A União Europeia (UE) celebra neste sábado o 60º aniversário do Tratado de Roma, que deu origem à Comunidade Europeia. Uma comemoração peculiar, pelos desafios cruciais que o bloco deve enfrentar em 2017.

Poucos dias antes da cerimônia oficial na capital italiana, que terá a presença de chefes de Governo de delegações dos países do velho continente, a AFP entrevistou Brigid Laffan, especialista irlandesa em integração europeia, atual diretora do Centro de Estudos Avançados Robert Schuman e diretora do programa dedicado à governança mundial do Instituto Europeu de Florença.

AFP: A UE festeja seu aniversário em um momento difícil, já que luta contra as sequelas da crise financeira, a saída do Reino Unido (Brexit), o avanço do populismo e uma grave crise migratória. O que vai acontecer?

BL: Há dois temas muito importantes. Em primeiro lugar, a UE se tornou uma instituição poderosa e seu impacto nos Estados membros é maior e em segundo lugar passamos por uma dura recessão.

A crise financeira mundial realmente testou a capacidade da Europa de permanecer unida e, justamente quando a UE saiu desta crise, ao menos da fase aguda, foi atingida pela crise dos refugiados. Portanto, teve que superar recentemente alguns dos maiores testes dos últimos 60 anos.

AFP: Quem são os culpados?

BL: A responsabilidade é de todos. As instituições europeias, Bruxelas (…) e certamente os governos, que também devem assumir a responsabilidade do que se faz em Bruxelas e com muita frequência não o fazem.

Além disso, o populismo avança junto com os partidos que combinam uma linha contra a UE e contra os emigrantes … e isso é muito poderoso. Ser populista é uma política fácil e culpar a UE é ainda mais fácil.

AFP: A integração europeia foi estimulada por França e Alemanha, trabalhando lado a lado, mas esta aliança parece vacilar. Poderiam voltar a exercer este papel?

BL: A relação franco-alemã é fundamental para a UE, é o motor da integração. No entanto, algo foi danificado neste motor e os dois deveriam mudar. A França precisa ser mais séria com suas reformas econômicas, caso contrário não sobrevive. A Alemanha, pela forma como administrou a crise, ficou muito apegada a um modelo que impõe austeridade, cortes e que exige ajustes aos outros países. Acredito que o ano de 2017 será muito importante para a UE, e penso que será um bom ano.

Se alguém como (Emmanuel) Macron for eleito na França e se acontecer uma mudança na política interna da Alemanha, uma nova relação vai existir entre os dois países.

AFP: E se a líder de extrema-direita Marine Le Pen vencer a eleição presidencial na França?

BL: Seria absolutamente terrível uma vitória de Le Pen na França. Se isto acontecer, acredito que a UE enfrentará um futuro impossível. Mas não acredito que vai ganhar. Um dos efeitos do Brexit é que as pessoas estão começando a perceber o muito que se perde com uma desintegração da UE.

AFP: Em uma UE formada por 27 membros, um bloco a várias velocidades é inevitável?

BL: Já temos uma Europa com várias velocidades. Em alguns países a moeda é o euro, em outros não. Acredito que vai existir mais integração na Eurozona, nos âmbitos da defesa, segurança e controles de fronteira. Você verá que alguns países devem acelerar mais que outros.

AFP: Qual será o impacto do Brexit?

BL: É um enorme desafio para a UE. A UE pode sobreviver ao Brexit, do outro lado não tenho certeza de que o Reino Unido possa. Acredito que poderia terminar com um reino desunido, a um custo muito alto para os britânicos.

AFP: Sem a Grã-Bretanha, o restante da Europa pode seguir mais rápido?

BL: Não vejo transformações dramáticas para a UE. Sempre se movimentou de maneira lenta. Acredito que após todas as eleições 2017 a Europa vai aparecer como se tivesse passado por uma mudança reformista, diria eu. Em outras palavras, um movimento que terminará por conduzir a UE a um local mais seguro.