Numa tentativa frustrada de destruir Paris no final da 2ª Guerra Mundial, quando as Forças Aliadas se aproximavam, Adolf Hitler teria perguntado ao comando nazista que ocupava a cidade se ela já estava “em chamas.” Hoje, a resposta seria “sim, está”. O motivo, porém, não é um inimigo externo e sim os próprios franceses. Ou melhor, o custo de vida na França. O movimento dos Coletes Amarelos tomou as ruas da cidade luz para protestar contra o aumento dos combustíveis anunciado pelo governo do presidente Emmanuel Macron. A alta viria em janeiro, dentro de um pacote de medidas ambientais com potencial de arrecadação de € 2 bilhões (R$ 8,7 bilhões). Os maiores afetados nem são os parisienses, mas a população rural e de baixa renda do interior. Eles foram à capital protestar — e as manifestações já duram mais de três semanas.

BRASIL, 2013: como agora em Paris, os protestos ocorreram sem lideranças claras (Crédito:CHRISTOPHE SIMON / AFP)

O movimento começou de forma pacífica e com uma pauta específica. Se transformou em uma convulsão social generalizada e violenta. Os manifestantes agora pedem aumento de salários e diminuição de tarifas públicas, como a conta de luz. O saldo já é de ao menos três mortos, 378 presos e 4 milhões de euros de danos ao patrimônio público. O movimento não tem liderança definida, de forma similar às manifestações brasileiras de 2013. Por aqui, o alvo era o aumento de R$ 0,20 na tarifa de ônibus, em uma mobilização que contribuiu, mais tarde, para o fortalecimento da extrema-direita e o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016.

No último fim de semana, os protestos foram feitos em outras cidades francesas. Com piquetes nas estradas, o faturamento dos setores de turismo, serviços e varejo caiu de 25% desde o início do movimento.

PIB EM QUEDA “Para o PIB de 2018, a queda pode chegar a 0,1% do crescimento”, diz Daniela Ordonez, economista da consultoria Oxford Economics. “Parece pouco, mas com a aproximação do Natal, o estrago pode crescer.” O setor alimentício, por exemplo, já prevê perdas de 13 bilhões de euros (R$ 56 bilhões), num movimento em cadeia semelhante ao do Brasil, durante a greve dos caminhoneiros contra o aumento do diesel.

Macron assumiu o cargo em 2016 e propõe reformas para tornar a economia francesa mais competitiva, incluindo medidas como o relaxamento de leis trabalhistas e a diminuição de impostos sobre grandes fortunas. A cobrança extra foi cancelada. “Não toleraremos violência”, disse o mandatário que voltou com urgência da cúpula do G-20. O recado não surtiu efeito. “Faremos mais protestos. Continuare-mos mobilizados”, disse Lionel Cucchi, um dos raros porta-vozes do grupo, à TV francesa. Pelo visto, a França, e especialmente Paris, pode ainda queimar muito mais.