Os rumores de um possível pedido de demissão do ministro da Economia Paulo Guedes abalaram o humor do mercado financeiro nos últimos dias com perdas na bolsa de valores e alta do dólar.

Nesta sexta-feira (22), o presidente Jair Bolsonaro e Paulo Guedes concederam uma coletiva de imprensa que diminuíram os ruídos sobre o assunto.

A manutenção do ministro, porém, será capaz de acalmar o mercado? O economista e professor de gestão pública do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), Diego Rodrigues, e o advogado especialista em direito internacional e consultor de negócios, Daniel Toledo, respondem essa e outras questões sobre a economia do Brasil diante do atual cenário político.

Juros sobem, mas terminam longe das máximas após Guedes confirmar permanência

A manutenção de Guedes ajuda a acalmar o mercado no curto prazo?

Diego Rodrigues: A permanência do ministro no cargo me parece que nunca esteve em risco. O que está em risco mesmo é a política fiscal, e é com isso que o mercado está preocupado. Sem entrar no mérito do Auxílio Brasil, o que a alteração do teto de gastos mostrou é que a política fiscal está à mercê do ano eleitoral, mesmo com o ministro Guedes no cargo. Isso significa que a presença do ministro à frente da pasta não é mais garantia para a condução da política fiscal. O ministro Guedes pode estar queimando a credibilidade e confiança que o mercado ainda tinha nele. Logo, sua manutenção no cargo não é mais garantia de que o mercado se “acalmará” no curto prazo.

Daniel Toledo: No atual cenário a manutenção de Guedes não vai acalmar nada, vai evitar uma piora na atual situação. Nós temos o dólar batendo na casa de R$ 5,70, o dólar turismo passando de R$ 5,80, a expectativa do mercado é de que passe de R$ 6 e o mercado internacional está vendo e apostando que o Brasil vai estourar o teto fiscal. Já temos um cenário caótico. A saída de Guedes assim como de outros integrantes da equipe econômica fariam com que o barco afundasse de vez. A manutenção de Guedes agora, neste momento, não melhora, mas evita uma piora no cenário político e econômico atual.

O dólar vai cair? A bolsa vai subir?

Diego Rodrigues: Há muitos fatores que influenciam no valor do dólar e no comportamento da bolsa. No curto prazo, a alteração do teto de gastos certamente é a causa dessa turbulência que estamos vendo. O mercado está percebendo que a política fiscal no Brasil está em risco, o que pode prejudicar a retomada do crescimento. Sobre a bolsa, particularmente, acredito que ela deva se estabilizar tão logo esse choque inicial passe; sobre o dólar, também diante do cenário internacional, acredito que a tendência é de mais alta, o que poderá influenciar a inflação e exigirá o aumento dos juros por parte do Banco Central, tanto para conter a subida da inflação quando a desvalorização do Real.

Daniel Toledo: O dólar cair é pouco provável ainda mais agora com a concessão de novos auxílios por parte dos caixas públicos. O auxílio não vem do governo porque quem paga o caixa são os contribuintes, as pessoas que pagam impostos e tem sido impossível suportar o caixa público com dinheiro de tributos. Hoje há uma disparidade grande nessa questão que fez com que a economia fosse para onde ela está caminhando, mas estamos num ano político e se não houver concessão de benefícios o governo não se reelege ou elege aquele que ele indicar. Teremos um ano em que benefícios serão concedidos e não sabemos a que custo. Muitas pessoas estão aflitas e receosas com a manutenção do patrimônio e muita gente está apostando em ações de empresas mais estáveis e conservadoras para evitar perdas de dinheiro ainda maior do que temos visto. O que preocupa realmente o cenário nacional é a inflação, que não é só a perda de valor do dinheiro, mas sim o quanto os rendimentos em que as pessoas estão investindo vão compensar a perda desses valores.

O que se espera no médio, longo prazo?

Diego Rodrigues: Acredito que o ajuste das contas públicas é o grande desafio do Brasil nos médio e longo prazos. As contas públicas já vêm deterioradas historicamente no nosso país e vêm sofrendo um estresse muito grande em virtude da pandemia. O que tínhamos era um compromisso, pelo menos aparente, da equipe econômica com o ajuste fiscal no longo prazo, o que agora está em xeque em virtude, principalmente, da alteração do teto de gastos. Tudo dependerá do compromisso do governo com o ajuste das contas públicas e com as reformas, mas o ano eleitoral parece estar pesando nesse compromisso, o que é péssimo para o país, ainda mais em um momento tão delicado como esse.

Daniel Toledo: Nós vamos entender o que esperar da economia do Brasil a partir de novembro ou dezembro, quando teremos uma definição melhor de como será 2022. Até agora só temos especulação. O fim da CPI da Covid teve muito fervor político. Muitas questões foram reais, outras apenas por interesse político. Tem de ter cuidados com as medidas a serem tomadas daqui para frente. Em 2022, virá a conta do que houve em 2020 e 2021 e o Brasil tem entrado num círculo em que tenta vender o almoço para pagar a janta.

O que esperar da economia do país a partir de agora?

Diego Rodrigues: A situação das contas públicas é muito delicada e o governo sinalizou que abandonou o compromisso fiscal pelo menos até as eleições. Também não vejo mais compromisso com a aprovação de reformas até lá. Acredito que a tendência é a de que o governo tente acelerar o crescimento no curto prazo e deixe para pagar o “preço” por isso depois. Esse “depois” que é preocupante: o país necessitará de um esforço ainda maior para colocar as contas públicas em ordem, provavelmente o dólar e os juros estarão em patamares maiores e o custo para o ajuste poderá ser um ritmo de crescimento menor. Para mim, mesmo com a manutenção do ministro Guedes no cargo, o governo sinalizou que 2022 será um ano de engrenagens funcionando a todo o vapor até as eleições; depois disso, colocar a casa em ordem poderá nos cobrar um preço maior que o que pagaríamos se estivéssemos fazendo os ajustes de forma mais gradual e mais consistente.

Daniel Toledo: Não temos mais de onde tirar dinheiro. A expectativa de estourar o teto da meta fiscal vai fazer com que os poucos investidores internacionais que ainda restam saiam do Brasil em razão da instabilidade. O Brasil perderá em investimentos, estabilidade e liquidez, que faz com que muitas empresas decidam fechar, e os empresários acabam investindo em outros países com maior segurança econômica e política.