder Público. Precisamos fortalecer isso e garantir que seja algo perene, não apenas uma postura de um governo ou de outro. Mas uma atitude que seja a marca de Pernambuco. A qualificação da nossa mão-de-obra é outra questão fundamental. Sei que é uma frase feita, mas acredito piamente que só a educação pode mudar um povo. Já obtivemos uma grande melhora nesse sentido. Há cerca de 10 anos, éramos um dos últimos estados no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Hoje, somos um dos primeiros. No Ensino Médio, ocupávamos o 21º lugar. Em 2016, já éramos o primeiro. Em 2007, tínhamos 24% de índice de abandono escolar. Agora, esse índice é de 1,2%. Há 12 anos, havia apenas 6 escolas técnicas estaduais em Pernambuco. Hoje, são 44. Acredito que, somando tudo isso, Pernambuco vai continuar crescendo.