Às 10h de uma segunda-feira de dezembro, um homem septuagenário entrava Da Vinci Clinic, em Barueri, cidade da Grande São Paulo, para fazer uma avaliação. Estava em cadeira de rodas, com a perna esquerda amputada. Foi recepcionado pela inspiração que o levou até lá: Pedro Pimenta, sócio e CEO da empresa aberta em meados de 2021. Tetra-amputado, Pimenta impressiona por sua autonomia e habilidade com suas quatro próteses, sua superação pessoal e sua visão empreendedora. Nas atividades cotidianas, dirige, faz a barba, digita pelo smartphone. Na empresa, tem função transversal. É garoto-propaganda da clínica, com sua imagem explorada em banners, redes sociais e outros materiais de marketing, e também atua nas áreas administrativa, financeira e operacional. Aplica os conhecimentos adquiridos na graduação em economia na University of South Florida (USF), nos Estados Unidos, e em sua passagem de quase dez anos pela Hanger, Inc., líder em próteses e órteses do mercado americano. Lá, o modelo é de integração entre produtos personalizados e serviços aos pacientes — o mesmo praticado na Da Vinci. “Temos essa linha de atividade que engloba tudo. Vendemos a reabilitação completa”, afirmou Pimenta, que além de CEO é palestrante e escritor, autor do livro Superar é Viver (Leya, 2014).

Pedro Pimenta foi acometido por uma meningite bacteriana em 2009, quando tinha 18 anos. Ficou internado por seis meses, teve dois comas e passou por inúmeras cirurgias. A doença cobrou um preço alto: amputação das duas pernas acima dos joelhos e de ambos os braços acima dos cotovelos. Buscou tratamento com especialistas e passou a frequentar feiras e congressos de reabilitação em sua cadeira de rodas, auxiliado por familiares. Em um deles conheceu o irlandês Kevin Carroll, vice-presidente da americana Hanger, que viu em Pimenta a possibilidade de torná-lo o primeiro case mundial de tetra-amputado 100% independente e reabilitado com uso integral de quatro próteses. Levou-o para os Estados Unidos, onde passou por treinamento com veteranos de guerra. No final de 2010, Pimenta estava caminhando, confiante e independente. Permaneceu em território americano para estudar e trabalhar na própria Hanger.

100% independente e reabilitado com uso integral de 4 próteses, Pedro pimenta é o primeiro case desse tipo no mundo

PLANO DE NEGÓCIO Na pandemia, Pedro Pimenta fazia home office no Brasil e contatou Jairo Blumenthal, referência em reabilitação da América Latina. Apresentou o business plan da clínica ao especialista, que já era empresário do ramo e prontamente aceitou a proposta para ser sócio. “Estrutura grande, oficina integrada, sem salas, melhores funcionários. Esse era o plano”, disse Pimenta. Agregaram ao projeto Leandro Silva, um dos mais experientes protesistas do País, e Mônica Yamaoka, fisioterapeuta com 40 anos de experiência na reabilitação de amputados.

A Da Vinci saiu do papel e hoje, com um ano e meio de atuação, é uma das clínicas mais bem estruturadas do setor. “Aqui tem marcação só de entrada, sem horário de saída. E tem integração entre o paciente e as famílias”, disse o CEO. Após avaliação e relatório, é feito o molde exato do corpo para encaixe da prótese. Em casos complexos, como mãos e joelhos biônicos, materiais são comprados e enviados para montagem na Alemanha. Na oficina da Da Vinci são feitos os ajustes finais. Depois entra a parte de fisioterapia e coordenação motora.

O negócio vai bem, segundo Pimenta, sem abrir números. “Quase dobramos a meta de atendimento a ser atingida nos primeiros 12 meses previstos no business plan”, afirmou. Para o futuro, a estratégia é edificar um programa de apadrinhamento para arcar com custos dos tratamentos — a Da Vinci já orienta os pacientes com crowdfunding. “Conversamos com grandes empresas para apadrinhar amputados e, na ponta do processo, ainda aportar com emprego a eles.” Também está na mira da clínica abrir estágios, cursos e avançar em parcerias com a Rede de Reabilitação Lucy Montoro, do governo de São Paulo, e Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD). Além de abrir outras clínicas. “Escalar o negócio sem ter que me clonar”, disse Pimenta. Multiplicar a superação. Como aquele senhor que entrou na clínica de cadeira de rodas e em breve vai sair andando.