A semana começa com aquela entidade chamada mercado em um dilema. O que será que a autoridade monetária americana vai considerar mais importante: os números da economia ou o retorno da pandemia? Esse será o assunto do depoimento semestral de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed), o Banco Central americano, no Congresso dos Estados Unidos.

Powell vai falar na Câmara dos Deputados na quarta-feira (14) e no Senado na quinta-feira (15). Como ocorre nessas ocasiões, o Fed divulgou o relatório preliminar na sexta-feira (9). Coincidentemente, um dia em que a bolsa não funcionou no Brasil. E no qual o índice americano S&P 500 bateu um novo recorde, fechando a 4.369 pontos.

Em seu depoimento, Powell deverá repetir os principais pontos do texto do Fed. Ele deverá dizer que as medidas de estímulo à economia americana têm conseguido conter o impacto danoso da pandemia, mas que ainda é cedo para considerar que a tarefa esteja concluída.

Portanto, o mais provável é que o presidente do BC dos Estados Unidos garanta que os juros continuarão baixos e a injeção de dinheiro na economia vai prosseguir. Isso apesar da alta da inflação e de alguns indicadores de emprego mostrarem que os patrões voltaram a contratar e que os trabalhadores retomaram as buscas por emprego.

Essa é a grande indefinição atual do mercado. Desde o início da pandemia, os pregões têm registrado recordes sucessivos. Uma das poucas exceções é a Bolsa brasileira, mas devido à crise política e à incapacidade do governo de retomar a narrativa. No entanto, os mercados internacionais vêm subindo de maneira sistemática.

A explicação é simples: há dinheiro demais em circulação, e ele acaba migrando para as ações. Daí a valorização dos preços, ainda que os resultados das companhias abertas venham crescendo de maneira irregular.

Como certos atletas, os investidores ficaram viciados em estímulos. Precisam ter certeza de que os bancos centrais vão manter os juros baixos por vários trimestres à frente, ou mesmo anos. E necessitam da garantia de que nenhuma medida das autoridades monetárias vai reduzir a vazão do manancial de dinheiro que vem inundando os mercados desde o início da pandemia e fazendo subir os preços de ações, commodities e ativos físicos.

Há – ou havia – dúvidas sobre isso. Na quarta-feira (7) os comentários do banco central norte-americano sobre a reunião realizada em meados de junho deixaram claro ao mercado financeiro que o Fed começou a pensar na possibilidade de remover o estímulo à economia. A vacinação contra a Covid-19 está avançando. Isso faz o emprego e a atividade econômica se recuperaram, o que pressiona a inflação no longo prazo.

As observações mais recentes mostraram altas dos preços. Nos 12 meses até maio, o índice de preços ao consumidor (Consumer Price Index, CPI) mostrou uma inflação acumulada de 5%, a mais alta em 13 anos. O CPI de junho deverá ser divulgado na terça-feira (14), e ele será um dos pontos mais discutidos pelos parlamentares americanos nos dois dias do depoimento de Powell.

Isso deveria indicar que a festa da liquidez tem hora para acabar, e é antes do que se espera. Porém, nos últimos dias, notícias preocupantes de retorno da pandemia vêm assustando os investidores. O exemplo mais recente ocorreu no Japão. Na quinta-feira (8) o governo japonês decretou medidas de emergência e retomou as práticas de isolamento social em Tóquio, a poucos dias do início dos Jogos Olímpicos. A causa foi o recrudescimento das contaminações pela chamada variante delta do coronavírus.

Conclusão: há motivos sólidos para o Fed defender uma alta dos juros e justificativas igualmente robustas para que ele advogue por um prolongamento do estímulo. E, diante dessa incerteza, cabe esperar que o pronunciamento de Powell traga um norte para os investidores.