Vivemos na era da informação. Os dados nunca foram tão abundantes, ou viajaram em velocidades tão rápidas. O paradoxo está no fato de que a desinformação também nunca foi tão evidente. O problema é que há uma relação inversamente proporcional entre a quantidade de informações a que uma pessoa é submetida e sua capacidade de discernir entre o real e o imaginário, de acordo com os estudiosos das teorias da comunicação. Esse entendimento não é, exatamente, novo. Um estudante de jornalismo do final dos anos 1990, provavelmente, terá lido sobre os efeitos dos extintos “jornalões” de domingo. Dizia-se, na época, que uma só edição dominical do “Folhão” ou do “Estadão” trazia mais informações do que um homem medieval estaria exposto durante toda sua vida. Essa superinformação acabava gerando, na verdade, uma desinformação generalizada. E ainda falávamos do papel.

Os tempos, no entanto, eram outros. A chamada “grande mídia” controlava a distribuição do conteúdo e fazia a sua “curadoria”. Os anúncios impressos ou televisionados garantiam o financiamento do jornalismo e da produção de conteúdo, ainda que a internet já indicasse que passaria como um trator por esse modelo. Então veio o Google, o Facebook, e tudo mudou. Com um misto de dinamismo americano e agressividade chinesa, as duas empresas sequestraram 20% dos gastos globais com publicidade. No ano passado, elas atraíram US$ 106 bilhões em anúncios, segundo a empresa de análises Zenith. Na mídia tradicional, quem chega mais perto é a americana Comcast, dona da NBC, com US$ 13 bilhões, oito vezes menos.

Se o impacto no mercado é absolutamente claro, os efeitos da mudança na sociedade ainda estão sendo sentidos. Numa primeira análise, o fim do “monopólio da grande mídia” aparecia como um sonho de liberdade. As barreiras que impediam a informação de ser disseminada democraticamente colapsavam e o mundo entraria em uma espécie de catarse informativa, na qual todos seriam, ao mesmo tempo, jornalistas e leitores, colaborando incessantemente para apurar e revelar a verdade. Isso não aconteceu. Com ajuda da Rússia, Donald Trump venceu as eleições nos Estados Unidos e aqueles que sonhavam com o paraíso da emancipação midiática se voltaram contra quem permitiu a balbúrdia das “fake news”: notadamente, o Facebook, de Mark Zuckerberg.

À medida que nos aproximamos de mais uma rodada de eleições importantes, nos EUA, no México e no Brasil, para citar alguns exemplos, a preocupação com os efeitos das redes sociais ganha os holofotes. Zuckerberg, por sua vez, sinaliza que, ainda que tenha tomado de assalto o mercado publicitário, não quer saber de lidar com o problema das “fake news”. Nas últimas semanas, ele anunciou medidas para, na prática, barrar o jornalismo, bom ou mau, dos feeds facebuquianos. Seu problema está no fato de que, apesar de ser altamente lucrativo para quem detém o “monopólio” da distribuição, o jornalismo tem um efeito colateral que se chama poder político. Não é possível ganhar dinheiro com ele sem lidar com as forças contraditórias que regem a geopolítica mundial. Nem se abster da responsabilidade de se ater aos fatos para criar narrativas, mesmo as enviesadas.

Antes um aliado na obtenção de audiência, o jornalismo se tornou uma pedra no sapato de Zuckerberg. Algo que atrapalha sua missão de conectar e aproximar as pessoas. Pior, transforma o Facebook em vidraça, em ator político, o que gera algumas demandas por regulação do setor de redes sociais, um antigo temor do empresário. A solução é devolvê-lo aos seus antigos donos, a grande mídia, acostumada com a tarefa de informar a opinião pública. O estrago, no entanto, está feito.

Ao afastar as notícias da rede social, Zuckerberg está criando uma brecha para as notícias falsas. A esperança é que esse espaço seja ocupado por aqueles que, nas palavras de Bertolt Brecht, tenham a coragem de dizer a verdade. “A verdade deve ser mostrada na sua luta com a mentira e nunca apresentada como algo de sublime, de ambíguo e de geral; este estilo de falar dela convém justamente à mentira”, escreveu o poeta e dramaturgo alemão, em um texto de 1934, com o qual conclamava os escritores a lutar contra o fascismo. O futuro da democracia depende disso.